quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

CRIANÇA DA NOVA ECONOMIA



Lembro-me da longínqua infância, meus oito anos. Sentados à mesa, disputávamos, os cinco irmãos, a parte da galinha assada que jazia na travessa. A gravidez de minha mãe anunciava outro competidor na batalha da distribuição de asas e coxas, e um lugar à mesa. Nossos parcos presentes, ao nascer, eram fraldas de pano costuradas na velha Singer e, mais adiante, uma boneca de pano para as meninas, umas bolinhas de gude para os meninos. Um cabo de vassoura servia de cavalo xucro. Éramos crianças econômicas. Tínhamos casa, roupa, calçado e comida. Íamos à escola com a mesma devoção obrigatória de ouvir missa aos domingos. Os meninos mais avançados e modernos se distinguiam por ter um canivete de duas lâminas.
Meu sonho, aos nove anos, era ter um par de botas para as lides da Charqueada e montar a cavalo. Tudo o mais era dádiva da natureza. A água vinha do poço, puxada no balde. A caldeira do fogão a lenha esquentava a água do banho. O galinheiro abastecia de ovos a cozinha e a panela do risoto. A horta e o pomar nos brindavam com frutas e legumes frescos.
Nos tempos modernos, a criança nasce exigindo do poder publico 200 litros/dia de água encanada, luz elétrica e coleta de lixo. Previne a comunidade, antes da chegada, para recolher fraldas, chocalhos, mamadeiras, pijamas, penduricalhos de música no berço. Anuncia, aos berros, que precisará de um automóvel, um celular, um laptop, um tablet, uma bicicleta, uma excursão a Disney, uma prancha de surf.
Hoje, a criança nasce consumidora voraz para tornar-se milionária com emprego garantido na câmara ou no senado, na Petrobrás, no Tribunal de Contas ou na Receita Federal. Seus amiguinhos de infância estão na telinha da TV cujos nomes ela aprende já aos doze meses. Sai da TV e entra do Facebook, no Orkut, no Twitter, fala com todo o mundo, conhece todos os segredos e fofocas, sabe que Luiza esteve no Canadá. O cidadão atual é um eleitor virtual. Mora num país é virtual. Os governos são virtuais. A antiga verdade é virtual. Apenas as mentiras são reais transformadas em virtudes.

Não poupe seus comentários. Envie-os pelo e-mail:
eugeniogiovenardi@gmail.com

Nenhum comentário: