domingo, 15 de janeiro de 2012

BRASÍLIA EM JANEIRO

Um manto de silêncio se estende sobre Brasília ao término do pipocar estonteante de fogos fátuos na virada do ano. A imaginação dos programadores da queima de rojões não vai além desse quase ridículo espetáculo. O barulho do último dia evaporou-se com as luzes cromadas e a fumaça dos fogos.
Janeiro penetrou Brasília com sua calmaria e chuva fina. Avenidas vazias. Semáforos em verde ou vermelho esperando que apareçam os carros que rodam por outras terras. O vazio humano ressalta a presença das árvores. Há tempo para contemplá-las, admirar sua altura, descobrir seus segredos e sentir o perfume de tantas flores. Brasília, em janeiro, volta ao cidadão com sua majestade singela, monumental e bucólica.
A Esplanada dos Ministérios está deserta como uma paisagem esquecida da Lua. Ministros e sua presidente buscaram, em sítios secretos e distantes, o descanso de suas fadigas burocráticas. Fugiram, em tempo, dessas vozes clandestinas e severas que o silêncio emite aos que não sabem ouvi-lo.
Aqueles monumentos brancos e enormes contra o horizonte, onde senadores e deputados tratam de seus interesses particulares fingindo serem públicos, estão vazios e com cheiro de fantasmas. Deles, senadores e deputados, escreveu D. Pedro II em seu diário, há cento e cinquenta anos: “Há muita falta de zelo, e o amor à pátria só é uma palavra – para a maior parte –”.
Brasília encheu-se de verde, de pássaros, de quietude. Pode-se até atravessar a rua pela passagem de pedestres sem medo de ser atropelado. Mesmo no semáforo, tem-se a tentação de desobediência civil, pois não há automóveis à vista quando o bonequinho caminhante está vermelho.
Janeiro entregou Brasília ao cidadão, ao pedestre, ao legítimo dono das ruas. Janeiro vem lembrar a todos que a cidade é para o cidadão de carne e osso. Como é diferente o janeiro de Brasília! Ele nos dá a sensação de estarmos tolerando os poucos automóveis que resistem ao silêncio de janeiro.
Janeiro sabe que, nos outros onze meses, mal o cidadão pedestre é tolerado pelos monstrinhos de rodas que invadem ruas, parques, estacionamentos e os enchem de veneno.
Volto ao diário de D. Pedro II: “...vejo que (no Império) não se fala quase senão em política, que é, as mais das vezes, guerra entre interesses individuais”. Brasília ainda não era, mas, cento e cinquenta anos depois, a realidade é a mesma.
Há que se aproveitar o mês de janeiro. Ele é curto para tanto silêncio espalhado por Brasília. 

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