quarta-feira, 25 de outubro de 2017

QUARENTA ANOS DEPOIS




A Secretaria de Agricultura-DF, com recursos da Fundação Banco do Brasil, aplicará um milhão de reais na “revitalização” da Bacia do Descoberto. A Bacia está morta. São 224 áreas de preservação e 222 nascentes mortas. Quarenta anos depois de enterradas sob o pisoteio de 940.000 consumidores de água de quatro cidades, propõe-se a revitalização. A proposta de revitalizar não é ruim. O dinheiro e o tempo propostos é que se revelam inadequados. É impossível ecologicamente revitalizar 224 áreas (não se menciona o tamanho) e 222 nascentes, no Cerrado, “até o fim do próximo ano”, conforme anunciado. É inacreditável. Minha experiência na recuperação de duas nascentes, na biocomunidade do Sítio das Neves - DF (70 ha), indica que a consolidação de um manancial, em área degradada, leva de 10 a 15 anos. A Agência Nacional de Águas (ANA), a Adasa e o Ibram acompanharam a realização dessa atividade, iniciada em 1974. A natureza tem suas leis, seu ritmo, seu tempo e não se submete a decisões pessoais ou institucionais. A escassez atual de água é uma resposta inequívoca da natureza a nossa imprevidência e presunção. Teremos o que dizer ao Oitavo Fórum Mundial da Água, em 2018, aqui em Brasília?

FAIXA VERDE



Dias passados, ao dizer que superpopulação também tem a ver com escassez de água, alguém me tachou de neomalthusiano.
Em 1974, quando se inaugurou o Reservatório do Descoberto,
Brasília toda tinha 600.000. Criou-se, em torno do Descoberto, uma prudente área de faixa verde para garantir a proteção da bacia. Hoje, a FAIXA VERDE está ocupada por Brazlândia, Taguatinga, Ceilândia e Águas Lindas com uma população de 940.000 habitantes. Juntando mudanças climáticas, irregularidade das chuvas, urbanização desertificadora, impermeabilização do solo, produção agrícola superirrigada, fogo no cerrado, imprevisão administrativa e 4 milhões e meio de consumidores temos necessariamente escassez de água. Como ninguém produz água, racionar é sobreviver enquanto as nuvens não chegam.



sábado, 21 de outubro de 2017

O CAMINHO DA ÁGUA


( Foto: Nascente Água Azul, Sítio das Neves, DF. Por que esta nascente tem água.)

Antes de sair pela torneira, a água percorreu um longo caminho. Do ventre da Terra ao olho d’água e dali ao chuveiro são muitos quilômetros. Na manutenção da vida humana, vegetal ou animal, há três requisitos essenciais: ter água, preservar a água e usá-la com moderação. Esta ordem determinada pela natureza das coisas e pelas coisas da natureza está sendo invertida, há alguns séculos, pela espécie humana. Usamos mal a água, não temos compromissos com a preservação da água e acabamos por não ter água. Culpa-se o Estado como se um país não tivesse gente. O racionamento imposto aos cidadãos é uma punição ao mal-uso da água, à falta de compromisso dos cidadãos em preservar as nascentes para ter água. A água não nasce nos reservatórios que o Estado constrói com nosso dinheiro. O reservatório, águas abaixo, contava com o olho d’água que destruímos com o mal-uso. O caminho da água, em tempos de mudanças climáticas no planeta, é preservar os mananciais, águas acima, captar as águas da chuva e usá-la com moderação. 

terça-feira, 17 de outubro de 2017

DISPONIBILIDADE E USO DE ÁGUA NO DF



Informações da Caesb indicam que a vazão disponível de água para o uso dos brasilienses é de 9,5 m3 por segundo ou ao redor de 782.080.000 litros por dia. Ao se aplicar a simples aritmética da água e relacionar com o aumento da população no DF chega-se aos resultados que seguem. Vamos calcular a reposição de água no organismo humano de 3 litros por dia.
No ano 1970, a população do DF era de 537.000 e consumia por dia 1,601 milhão de litros, 0,20% da vazão diária.
No ano 2000, a população do DF era de 1.927.800 e já consumia, por dia, 0,24% da vazão.
No ano 2010, a população era de 2.086.700 e consumia 0,26%.
Em 2017, a população de 3.000.000 consome 0,34% da água diária disponível no DF, apenas com a reposição de 3 litros no organismo.
Se aplicarmos a aritmética da água ao volume mínimo de consumo recomendado pela OMS de 110 litros diários, no ano 2000 a população consumia 2,7% da disponibilidade diária; em 2010, 2,9% e, em 2017, estamos dobrando o consumo estritamente pessoal, por dia, 4,2% da vazão estimada. A população cresce, a urbanização se expande e com elas a diversidade do uso da água para o lazer, a produção de alimentos, a indústria e comércio, a limpeza urbana causando a impermeabilização de grandes áreas. O fato concreto da diminuição das águas é fisicamente revelado pelo nível das represas.
Construíram-se reservatórios ignorando a preservação dos mananciais. Contou-se passivamente com as chuvas abundantes que o DF recebia em décadas passadas. Agora, temos chuvas irregulares e menos abundantes. E, o que é vergonhoso, não podemos contar com nossos antigos mananciais descritos pela Missão Cruls nem com nossos humildes e velhos córregos. Hoje, humildemente, dependemos das chuvas e das mudanças climáticas que as regulam.
A transição hídrica se faz necessária: da escassez à sobrevivência. Da produção agrícola fartamente irrigada a culturas poupadoras de água. Da urbanização arrasadora de nascentes à contenção da avidez dos lucros imobiliários. Da economia capitalista e do crescimento a qualquer custo à economia humana e ecológica. Governar é administrar populações, prestar-lhes serviços essenciais, preservar a biodiversidade e respeitar os limites dos ecossistemas.
De onde vem essa estranheza de escassez de água no DF?

Por que essa indignação contra o racionamento? O controle do uso da água é tarefa pessoal monitorada pela consciência do cidadão. Nem Caesb nem Adasa controlam o uso da água. Somos todos responsáveis, os eleitos e os eleitores.

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

RESERVATÓRIO DO DESCOBERTO: 14%

TRANSIÇÃO HÍDRICA

Nossa república é atraída por extremos: ou tem inundações ou vai ao racionamento de água. Nem por isso deixa-se de produzir soja irrigada ou um kg de carne com 15 mil litros de água.
Transição hídrica foi o alerta que a reunião sobre clima na Suécia, reforçada pelo grito do Clube de Roma, em 1972, lançou à espécie humana. Transição hídrica quer dizer novas atitudes, novos comportamentos no uso da água diante de dois fenômenos incontestáveis: mudanças climáticas no planeta e aumento linear da população mundial, regional e local.
Medidas ainda possíveis: preparar-se para captar águas da chuva, proteger mananciais que abastecem reservatórios, restringir o uso de água às necessidades essenciais, investir em obras águas acima na preservação de nascentes.
Brasília partiu mal desde o começo soterrando nascentes, urbanizando e impermeabilizando áreas de domínio das águas.
Temos água. Água suja que custa caro limpá-la.

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

BRASÍLIA, NÍVEL DOS RESERVATÓRIOS


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BRASÍLIA, NÍVEL DOS RESERVATÓRIOS


A gestão das águas não basta ser prioridade. Ela tem que parecer prioridade em atitudes, comportamentos, inteligência e investimentos águas acima na direção das nascentes. Os investimentos águas abaixo não resolvem o estado de escassez.
O reservatório do DESCOBERTO, DF, inaugurado em 1974, foi projetado para armazenar 103 trilhões de metros cúbicos de água. Hoje está com 14,9%. Perde 81,10% de sua capacidade de armazenar. O SANTA MARIA foi projetado com capacidade de armazenamento de 58 milhões de m3 está hoje com 27,9%. Perde 72,1% de sua capacidade. O LAGO PARANOÁ, do qual se retiram 2,520 milhões de litros/dia, se alimenta, em parte, das águas do Santa Maria e de outros tributários agonizantes. Consequentemente deve ter perdido volume.
O que está acontecendo? Chuvas escassas, quase zero captação de águas pluviais, população aumenta mais de 40 mil habitantes/ano, a urbanização galopante arrasa APPs, impermeabiliza o solo e as águas se afundam.  

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

ÁGUAS DO PARANOÁ


(Nascente Água Azul, Sítio das Neves, DF, Foto: Eugênio Giovenardi)


O Lago Paranoá recolhe as águas da extensa bacia que lhe dá o nome. É formado por dezenas de córregos que vinham dar, antes da construção de Brasília, ao rio Paranoá que descia pela cratera formada há milênios. O Ribeirão Santa Maria, os córregos Vargem Grande, Milho Cozido e Três Barras formam o lago Santa Maria, inserido no Parque Nacional de Brasília, área de 101 km2 com capacidade de armazenamento de 58 milhões de m3 , 45,7 milhões de m3 de volume útil e vazão de 1,26 m3/s. Esse conjunto de águas se une aos córregos Bananal, Torto, Riacho Fundo, Gama, Urubu-Sagui, Palha, Jerivá, Taquari, Vicente Pires, Guará, Águas Claras, Cabeça de Veado, tributários do Rio Paranoá e constituem o Lago Paranoá, com 510 milhões de m3 de água acumulada, 38 milhões de m2 de extensão (3.800 ha), 38 m de profundidade, com média de 13m, e perímetro de 80 km. (Geração máxima de 30 MW/hora de energia, um MW = 1.000 KW x 5.760 litros por KW gerado. Hoje, reduzida para 13 MW/hora ou 13.000 KW/h = 74.880.000/l/hora). Um dos principais tributários do Lago, com chuva ou sem chuva, são as torneiras de nossas casas que, de todos os quadrantes, despejam nele mais de 1 bilhão de litros/dia de água suja. Tirar água do Lago Paranoá para alimentar nossas torneiras não significa aumentar o volume de água da Bacia do Paranoá. O que pode aumentar o volume de água, ao lado da captação de águas das chuvas periódicas, é proteger as nascentes e aumentar as margens ciliares dos cursos de água, acima mencionados, que contribuem para a formação do Lago Paranoá. Quase todos esses córregos estão agonizando e despejam águas poluídas no Lago. A ocupação desrespeitosa das margens de recarga, a urbanização impiedosa, a impermeabilização desastrosa, as queimadas mortíferas, o lixo disseminado ao longo de rodovias, a poluição do ar provocada pelo tráfego de milhões de automóveis é a receita eficaz da escassez de água do Distrito Federal. Desprezam-se os princípios básicos da gestão das águas. Há que se conhecer e acompanhar os índices de vazão de cada nascente e de cada córrego para tomar as medidas oportunas que garantam a saúde do bioma e de seus habitantes. As nascentes do meu Sítio das Neves, DF, mantêm vazão de 30 m3/dia durante o período seco graças à preservação da extensa vegetação nativa e original com 60 milhões de anos de experiência e sabedoria. Antes de Brasília, todos esses cursos d’água eram saudáveis. A bacia do Paranoá foi a inspiradora da construção da nova capital do país.

Publicado no Facebook em 3.10.2017