segunda-feira, 28 de maio de 2012

MARTÍRIO DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA



Ao leitor desta página: por motivo das últimas intervenções pessoais do ex-presidente no âmbito da justiça, com pinta de pontífice máximo da religião que dirige, permito-me reprisar crônica que publiquei em outubro de 2010.

Concebido e gerado no ventre das Comunidades Eclesiais de Base criadas pela Igreja de Roma, no Brasil, entrando pelo caminho nivelado pelo general Golbery, o Partido dos Trabalhadores foi batizado e crismado pelo DNA fundamentalista cristão e católico. Catolicismo e petismo têm relações de mãe para filho. O traço genético que os une é o arcabouço institucional autoritário. A mesma burocracia eclesiástica e clerical do Vaticano se reproduz na organização estrutural do PT.
Os cardeais da Igreja e os do PT definem as regras do jogo, dos ritos, da fé, das crenças e dos sacramentos. A Igreja sem papa não subsiste. O PT sem Lula se extingue. O papa é a Igreja. Lula é o PT. O papa é infalível, não erra. Tudo o que diz é aceito como verdade irretocável e repetido pelo rebanho de bispos e padres. Lula decide, ordena, orienta, não sabe o que fazem seus bispos e vigários e os inocenta. A Igreja impõe a verdade única porque é divina. O petismo lulista determina o pensamento único porque é fascista.
A Igreja é conservadora e se acomoda ao andar da sociedade para sobreviver. O PT imita a mãe e usa os mesmos cosméticos e se veste obedecendo à moda política e econômica dos novos tempos.
A corrupção moral e financeira de cardeais, bispos e sacerdotes não pode alcançar o papa. As maracutaias dos aloprados petistas, a corrupção dos revolucionários, o mensalão e o caixa dois de senadores, deputados e do alto clero do PT não atingem Lula.
O papa é aclamado pela alta cúpula clerical e pela plebe. Lula é o papa do Brasil. A Igreja almoça com os poderosos, mas não esquece os pobres do mundo porque deles é o reino dos céus. O PT se uniu aos banqueiros e aos grandes empresários, mas cuida dos excluídos do país porque deles é que vêm os votos que o manterá no poder. A Igreja acomodou os poderosos e os pobres. O PT se aliou aos ricos, formou uma nova elite consumidora e pacificou os pobres. Mas os pobres, cuja capacidade de receber é infinita, poderão abandonar Lula como abandonaram a Igreja ao não lhe dar tudo quanto pediram e esperaram. Na rebelião dos excluídos, Lula não controlará nem os ricos nem os pobres.
A Igreja, quando não consegue impor sua doutrina, contemporiza, coopta, sublima ou arrasa culturas, justifica adaptações em nome de Deus. O PT, não podendo impor ao país sua revolução socialista idealizada nas portas das fábricas, convenceu os trabalhadores a domesticar o capitalismo da direita, eliminando qualquer possibilidade de oposição por osmose doutrinária e simbiose política e moral. A cereja sobre o bolo totalitário e fascista é extinguir a oposição política. A oposição está morta, mas insiste em dar dignidade ao velório.
Na Igreja, encontram-se adeptos das doutrinas morais, econômicas e políticas da extrema direita à ponta esquerda. No PT, a revolução socialista foi esquecida, mas a nostalgia totalitária por ditadores de direita e de esquerda reacende o ânimo dos estrategistas do poder absoluto.
Os erros, as mentiras, os equívocos doutrinários da Igreja são apagados com um pedido de perdão histórico. O petismo justifica seus erros e sua corrupção ideológica alegando que o mundo evoluiu e seus revolucionários acompanharam as mudanças.
O petismo subsistirá na medida em que, à imitação de sua mãe católica, seja capaz de manter Lula no Vaticano pátrio e garantir a manipulação de todos os departamentos da máquina governamental entregues a subordinados submissos, dispostos a darem a própria vida na arena política sem medo de ser felizes no paraíso ou no inferno.
O país está diante de uma imponderável perspectiva democrática além do fugaz voto eleitoral. Não há indícios de que a Igreja pretenda amaldiçoar seu filho pródigo por ter desperdiçado o patrimônio revolucionário querido e ordenado pelo Deus do Vaticano.
O lulismo petista será vencido por si mesmo, pelo cansaço, pelo esgotamento de sua fantasia de poder e pela náusea moral que a promiscuidade ideológica provocará na sociedade em poucos anos.
Blog 02.08.2010

terça-feira, 22 de maio de 2012

SUSTENTÁVEL, O QUE É?



Às vésperas da Conferência Rio+20 e da Brasília+50, cresce a excitação investigativa sobre o termo “sustentável”. Cidades sustentáveis (milhões de automóveis, ocupação de morros e margens de rios, alagamentos, desmoronamentos de encostas, não captação de águas pluviais), agricultura sustentável (desmatamento da Amazônia, do Cerrado para produção de commodities, desperdício de água) e economia verde referem-se diretamente à produção de alimentos, à satisfação de necessidades de sobrevivência, reprodução da espécie e ao conforto da população.
O aumento da população, no campo e nas cidades, provoca diretamente uma ampliação da produção de bens de consumo e de serviços que se define como “crescimento econômico”. Os bens e os serviços são todos retirados da natureza pela criatividade humana, com o fito de sobrevier e se reproduzir. Não há outra fonte. É a natureza que nosso único planeta nos presenteia.
A população cresce em todos os cantos da Terra. Em uns com mais intensidade que em outros. Em alguns países, a população consome mais e, não podendo produzir tudo, importa de outros lugares. Em outros países, mesmo exportando alimentos ou produtos que geram riqueza supérflua como petróleo, diamantes e ouro, a população não usufrui um nível de vida semelhante ao de nações ricas. Há, finalmente, uma população estimada, hoje, em 2 bilhões de pessoas que não consomem ou mal conseguem o necessário para sobreviver parte do tempo que a existência lhes destinaria.
Por isso, o crescimento assimétrico, desencontrado da economia em um país ou no conjunto dos países, não está propiciando bens de consumo e de serviços a toda a população do planeta. Para diminuir a desigualdade entre os consumidores de bens e serviços, será irracional pôr a criatividade humana no estímulo ao crescimento econômico indefinido e infinito. Há, hoje, tecnologia suficiente para obter do planeta alimentos e riquezas para o conforto humano. No entanto, um terço da população do planeta não consegue obter bens essenciais necessários à sobrevivência – água potável, alimento suficiente e teto adequado.
Para dar sentido ao termo sustentável, em qualquer circunstância, será necessário conduzir a criatividade racional das pessoas habitantes do planeta, ao mesmo tempo, em duas direções. A primeira, reduzir a zero, gradativa e implacavelmente, o crescimento da população humana no planeta para proporcionar melhor divisão aritmética, política e ecológica dos bens e dos serviços retirados das riquezas naturais. Com esta medida, diminui-se drasticamente o tamanho dos rebanhos artificialmente estimulados para produzir proteínas. No Brasil, o rebanho bovino é igual, em número, ao de habitantes. As áreas verdes, em consequência, teriam tempo de se recompor e aumentar.
A segunda se refere à mudança radical nos hábitos de consumo e na ocupação dos espaços verdes para reduzir gradativamente o impacto sobre a natureza, isto é, sobre os elementos essenciais: água, oxigênio e ar puro. Melhoraria, em consequência o impacto da natureza sobre as pessoas e todos os seres vivos.
Repete-se, hoje, com mais frequência, pelos meios de comunicação, que se toda a população da Terra quisesse e pudesse consumir como o americano, o canadense ou os ricos brasileiros torna-se ridículo e insensato discutir a sustentabilidade das cidades e da agricultura, pois se necessitariam ao redor de quatro planetas e só temos um.
Passaram-se 20 anos desde a Conferência Eco-92 (Rio+20). O crescimento econômico foi estimulado, saudado, louvado e levantado como bandeira eleitoral. Mas o avanço do crescimento dito “sustentável” se precipitou no abismo da insustentabilidade. O termo “sustentável” passou a representar uma quase superstição religiosa. Talvez tenha sido essa superstição que levou uma empresária carioca a perguntar publicamente diante dos majestosos estádios que se abrirão para os jogos da Copa do Mundo:
– Afinal, o que é sustentabilidade?

quarta-feira, 16 de maio de 2012

DEVAGAR

Devagar

 Caminhe devagar.

Contrarie normas e conselhos dos fanáticos da corrida.

Passo a passo, ponha os pés no chão, com vagar.

Saboreie a terra.

Pare.

Sinta o solo rodando no espaço incomensurável.

Vá com o planeta entre galáxias.

Pare. Olhe a seu redor.

Há plantas, flores, formigas, borboletas, pássaros.

Ande lentamente.

Tome a brisa no rosto e as carícias do sol matinal.

Pare. Olhe o firmamento.

Ali há lugar para o pensamento, para a liberdade.

Repouse sob a árvore.

Respire o murmúrio das folhas que exalam o ar purificado.

Deixe-se abraçar pelo silêncio imóvel da sombra.

Caminhe devagar.

Não queira chegar a lugar algum.

O tempo o levará ao destino.

Procure apenas o caminho.

Busque sua rota como a estrela no céu.

Caminhe um caminhar devagar.



SÍTIO DAS NEVES (DF) 12.09.2007


segunda-feira, 14 de maio de 2012

DESEMPREGO REMUNERADO


Relatos históricos, etnográficos e antropológicos sobre os habitantes das terras e rios brasileiros ocupados pelos portugueses, em 1500, não mencionam, em momento algum, o desemprego como consequência da organização social autóctone. Conclui-se que um mundo diferente já foi possível.
O desemprego, o boicote à criatividade de imensas populações é uma invenção da era industrial que veio para ficar. O desemprego, em nossa era pós-industrial, encontrou na tecnologia e na esperteza formas de ter dinheiro sem ter a carteira de trabalho assinada, um dos sonhos do brasileiro.
Há dez mil anos, quando a produção de alimentos conseguiu excedentes para períodos não produtivos, organizaram-se os artistas, os músicos, os escribas, os sacerdotes para o ócio intelectual sob a regênvia de um monarca. O campo produzia. As aldeias desfrutavam da abundância. Hoje, em escala maior e mais sofisticada, o ócio tecnológico domina os governos, a burocracia generalizada, as finanças e todas as atividades virtuais, especialmente a informação e a comunicação. Fala-se diariamente com pessoas invisíveis e desconhecidas.
O desemprego, que era caracterizado pela falta de renda, consistia numa espécie de punição sem culpa. Voltamos, agora, à era pré-colombiana. Não temos desemprego no sentido clássico da falta de remuneração. O PIB, uma espécie de zumbi infiltrado na economia, cresce mesmo com 70 milhões que não têm emprego econômico, pois todos recebem uma remuneração como prêmio do ócio para não perturbar a paz da organização social.
Um mundo diferente está sendo possível, isto é, obter renda sem emprego. Nos estacionamentos diurnos e noturnos, oficiais ou extraoficiais, nos semáforos, nas portas dos bancos, supermercados e restaurantes, pelo telefone, rádio, TV e Internet, arrecada-se dinheiro ocioso. Há formas um pouco mais arriscadas de se obter dinheiro. Neste caso, o volume de dinheiro é proporcional ao risco.
Diz a polícia especializada. neste ramo de arrecadação de dinheiro. que a distração é a porta de entrada do cofre. Sequestros criativos levam jovens casais e aposentados distraídos aos caixas eletrônicos e lhes sacam as economias ociosas. As drogas, comandadas por armas roubadas ao exército, por distração, chegam aos incautos. Funcionários de bancos ou órgãos do governo se aproveitam das distrações dos colegas e transferem somas de uma conta a outra.
Até a senhora Dilma Rousseff, mãe do PAC, ex-chefe da Casa Civil e hoje presidente da república, numa ligeira distração, estressada pelas atividades burlescas de companheiros aloprados, foi vítima da Delta e dos meninos delinquentes do Cachoeira que lhe tomaram bilhões de reais.
É o mundo diferente, não só possível como real, no qual vivemos. Somos todos empregados e remunerados para pagar o ócio da câmara dos deputados, do senado e do governo.
Saúde!

segunda-feira, 7 de maio de 2012

UNIVERSO



 

Estou num ponto do paralelo-15, entre árvores milenares, num campo cerrado, dominado pelo sol de maio. Único da espécie homo sapiens, rodeado de seres que vivem incógnitos, da minúscula gramínea ao jacarandá frondoso.
O universo sabe que eu existo. Toma-me em seu colo e roda-me pelo espaço entre estrelas e galáxias.
Posso ouvir grilos e cigarras, o farfalhar das folhas que o vento balança, a mensagem das estrelas e da meia-lua num firmamento expandido.
Neste ponto secreto do paralelo-15 tenho o universo inteiro a olhar para mim.
O universo é meu, como eu sou do universo. Sou um entre bilhões. Eu mesmo sou o bilhão que o universo abriga para a felicidade individual e universal.
Um ponto apenas do paralelo-15 pode revelar a face do universo oculta pela sombra das ambições de teres e haveres sobre a serenidade dos seres.
O universo sou eu imerso na totalidade do universo.
Giro no espaço sideral, a bordo de um planeta, batido por ventos e tempestades, calores sufocantes e frios gelados, raios e trovões, instrumentos da orquestra sinfônica universal.