terça-feira, 24 de janeiro de 2012

ÁGUA EM 2040 NO DF

Vista do Manancial do Pipiripau, Distrito Federal, ameaçado de extinção.

Acompanhei, durante duas horas e meia, no Conselho de Recursos Hídricos, do Distrito Federal, uma detalhada exposição de cenários que antecipam a realidade de oferta de água em 2040. Sobrevoei a plateia com o olhar e concluí que metade dos presentes não estará, nessa data, para comprovar as profecias dos cenários apresentados. E como sobreviverá a outra metade é problema dela.

O expositor impressionou a atenta assistência com números, gráficos, curvas, colunas em variadas cores. As imagens apareciam e desapareciam, magicamente, mostrando que a base da oferta de água dependeria de cenários de crescimento econômico nacional e internacional, acelerado, moderado, retraído. O PIB, evidentemente, será o general a comandar as forças econômicas, os investimentos e o consumo que determinarão maior ou menor oferta de água. A função divina do PIB é transformar toda a obra humana em um percentual.

Na lógica pibeana, água escassa será mais cara e mais difícil de comprá-la. Daí a necessidade de uma “estratégia de gestão hídrica” consolidada num plano institucional integrado para chegar ao ano 2040 com falta de água, mas bem gerenciada. Esse plano terá o suporte de leis, regulamentos, normas de controle, fiscalização, um forte ingrediente educativo, instituições especializadas, profissionais ligados a redes e satélites para coordenar a guerra da oferta e demanda de água. Hoje, existe uma orquestra institucional tocada por uma dezena de instrumentos desafinados, com partituras incompletas e sem maestro. Todos, porém, querem tocar sua parte institucional sem ouvir os do lado, nem olhar para o maestro e, menos ainda, para as reações da plateia distraída que manda, como na sala Villa Lobos, mensagens pelo Iphone.

Em se tratando de água, sabe-se que a quantidade existente no planeta é a mesma desde milhões de anos. O que varia é o número de consumidores humanos, vegetais e animais. O cenário é simples: temos um volume fixo de água, nem sempre no local desejado, e uma quantidade variável de consumidores. A água disponível no DF, por exemplo, é a mesma de 1960, quando Brasília foi inaugurada, com 140 mil habitantes, e a de 2012, com uma população de 2,6 milhões de pessoas.

Estima-se que, em 2040, haverá uma população humana de 6 milhões. A oferta de água não se altera. Apenas que terá que ser canalizada de muito longe. A projeção do consumo é aritmética. Passa-se de um consumo, hoje, de 520 milhões de litros/dia para 1 bilhão e 200 milhões em 2040 (consumo per capita de 200 litros/dia). Essa demanda é apenas de consumo humano, isto é, o uso diário das pessoas. O comércio, a indústria e a agricultura têm suas demandas setoriais.

A pergunta, então, é: quem vai ficar sem água? Os humanos, os vegetais, os animais? Como reagirão eles à falta de água? Salta aos olhos que o cenário demográfico, nas três dimensões, é mais importante do que cenários macroeconômicos. Populações menores pressionam menos a economia e gasta menos água. Quem se importa com o cenário demográfico em três dimensões?

As taxas de fertilidade humana vêm caindo, mas isto não impede que a população cresça. E, hoje, vive-se alguns anos a mais. Portanto, se gasta mais água. Nos cenários apresentados pelo competente expositor, ficou claro que, em 2040, a água estará escassa e não alcançará democraticamente a todos.

Estranhei que nas medidas aventadas para gerenciar os “recursos hídricos” não se mencionasse a captação de águas da chuva que, atualmente, têm sido abundantes. A civilização Zenú, nos Andes colombianos, alguns séculos antes da imigração europeia à América do Sul, captava as águas nas cheias do rio Madalena, nas áreas planas, por meio de canais em forma de espinha de peixe. Os japoneses recolhem em galerias subterrâneas as imensas águas que caem sobre Tóquio em volume mil vezes superior às que inundam Minas e São Paulo.

Em vez de captação de águas pluviais, os sobreviventes de 2040 terão que preparar-se para o racionamento diário associado ao custo implacável da água. Por essas falhas no planejamento demográfico humano e pelo consequente aumento da população animal destinada a suprir a população de proteína é que será quase impossível deter a invasão da Amazônia e do Cerrado. Em consequência, a expansão de áreas de desertos rurais e urbanos torna ainda mais difícil o suprimento de água.

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