segunda-feira, 31 de dezembro de 2012


CONVERSA COM CARL SAGAN

Carl Sagan, astrofísico da Universidade Cornell (EUA), consentiu, na virada de 2012 para o 2013, em dar dois dedos de prosa ao Observador.

O.     Como surgiu a vida?

C.S. As atmosferas primitivas compunham-se dos mais variados átomos e eram ricas em hidrogênio. A luz solar, incidindo sobre as moléculas da atmosfera primitiva, dinamizava-as, induzindo choques moleculares e produzindo moléculas maiores.

O.     E a nossa vida?

C.S.  Essas moléculas, por incrível que pareça, são as mesmas de que somos feitos: os ácidos nucleicos são o nosso material hereditário e as proteínas, os artífices moleculares que executam o trabalho da célula. Foram produzidos pela atmosfera e pelos oceanos da Terra primitiva.

O.     E como se reproduzem?

C.S. Há bilhões de anos, formou-se uma molécula de propriedades notáveis. Era capaz de produzir, a partir dos blocos de construção moleculares da água que a cercava, uma cópia bastante exata de si mesma. Esse sistema molecular – capaz de duplicação, mutação e reprodução de suas mutações – pode ser chamado de vivo.

O.     E como subsistem no ambiente?

C.S. As concentrações simples de moléculas capazes de transformar o ambiente e de produzir mecanismos eficientes para se converter em moléculas complexas conseguiram sobreviver, se adaptar ao meio. As moléculas se envolveram em membranas muito sutis. Surgiram as primeiras células.

O.     E o trabalho das células?

C.S. Esses organismos vivos chamados células trabalharam arduamente e o resultado desse esforço são as plantas. As plantas produzem, a partir do ar e da água, de minerais e da luz solar, blocos de construção molecular muito complexos. Os animais, tais como os seres humanos parasitam as plantas. As plantas são a garantia da sobrevivência e da reprodução da vida no planeta.

O.     Então, é adaptar-se ou desaparecer?

C.S. Os mais fortes, os que se adaptam às mudanças, sobrevivem. O segredo da evolução é o tempo e a morte. Entre as adaptações que nos parecem úteis está a que chamamos de inteligência. É um truque molecular para se adaptar, controlar e sobreviver às mudanças do ambiente. A inteligência molecular capta as informações de qualidade adaptável que foram desenvolvidas por um indivíduo de sua espécie e essa informação é transmitida pelos ácidos nucleicos de uma geração à outra. Os golfinhos e os grandes macacos possuem inteligência. Porém, ela é mais evidente no organismo chamado homem. As adaptações criam técnicas e tecnologias eficientes que permitem sua reprodução e a transferência dessa capacidade evolutiva. Quais são os limites da tecnologia? O tempo dirá.

O.     Se somos todos herdeiros da mesma molécula, por que guerras entre humanos?

C.S. Num sentido muito real os seres humanos são máquinas montadas pelos ácidos nucleicos a fim de assegurar uma duplicação eficiente de outros ácidos nucleicos. Não resta dúvida de que nosso mecanismo instintivo pouco mudou desde os dias de caçadores coletivos. A sobrevivência do mais forte tem raízes genéticas. O conflito, porém, está em: o que sentimos que devemos fazer em função de nossos instintos primitivos e o que sabemos que devemos fazer em função de nosso aprendizado extragenético.

O.     Solidariedade entre todos os seres vivos?

C.S. Já chegou o momento de termos respeito, reverência, não só pelos seres humanos, mas por todas as formas de vida, como teríamos respeito por uma obra-prima de escultura ou por uma máquina primorosamente usinada. As mudanças drásticas do ambiente provocadas pela reprodução e sobrevivência do organismo chamado homem causam modificações nas transferências genéticas e as adaptações podem tornar-se mais difíceis e perigosas. A interdependência dos seres vivos é o próprio segredo da vida no planeta Terra. 



JOÃO CARLOS TAVEIRA, poeta, residente na maravilhosa cidade de Brasília, amigo de todos os seres vivos que habitam o planeta, incluindo os humanos de quem recebe especial afeto, envia por estas águas seus nobres sentimentos de paz e felicidade. Orgulho-me de ser seu amigo. Eugênio Giovenardi

BOAS FESTAS PARA O PLANETA TERRA

       Desejo a todos os meus 154 amigos do Facebook um 2013 cheio de paz, saúde, alegria, realização e prosperidade. Pensando bem: esses votos são extensivos a todos os seres humanos que fazem parte dessa barca chamada vida, estejam onde estiverem, em cada canto do Planeta. Pensando melhor: esses votos podem ser perfeitamente estendidos a todos os outros seres dos reinos mineral, vegetal e animal. Afinal, eles também fazem parte da travessia — essa barca chamada vida. Agora sim. Feliz Ano-Novo para todos.
JOÃO CARLOS TAVEIRA.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012


BRASÍLIA, DISTRITO FEDERAL E PLANEJAMENTO


Um professor emérito da UnB comentou-me sobre sua participação num grupo que se propõe a planejar o desenvolvimento da metrópole brasiliense com vistas ao ano 2060. Diante de um futuro tão incerto e distante, o grupo recuou para 2032.
Fotografando os fatos econômicos, sociais, culturais e ambientais, em 2012, percebe-se que nossos governantes de turno, funcionários de carreira, centenas de congressistas que se sucederam nos últimos 50 anos, empresários da indústria, do comércio e da agricultura não têm demonstrado experiência nem vocação para o planejamento de longo prazo.
Administram os apagões de cada dia. Sua visibilidade é o período de quatro anos, renováveis por mais quatro. Os planejadores contam, hoje, com meios tecnológicos que poderiam facilitar a análise dos dados e elementos possíveis de associar, fatores favoráveis e adversos, elaboração e aprovação de projetos integrados para enfrentar as realidades não lineares que se alcançam vislumbrar.
Exemplos de planejamento de longo prazo deram os mandarins da ex-União Soviética, Japão e Israel. A Finlândia selecionou uma prioridade – educação – e a projetou para um período de 50 anos, à qual estavam submetidos os governos e o congresso que se sucedessem. Três critérios regem o plano educativo: ensino público universal gratuito; preparação de professores selecionados entre os melhores alunos; salários e recursos financeiros adequados. Desenharam uma situação futura de igualdade diante das oportunidades baseada na educação como forma de cooperação qualitativa de todos os cidadãos na construção do bem-estar comum.
Nos bancos da universidade aprende-se que planejar é pintar ou marcar circunstâncias e situações que se almejam obter no futuro, num lugar e para uma população definida. Trata-se de avançar menos sobre números e estatísticas e mais sobre as circunstâncias que figurarão no futuro, aptas a satisfazer plenamente uma população, preservando as riquezas naturais ao longo da execução de projetos e programas.
Dr. Lúcio Costa projetou uma cidade para ser capital do país. Não planejou o desenvolvimento da cidade. Estimou-se uma população de 500 mil habitantes para a capital sem combinar com políticos e empresários da construção nem com a própria população. Estabeleceu quatro pontos cardeais – gregário, bucólico, residencial e monumental – para definir a arquitetura, a arte e a estética do Plano Piloto. Niemeyer ocupou-se do monumental.
Se o Plano Piloto conserva, bem ou mal, essas quatro características de seu projeto, a expansão da cidade-capital nos bairros – cidades satélites– obedece ao impulso das migrações atendidas no dia a dia pela administração pública e pelo apetite do setor imobiliário da construção civil. Arquitetos, professores universitários, geógrafos, urbanistas e ecologistas têm criticado em publicações e conferências a ausência flagrante do planejamento urbano para Brasília.
No projeto descritivo de Lúcio Costa, definiu-se que 80% da área do Distrito Federal seriam reservados para a agricultura, abastecimento da população residente e preservação dos mananciais, da fauna e da flora do cerrado. Somente 20% da área seriam destinados à urbanização e à construção da cidade que pelo seu ineditismo arquitetônico foi guindada a Patrimônio Cultural da Humanidade.
O crescimento geométrico da população comandou a improvisação de todos os serviços decorrentes para satisfazer suas necessidades, requerimentos e sobrevivência, executados no dia a dia segundo as injunções políticas do momento. Inverteu-se o fluxo de adaptação. A cidade adaptou-se à população ao invés de os assentamentos humanos adaptarem-se ao projeto da cidade.
Fora do espaço do Plano Piloto, que seria o protótipo do desenvolvimento da cidade modelo, a urbanização seguiu o exemplo de qualquer outro agrupamento urbano, transformando-se numa metrópole massiva, de limites indefinidos, trânsito caótico, invasões de áreas verdes, multiplicando os erros urbanos que pretendia evitar.
Brasília, em sua majestosa aparência, congrega as mais contundentes contradições e desigualdades do país. Os maiores e os menores salários. Academias públicas e privadas, a elite intelectual e política, escolas de ensino fundamental deficientes ou depredadas, mansões e tugúrios. Mas todos têm em comum a glória e o orgulho de ostentar um endereço único: sou brasiliense.
Brasília, como o Brasil, finge de se propor a tarefa de planejar e antecipar situações futuras. Os governos estão equipados com múltiplas instituições que se sobrepõem em competências e jurisdições. O DF conta com 34 secretarias entre elas: Secretaria de Planejamento e Orçamento, Secretaria de Assuntos Estratégicos, Secretaria de Habitação, Regulamentação e Desenvolvimento Urbano, Secretaria de Desenvolvimento Econômico. Os planos e propósitos, os programas e projetos tendem a se exaurir na retórica, nos discursos, nas proclamações, nos desabafos administrativos. Demora-se a começar. Podem os planos nunca se iniciar. Interrompem-se com razões que se justificam por deficiências orçamentárias. Abandonam-se projetos iniciados. Planos e projetos obedecem à lei da flexibilidade e entregam-se com a qualidade do mais ou menos.
O planejamento se esgota, por cansaço, no que é possível fazer no dia a dia.  O dia a dia comanda, hoje, no DF e no Brasil, a execução dos serviços dando exíguo espaço ao planejamento. O amanhã dirá se o começo de um projeto deve ou não continuar. Percebem-se obras em andamento. Não sabemos para onde vamos nem quando chegaremos. Os planejadores dos governos se defrontam com o mais ladino e imprevisível dos inimigos: o próprio governo.

15.12.2012

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012


É MUITO MAIS ÁGUA DO QUE SE IMAGINA

(Foto: Barragem de pedra, captação e detenção de águas da chuva. Sítio das Neves, DF )

A Agência Nacional de Águas instalou um pluviômetro no meu Sítio das Neves. A impressão que se tem, às vezes, é que choveu pouco. Outras, que choveu muito. Mas esse pouco e esse muito quanto é? Pois, aqui estão alguns dados inacreditáveis a olho nu.
No mês de novembro, 2012, a precipitação foi de 228,3 mm, ou seja, 228,3 litros por metro quadrado. Esse volume dá uma média diária de 7,61 litros por metro quadrado. O volume  diário ou total deve-se multiplicar pela área do Sítio que é de 700.000 metros quadrados.
Quer dizer, durante o mês de novembro, caíram em média sobre o Sítio das Neves 5 milhões e 200 mil litros por dia, volume suficiente para abastecer o consumo de um dia de uma cidade de 26 mil habitantes (200 litros por pessoa/dia).
O total de 159 milhões e 800 mil litros caídos no Sítio, no mês de novembro, pode abastecer o consumo de um mês a uma comunidade de 2.663 habitantes (200 litros pessoa/dia x 30).
Em outros números: 5.200 metros cúbicos por dia, num total de 159.800 metros cúbicos no mês.
Para onde vai a água das cidades? Alagam ruas, invadem casas, transbordam córregos, causam desastres anuais. E a gente não aprende. Por quê? Porque não se tem ideia de quanta água cai.
No meu Sítio, totalmente coberto de vegetação, com mais de uma centena de pequenas barragens, mais de 70% da água é captada e retida permitindo uma excelente infiltração para recarga dos aquíferos e revitalização das nascentes que formam os córregos que aqui se originam.
O mês de dezembro se mostra mais chuvoso. Nada como a abundância de água para a felicidade de todos os seres vivos do universo.

16.12.2012

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

MESA DE LEITURA

 

Ao redor da mesa, os leitores olhavam-se, sorriam, pensavam em voz alta. Éramos oito. No meio deles, via-me pequeno, feliz, com uma pontinha de inveja. Eles expressavam pensamentos surpreendentes com poucas palavras. E esses pensamentos, extraídos da experiência individual, de histórias, de fatos, de conquistas da mente, de decepções, de esperanças, enchiam livros.
Meus convidados presentearam livros uns aos outros. Cada um de nós tinha sob os olhos a alma inteira desses amigos que distribuíam suas palavras a leitores desconhecidos. Na ponta da mesa, estava Clarice Lispector ao lado de Oscar Wilde, depois Graciliano Ramos, Hannah Arendt, Carl Sagan, Marguerite Yourcenar, Oswald de Andrade.
– São bilhões e bilhões de astros, galáxias, estrelas e de seres vivos, disse Carl Sagan para espanto de todos.
– O desespero é atitude digna e sinal de inteligência diante do que é desconhecido, refletiu Hannah Arendt.
– E todas aquelas pessoas se reconhecem pelos remendos, pela roupa suja, pela imprevidência, pela alegria, acrescentou Graciliano Ramos com uma pitada de angústia.
– A eternidade, o que é? A mesma coisa de outra forma, revelou Marguerite Yourcenar com sorriso indefinido.
– Somos uma raça anã teimosa que um dia vai talvez reivindicar o direito ao grito. Será a hora da estrela desconhecida, sussurrou Clarice Lispector olhando para Carl Sagan.
– No silêncio tique-taque da sala de jantar, informei mamãe que não havia Deus porque Deus era a natureza, contou Oswald de Andrade.
– Viver pelo prazer! Nada envelhece tão bem quanto a felicidade, disse Oscar Wilde.
Da esquina da mesa, lembrando que a “felicidade se acha em horinhas de descuido”, mudo e atônito, olhei para aqueles rostos brilhantes e desejei estar com eles na eternidade.

2/12/2012