POR QUE, EM 2018, OS RESERVATÓRIOS
NÃO ALCANÇARÃO 50% DE SUA CAPACIDADE
Ofereço alguns pontos inquietantes que poderiam constar
das estratégias da administração pública e das mudanças de atitudes e
comportamentos da população para enfrentar a transição hídrica reclamada pela
escassez de água no Distrito Federal.
SUPERFÍCIE DOS LAGOS DE RESERVA
A extensão do Descoberto é de 17 km2 = 17 milhões m2.
Para saber o volume de chuva sobre a área multiplica-se a quantidade de mm
marcado nos pluviômetros pelos metros quadrados da área. Características do
Descoberto: mananciais desprotegidos, espaços abertos, devastados, sugados
pelos produtores, impermeabilizado pela urbanização.
A extensão do Santa Maria é de 6,1 km2 = 6,1 milhões
m2. Mesmo procedimento sugerido acima. O reservatório está inserido
no Parque Nacional com 42.389 ha e 28 mil ha de área cercada. – Protegido,
favorecido pela captação realizada graças à vegetação.
A do Lago Paranoá é de 42 km2 = 42 milhões m2.
Mesmo procedimento. Área aberta, desnuda, desprotegida, impermeabilizada pela
urbanização. Recebe enxurradas, lama, lixo das vias e dos córregos.
Capacidade
dos reservatórios
O reservatório do
DESCOBERTO, DF, inaugurado em 1974, foi projetado para armazenar 102 trilhões
de litros de água ou bilhões de m3. Chegou a 5% no mês de
novembro/2017 (ou 5 trilhões de litros). O SANTA MARIA foi projetado com
capacidade de armazenamento de 58 milhões de m3 ou 58 bilhões de
litros. Estava, em novembro/2017 com 22% (ou 12 bilhões de litros). O LAGO
PARANOÁ, do qual se retiram 2 e meio milhões de litros/dia, se alimenta, em
parte, das águas do Santa Maria, de outros tributários agonizantes e das
torneiras do brasiliense. Os obstáculos que podem impedir que os reservatórios
alcancem sua capacidade, em 2018, se referem a um conjunto de causas
simultâneas e não dialogáveis: fenômenos naturais e atos humanos.
I.
Consequência de fenômenos naturais
Alertas constantes, medições
matemáticas e estatísticas reafirmam o avanço das mudanças climáticas com
características extremas: aquecimento global e regional, secas prolongadas, irregularidade
de chuvas, tempestades, inundações, furacões, agravados com terremotos,
erupções vulcânicas e tsunamis. O Brasil está sendo afetado por alguns desses
fenômenos estremos. O Nordeste e o Distrito Federal enfrentam escassez de água.
A última década nos deu sinais claros de que, por razões climáticas, teríamos
dificuldades de acesso à água. Não foram tomadas as precauções a tempo e os
efeitos se refletem no racionamento que representa uma restrição ao mal-uso da
água.
Circunstâncias geográficas deram
ao Planalto Central a função de ser o berço das águas. Pequeninos olhos d’água,
ao longo de muitos quilômetros, formam rios ao Sul, ao Norte e ao Nordeste do
país. E por ser berço das águas, o Planalto Central é um ambiente geográfico
frágil e delicado. A água, criança indefesa desse berço, precisa de cuidados
especiais, de atenção, de maternal afeto. O Planalto Central é um bebê no berço
das águas e reclama atenção permanente. Quando percebi a degradação do berço
das águas do Planalto Central, tornei-me babá do Cerrado
A capacidade de resistência deste
berço e deste espaço é limitada. Silêncio, paciência, repouso contrastam com o
atropelo e a pressa em ver a criança crescer.
O que está acontecendo no espaço
do berço das águas é a invasão, o atropelo, a pressa, o desrespeito à
identidade do bioma e seus ecossistemas geradores do DNA geográfico de outras
regiões.
II - Causas
antropogênicas (geradas pelo homo sapiens)
O consumo de água pela população e todos demais seres vivos do
DF é permanente e progressivo, com ou sem chuva. A oferta de água dos
mananciais é permanente, mas em volumes descendentes pelas razões que se
apontam a seguir.
A primeira causa é o aumento progressivo
da população do Distrito Federal e as consequências que dele decorrem. O
planejamento da expansão urbana foi atropelado pela ocupação desrespeitosa das
áreas de mananciais por parte da administração pública, da ação política
eleitoreira, da indústria imobiliária e da própria população premida pelas
condições sociais e econômicas. A desigualdade social e econômica gera a
desigualdade ambiental e ecológica da população brasiliense.
A deficiência do transporte
público induziu o uso do carro individual que, por sua vez, impôs um sistema
viário antiecológico e depredador dos ecossistemas. As vias asfaltadas, durante
o período chuvoso, funcionam como canais de escoamento da água arrastando
terra, lixo, folhas e dejetos contaminantes para os córregos e reservatórios.
A ocupação de áreas de mananciais
ou de proteção ambiental permanente é agravada, anualmente por queimadas e
desmatamento, e impedem que a infiltração das águas da chuva se faça com
eficiência. Obstrução dos fluxos de água, a canalização inadequada e a impermeabilização
de áreas de recarga dificultam radicalmente a função precípua da vegetação
nativa de captar as águas da chuva nas áreas de mananciais.
O mal-uso da água pela população
se faz na cidade e na agricultura. A água retirada do reservatório e que não
retorna à fonte de onde foi extraída é considerada de uso consuntivo ou
eliminada. Pode ser reusada, mas não volta à fonte original. Na agricultura, o
volume de água de uso consuntivo, isto é, que não volta ao rio ou ao aquífero profundo
costuma ser de 50 a 60%. Os processos produtivos devem considerar a reposição da
água utilizada mediante técnicas de captação por meio de corredores vegetais e
preservação de mananciais. As águas retiradas de poços artesianos não voltam
mais às fontes e devem ser consideradas de uso consuntivo – águas eliminadas -
e precisam ser rigidamente controladas e fiscalizadas pela administração
pública.
Embora viver na cidade seja a
tendência universal da espécie humana, a urbanização horizontal e vertical, no
DF, é contrária à lógica hídrica desta região. A disponibilidade de água, mesmo
durante o período chuvoso, não comporta o atual crescimento da população de 50
a 60 mil habitantes/ano. O aumento da população é acompanhado pela crescente
diversidade do uso da água em razão da limpeza urbana, da higiene pessoal, dos
hospitais, da alimentação, da indústria e do comércio.
Soluções
à vista
A água é uma necessidade de cada
dia. Por isso, o cuidado com a água deve ser diário e indefinido no tempo.
Integramos a natureza que não tem prazo para acabar e participamos da
biodiversidade do bioma no qual ela se manifesta com identidade específica.
É necessário rever a capacidade
de suporte do espaço físico em relação ao crescimento da população. Determinar
as consequências hídricas para o ecossistema e para a população do DF.
Identificar a área mínima (dois a
três hectares) em torno dos mananciais e garantir a formação e consolidação da
vegetação nativa capaz de abastecer as nascentes de água.
Adotar nascentes com técnicas de
captação de águas da chuva por meio de barragens simples nos canais de
esgotamento.
Estabelecer e delimitar zonas
ambientais de recarga (ZAL) de aquíferos, como parques, áreas de circulação de
animais, refúgio de pássaros ou corredores de segurança florestal.
Disseminar técnicas e práticas do
reuso de água para fins de limpeza ou regadio.
Promover e estimular empresas que
produzam equipamentos adequados a casas e edifícios para captação de água da
chuva, bem como subsídios financeiros para implantação dos artefatos por parte
dos interessados.