2021 – O ANO DO NARIZ
COMENTÁRIOS SEMANAIS SOBRE MEIO AMBIENTE, POLÍTICA, LITERATURA E OUTRAS SUTILEZAS DO COTIDIANO.
sexta-feira, 25 de dezembro de 2020
2021 – O ANO DO NARIZ
sexta-feira, 18 de dezembro de 2020
POR QUEM DOBRAM OS SINOS
AMIGOS,
POR QUEM DOBRAM OS SINOS
POR QUEM CHORAM OS VIVOS
Até hoje, 184.000 mortos, ao longo e largo do país, foram recrutados pelo vírus covid/19. Quase dois milhões choram por quem dobram os sinos: pais, mães, viúvos e viúvas, avós e avôs, irmãos e irmãs, tios e tias, sobrinhos e sobrinhas, amigos e amigas, sem despedida.
Se nesse jogo aleatório do V/19 fossem sorteados 90 deputados e 60 senadores, quem choraria por eles?
Se a escolha da roleta do V/19 levasse 300 ministros, juízes, desembargadores dos tribunais de justiça, quem choraria por eles?
Se o covid/19 abatesse toda a cúpula do exército, a elite dos funcionários do Estado, quem choraria por eles?
Se metade da família presidencial fosse dizimada pelo vírus/19, quem choraria por ela?
A pátria desolada, todos os sinos dobrariam e o povo compassivo choraria por eles.
Quem e quantos ainda precisam ser sacrificados para que se acenda a luz do bom senso, da sensatez, do altruismo e da sabedoria política?
As ambições pequenas aprisionaram o país e levantaram grades entre os cidadãos.
Desta prisão, escrevi cartas aos amigos como um brado de alerta e de estímulo esperançoso à nobreza da convivência entre as pessoas, à reaproximação e ao respeito à natureza generosa do país.
quinta-feira, 17 de dezembro de 2020
NEGAVIRUS/19
quinta-feira, 26 de novembro de 2020
IDIOMA DA NATUREZA
IDIOMA DA
NATUREZA
O idioma da
natureza é o silêncio.
Os sinais são
visíveis para o olhar, são audíveis para o ouvido, são tactáveis para o tato,
são oloríferos para o olfato e saborosos para o paladar.
É com os cinco
sentidos que se pode ouvir a natureza.
Penetrando em
silêncio no espaço virgem de um ambiente natural, uma cena impactante é a
conjugação indissolúvel da árvore com a água.
Esses dois
elementos, acariciados pelo sol ou embalados pelo vento ou pela carinhosa brisa
matinal ou vesperal configuram a paz saudável da qual desfrutam todos os seres
animados em terra, ar ou água.
Para ouvir a
natureza, há que se chegar de mansinho perto dela.
Ela fala pelo
trovão da tempestade,
Pela chuva que
molha os campos.
Pelo cicio das
folhas embaladas pelo vento.
Pelo grito
uníssono das curicacas.
Pelo grunhido
cadenciado do tucano.
Pelo choro
reprimido dos bambus.
Pelo chuá das
cachoeiras saltando pedras.
A natureza
fala pela vida que palpita no chão, no ar, na água.
A natureza
fala pela dança alegre das borboletas azuis.
A natureza
fala pelo silêncio das árvores.
18.11.2020
sexta-feira, 6 de novembro de 2020
O ROSTO DAS ÁRVORES
O ROSTO DAS ÁRVORES
quinta-feira, 5 de novembro de 2020
PROJETO
OLHO D’ÁGUA
RELATO
DE EXECUÇÃO
SÍTIO DAS NEVES - DF
INTRODUÇÃO
O projeto Olho d’Água começou em 1980, no Sitio das
Neves,. com a finalidade de proteger uma área de 70 hectares do bioma Cerrado.
Localizada à margem esquerda da Rodovia BR 060, direção Brasília Goiânia, na
altura do Km 26, no perímetro do Distrito Federal. Integra a bacia hidrográfica
do Rio Santo Antônio do Descoberto e a micro bacia do Ribeirão das lajes..
A área total do DF é de 582.200 hectares (5.822 km2).
Segundo o plano de ocupação regional do DF, 80% (450.000 ha) seriam reservados
às atividades rurais, reflorestamento, preservação de nascentes e cursos de água,
e 20% (132.000 há) à urbanização ( serviços, habitação, educação, comércio,
lazer, rodovias).
Atualmente, a urbanização absorve 60% (348.000 há),
restando para o rural, 40% (234.200 ha), com tendência galopante a se reduzir
ainda mais a área rural.
Essa inversão do uso do solo desencadeou um processo
de desertificação do Cerrado, com eliminação de nascentes, desmatamento
indiscriminado, perturbação dos aquíferos subterrâneos por meio de poços
tubulares, impermeabilização de grandes áreas, causando assoreamento do Lago
Paranoá, de rios e córregos de imensa área adjacente do Distrito Federal.
Sob o aspecto ecológico e ambiental, o Projeto Olho
d’Água propõe-se, de forma continuada, a preservar essa área de 70 hectares de
Cerrado (700 mil metros2), denominada Sítio das Neves, mantendo suas
características originais de fauna e flora.
A preservação ecológica e ambiental tem, portanto,
caráter contínuo a fim de proteger a área de ocupações inadequadas e
prejudiciais à natureza, seguindo orientações técnicas e científicas sobre a
fenomenologia climática.
A preservação da área mencionada se estende por quatro
décadas, com práticas de contenção e detenção das águas pluviais, por meio de
barragens simples de pedra ou barragens-castor (galhos secos e terra de cupim),
de tamanho adequado à declividade do terreno e ao volume, peso e velocidade da
água. O desenvolvimento vegetal e a recuperação da biodiversidade são
resultados que podem ser comprovados.
As matas ciliares dos córregos perenes que nascem na
propriedade, Córrego Capão Azul, Córrego da Onça e as das nascentes
intermitentes se ampliaram geometricamente. As matas de galeria dos vários
cursos de água se ligaram umas às outras. As águas pluviais contidas e detidas
nas barragens, sombreadas pelas matas de galeria, permanecem durante todo o
período seco. A umidade mantida nessas áreas modifica lentamente o ambiente e
fortalece as nascentes perenes e estimula as intermitentes.
Conseguiu-se, ao longo de três décadas, aumento dos
índices de umidade com o armazenamento de água nos quatro aquíferos:
− aquífero radicular, volume de água contida nas
raízes das árvores, plantas e gramíneas, graças ao sombreamento da vegetação.
− aquífero vegetal, volume de água contida nos
troncos, galhos e folhas das árvores, em consequência da captação de umidade do
solo pelas raízes.
− aquífero superficial, volume de água que brota das
nascentes e forma córregos e rios, alimentado pelas barragens de contenção das
águas da chuva.
− aquífero subterrâneo, volume de água estocada entre
as camadas de rocha, preservado pela recarga das precipitações que se infiltram
no solo e percolam até os mares interiores, graças ao repouso das águas nos
lagos temporários resultantes das barragens.
A captação de água no Sítio das Neves atende a todas
as necessidades de consumo humanas, criação de pequenos animais e produção de
legumes e frutas.
O volume diário de captação e uso da água no Sítio das
Neves foi determinado por um ato administrativo de outorga da água pela ADASA.
Segundo cálculos técnicos, a vazão diária, no período de estiagem, da nascente
de captação é de, aproximadamente, 30 mil litros de água. O consumo autorizado
monta a 2.000 litros diários. A captação de água é feita por gravidade num
percurso de 750 metros.
Graças aos resultados obtidos até o momento, a ADASA
concedeu ao Sítio das Neves, em ato público, o PRÊMIO GUARDIÃO DA ÁGUA, no Dia
Mundial da Água, em 22 de março de 2010. Instituto Brasília Ambiental (Ibram), após
o georeferenciamento, por satélite, concedeu o registro do CAR (Cadastro Ambiental
Rural), da Reserva Legal e determinação de Áreas de Preservação Permanente
(APP).
Sob o aspecto educativo, por meio de parcerias com
ong’s ambientalistas, palestras em colégios e universidades, publicações na
mídia e visitas guiadas, propõe-se despertar nas crianças e pesquisadores o
apreço pela natureza e a possível reprodução do processo de preservação em
curso por outros proprietários de terra, agricultores ou não.
O projeto Olho d’água está aberto a pesquisadores de
universidades e institutos ou centros de pesquisa ambiental, alunos e
estudantes, funcionários e técnicos de secretarias de agricultura com funções
de extensão e educação rural.
O acesso à sede da propriedade é feito por estrada de
chão de 1.100 metros de extensão, a contar da porteira de entrada. A
conservação da via é feita manualmente.
As terras da propriedade são banhadas por três cursos permanentes
de água. Ao sul, pelo Ribeirão das Lajes, integrado à bacia do Rio Santo
Antônio do Descoberto, a Leste, pelo Córrego Capão Azul e, a Oeste, pelo
Córrego da Onça.
Os córregos que nascem nas terras do Sítio das Neves
têm uma extensão de aproximadamente 1.200 metros e desembocam no Ribeirão das
Lajes.
Até o presente momento, os custos da preservação
ambiental, incluindo a construção de barragens, de aceiros e proteção das
nascentes, do transporte de material, do combustível e placas de avisos são
sufragados pelo proprietário.
As principais despesas se referem à construção e
manutenção de barragens, classificação de plantas, aves e animais selvagens,
comunicação e combustível.
Atualizado 5.11.2020
___________________________________
Eugênio Giovenardi
RG: 139.828 SSP/DF
CPF: 090.928.381-87
Fone: 61 9981 2807
blog: www.eugeobservador.blogspot.com
Endereço:
SÍTIO DAS NEVES
– Rodovia BR 060, Km 26 – DF
Registros Institucionais:
Código do imóvel rural
(INCRA) - 9410180282315
Código da pessoa (INCRA) -
014353407
Certificado de Cadastro de
Imóvel Rural (CCIR) - 04132124057
Número do Imóvel na Receita
Federal (Nirf) - 3407896-7
Obras do autor sobre o tema ambiental:
1) Os pobres do campo, Tomo Editora, 2004, Porto Alegre.
2) O retorno das águas, Editora Ser, 2005, Brasília
3) A saga de um Sítio, LGE, 2007, Brasília:
4) Ecologia - Prosperidade sem destruição
5) Ecossociologia - Relações do ser humano com a natureza
6) Reencontro - o que aprendi da natureza
7) As árvores falam -
8) Uma obra em verde - Economia humana
segunda-feira, 2 de novembro de 2020
CHUVAS DE OUTUBRO – 2013-2020
CHUVAS DE OUTUBRO – 2013-2020
EM MILÍMETROS – 1 mm = 1 litro/m2
ANOS OUTUBRO TOTAL ANO
Milímetros
2013 179.5 2.255,6
2014 54.0 1.677,5
2015 79.9 1.642,7
2016 185.4 1.921,7
2017 44.1 1.478,7
2018 228.8 1.760,5
2019 41.2 1.068,7
2020 205.6 1.263.4 (até 31.10)
No
registro de precipitações destes oito anos, o mês de outubro de 2020 confirma
a irregularidade das chuvas. Dos oito anos, quatro oferecem menos de 100 mm,
sendo 2019 o outubro menos chuvoso.
O acumulado de 2020 se aproximará
da média anual de 1.500 mm, no Centro-Oeste, mas muito aquém dos anos de 2013 a
2016.
O
obscurantismo, a insensatez, a miopia, a insensibilidade diante de
biomas queimados, do empobrecimento da biodiversidade, da contaminação das
águas e do ar, estão entre as causas políticas e biológicas das pestes, vírus e
patógenos múltiplos que assolam os brasileiros.. As decisões econômicas devem
submeter-se ao sábio princípio da preservação dos ecossistemas.
PLUVIÔMETRO
Índices registrados pela estação
meteorológica digital instalada no Sítio das Neves, onde a mão humana é
conduzida pela sabedoria silenciosa das árvores.
sexta-feira, 16 de outubro de 2020
ANIVERSÁRIO DE HILKKA MÄKI GIOVENARDI
ANIVERSÁRIO DE HILKKA MÄKI GIOVENARDI
Lembro, hoje, algumas datas:
Maio/68, Paris, meu fatal encontro
com a jornalista e tradutora Hilkka Mäki (foto PB), natural da longínqua
Helsinque, Finlândia, país de Sibelius.
JULHO, 1969, nosso casamento em
Helsinque.
JULHO, 1970, nascimento de nossa filha Aino
Alexandra, que nos deu duas netas: LUIZA e LAURA.
JULHO, 1972, nossa mudança para Brasília.
JULHO, 2019 (foto), celebração de cinquenta anos de união estável, Bodas de Ouro.
Agradeço a Hilkka, em nome da literatura brasileira,
a tradução de autores brasileiros, para a língua finlandesa, entre eles Machado
de Assis, Jorge Amado e Érico Veríssimo. Especial gratidão também pela tradução
de meu primeiro romance O HOMEM PROIBIDO.
Nossa conivência e cumplicidade mútuas nos ajudaram
a “fazer caminho ao andar”.
Meu abraço,
Eugênio Giovenardi
terça-feira, 13 de outubro de 2020
FÓSFORO E CEB -INCÊNDIOS
FÓSFORO E CEB
O
mito do fogo espontâneo foi desmentido pela quinta vez, no Sítio das Neves (DF),
em regeneração ecossistêmica desde 1974.
O
planeta, em milhões de anos de formação e esfriamento, com erupções
superficiais e profundas, ardia de noite e de dia. Quando aparecemos no planeta
congelado, tivemos que reinventar o fogo. No Brasil, incêndios espontâneos, se
ainda possam acontecer, serão raríssimos e devem ser comprovados. Mas a informação
falsa corre de boca em boca, entre sábios e ignorantes, e até ministros de
estado.
No
incêndio que ocorreu no dia 10.10.2020, e destruiu 13 hectares (dos 70 ha)
durante oito horas, em área de nascentes do Sítio das Neves, teve uma causa
comprovada: a mão do homo sapiens, que
ainda não domina a tecnologia para enfrentar as leis físicas. Não dispõe de
material adequado para conviver com outras energias, como o poder e a resistência
do raio. Nas redes da CEB, os fios de alta tensão são presos no alto do poste
por um isolador de louça e amarrados com fio de alumínio. A energia do raio,
correndo pela rede em direção ao para-raios, encontrou um ponto fraco e detonou
o arame de alumínio (foto). O arame encandecido caiu no pé do poste sobre capim
seco e incendiou a área no meio do cerrado.
Desde
1976, quando foi estendida a rede na área, a Companhia Energética de Brasília (CEB)
não faz revisão da rede que alimenta a região.
As
cinco queimadas que atrasaram a regeneração deste protegido pedaço de Cerrado
tiveram duas causas: fósforos de incendiários ignorantes e desatenção técnica dos
administradores da CEB.
Leio,
hoje (13.10.2020) nos jornais, a decisão
dos atuais administradores de vender a Companhia, construída com dinheiro público
e sustentada por milhões de usuários e funcionários dedicados. Em vez de
privatizar um bem público essencial, por que os atuais ocupantes da direção da CEB
não pedem, corajosamente, demissão de seus cargos?
13.10.2020
sexta-feira, 9 de outubro de 2020
CARTAS DE PRISÃO - BOM SENSO
BOM SENSO
quarta-feira, 30 de setembro de 2020
CHUVAS DE SETEMBRO – 2013 a 2020
EM
MILÍMETROS – 1 mm = 1 litro/m2
ANOS SETEMBRO TOTAL ANO
Milímetros
2013 40.5 2.255,6
2014 7.0 1.677,5
2015 39.3 1.642,7
2016 16.2 1.921,7
2017 10.5 1.478,7
2018 37.5 1.760,5
2019 20.3 1.068,7
2020 14.7 1.057,8(até 30.9)
O registro de precipitações de oito
anos, o mês de setembro se apresenta como antessala irregular dos meses
chuvosos.
A partir de 2017 é evidente que os
volumes de chuva decrescem.
O acumulado de 2020 será maior do
que o de 2019, em razão das boas precipitações de fevereiro, março e abril, mas
muito aquém dos anos de 2013 a 2016.
O obscurantismo, a insensatez, a miopia, a
insensibilidade diante de biomas queimados, do empobrecimento da biodiversidade,
da contaminação das águas e do ar, estão entre as causas políticas da pobreza
de mais de 70 milhões de brasileiros. O milagre econômico está em preservar os
ecossistemas.
PLUVIÔMETRO
Índices registrados pela estação
meteorológica digital instalada no Sítio das Neves, onde a mão humana é
conduzida pela sabedoria silenciosa das árvores..
domingo, 27 de setembro de 2020
Cartas da prisão - PUDIM
PUDIM
Amigos,
Chateado de
andar com mascara até para levar o lixo no contêiner, tive um desejo infantil:
comer pudim Lembrei-me do pudim de dona
Inez, minha mãe. De avental branco, cestinho na mão, ia ao galinheiro buscar
ovos frescos. Abria o armário para pegar o leite condensado. O leite fervido da
Estrela estava na leiteira. Batia tudo numa tigelona de vidro. Fechava a porta do
forno do fogão a lenha e dizia: “pronto! Agora, é só esperar!” O pudim de dona
Inez era famoso em toda a redondeza.
Nossa diarista
Val, depois de meses, retornou ao trabalho semanal em nosso apartamento.
Dei-lhe bom-dia, ao abrir a porta, e lhe disse: antes de ligar o aspirador, vou
querer que a senhora faça um pudim. Nem terminei o pedido e Val, com tremenda
autoestima, fez sua autopromoção. “Também na casa de Ligia Moreno (famosa
pianista brasiliense, nascida na Ceilândia),
só comem do meu pudim”. A cozinha, em poucos minutos, cheirava a pudim,
com aroma de baunilha. O pudim da Val é muito bom! Por que não pedi dois?
O terceiro
pudimeiro de minhas lembranças, quem diria, é um arquiteto cearense, Fred
Holanda, com receita não revelada. Segundo me informei com o sempre presente
Coutinho, também arquiteto, o período de gestação desse incomparável pudim é de
oito dias. Durante a maturação do excepcional pudim, o pudimeiro cearense
executa ao piano peças de Villa-Lobos. É um pudim de alta musicalidade e,
principalmente, super-super suculento.
Pudim, um
presente da pandemia!
27.9.2020
quarta-feira, 23 de setembro de 2020
ICARTAS DA PRISÃO - IGNORÂNCIA
IGNORÂNCIA
Amigos,
A pandemia revelou
minha generalizada ignorância sobre os mais variados temas. É verdade que, em
matéria de coronavírus, literalmente todos: médicos, políticos, filósofos,
teólogos ignoravam o bichinho da gripezinha. Ninguém sabia o que era, de onde
veio, se do morcego, da girafa ou do pandolino (tatu) e aonde ia. Mortes, covas
em série, enterros apressados, choros à distância foram realidades tão
incômodas que os do andar de cima preferiram ignorá-las e negá-las.
A novíssima linguagem
dos aplicativos digitais é a mais moderna tortura mental. Internará a espécie humana no manicômio planetário. Levei
três dias de pesadelo para achar os números necessários, nos sites do Ibraim e
do Ibama, para validação de informações que ofereci à Receita Federal referentes
ao pagamento de dez reais do Imposto Territorial Rural anual.
Confesso envergonhado
que não sabia que o planeta Terra é plano. Mesmo com a autoridade científica
dos planistas, mantenho minha tênue e já ultrapassada convicção de um planeta redondo
ou quase.
Vivo num país que
abriga as mais variadas nuances religiosas, de extração cristã, anunciando
milagres pelas TV’s e rádios. Confesso que ignoro a existência de adeptos da Cristofobia, religião denunciada pelo Presidente
da República do Brasil, na 75a Assembleia da ONU, 2020. Quantos
cristófobos existem neste país demonofóbico?
Inesperadamente, recebi
uma ligação intersideral de Millôr Fernandes que habita, há alguns anos, uma
avenida virtual na belíssima e fosfina Vênus. Seguindo as indicações do filósofo
humorista, fui à estante de meus livros. Ler é indicado aos ignorantes. Em
geral, os sábios chegam a tal estágio por aceitarem humildemente sua
ignorância. Todo livro é a confissão humilde do escritor ao relatar a
experiência de sua trágica ignorância.
Foi essa lucidez que
inspirou Millôr a me revelar suas descobertas metafísicas no livro Lições de um ignorante (Ed. Paz e Terra,
1977). São apenas 43 lições. Fáceis de assimilar. Uma por dia. Ao final de gostosas
gargalhadas, já me sentia um erudito, quase sábio.
Posso, agora,
compreender a linguagem cifrada da alta cúpula do governo, dos presidentes da Câmara
dos Deputados e do Senado e, especialmente, a dos ministros do STF. Num país
cronicamente ameaçado pelo comunismo, “os homens públicos falam sem nenhuma
propriedade”, disse-me o mestre. Percebo também com mais clareza a acusação de
pedófilo feita ao lobo-mau que devorou Chapeuzinho Vermelho. Meninas não devem
andar sozinhas pelas florestas urbanas.
Indico algumas das Lições de um ignorante que me ajudaram a
compreender o novo Brasil, Pátria Amada.
- Num acesso de
ignorância eu acreditava “nas crônicas
oficiais que mostram um país com uma sociedade absolutamente sem classe”. (Brasil,
Pais Comunista)
-
Colecionei algumas frases ditas pelo presidente da república: E daí? Quem manda
é a caneta Bic... É uma gripezinha... Não sou coveiro. Ficar em casa é para
fracos. Brasil é um exemplo de cuidados ambientais. Estamos vencendo a
pandemia. (Frases que ficam e que vão)
-
Aprendi que a regra do indiciado é negar os fatos até a última instância do trânsito
em julgado. (A máquina da justiça e suas
peças principais)
-“O
Brasil é maior do que os menores e menor do que os maiores. É o País do Futuro.(O
Brasil)
- Na última lição (Resumo – 1963), olhando as árvores pela
janela de minha prisão, no silêncio
metafísico de meu isolamento, cumprindo a sentença do juiz invisível, li o derradeiro
conselho sábio de Millôr Fernandes aos ignorantes:
“Estejam certos porém de que a Justiça será igual para todos”.
21.9.2020
sexta-feira, 11 de setembro de 2020
QUEIMADAS, INCÊNDIOS,
QUEIMADAS, INCÊNDIOS,
O Grupamento Especializado em Proteção Ambiental
(Gepram), entre maio e setembro de 2020, registrou, no DF,
4.858 queimadas de diferentes proporções. Uma delas foi de 602 hectares. O
risco de incêndios, nesse período, é amplamente divulgado. Alertas são dados
por todos os meios de comunicação a uma população que parece surda e insensível.
Os incêndios anuais se dão quase sempre nos mesmos locais, com mais frequência à
beira das vias.
Um dos efeitos maléficos das queimadas é o desnudamento das áreas, antes
das chuvas. Os incêndios retardam a regeneração vegetal, dificultam a captação das
águas pluviais e favorecem a lavagem do solo ao levar areia e sedimentos aos córregos
e rios. Empobrecem o solo e assoreiam os rios. Tornam mais lenta a regeneração vegetal
e arrasam milhões de vidas que formam a diversidade quase invisível de insetos que
constituem o alimento de outras vidas.
É de se notar, com preocupação, que, nos últimos 30 anos, a região do Centro
Oeste registrou 30 dias a menos de chuvas anuais. A redução de dias chuvosos, registrada
pelo Inmet, passou de 137 dias de chuva, nos anos 1970, para 113 dias em 2019. A
relação desmatamento-queimadas-escassez de chuva deveria sugerir medidas públicas
não só de planejamento ambiental, como de comportamento ecológico da população.
Essas condições ambientais, poluição do ar e das águas, associadas á
baixa umidade e ao calor, reduzem as energias vitais e favorecem um sem número
de enfermidades. Entopem-se os hospitais e enchem-se as farmácias que se
multiplicam em Brasília.
É um ingrediente a mais em tempo de pandemia.
quinta-feira, 27 de agosto de 2020
CARTAS DA PRISÃO - DONA ANA
DONA ANA
Antigamente, a casa da vizinha era a extensão da
dispensa das outras donas de casa. Uma xícara de arroz, uma colher de banha, pó
de café quebravam o galho. Dona Ana é nossa vizinha há cinco anos. Pela idade,
chamada de risco, curte sozinha o isolamento determinado pela pandemia do vírus
19. Meses antes, seus netos a visitavam com moderada frequência. Outras pessoas
da família têm visitado Dona Ana. Sei pelos sapatos que deixam fora da porta.
Por discrição, nunca perguntei se são filhos, noras ou genros. Encontro-me
esporadicamente com ela. Ela sorri.
Na véspera da Páscoa de 2020, Dona Ana tocou à nossa
porta. Minha mulher e eu fomos atender. Trazia em mãos um trabalho em tricô
colorido. Perguntou se tínhamos liquidificador.
- Sim, Dona Ana. Precisa dele?
- Eu fiz um chapéu para cobrir o liquidificador. Se
é um Walita, vai servir.
- Quanto é?
- É um presente de Natal.
Ela sorriu ao saber que era Walita. Aceitamos o
presente. Em troca dei-lhe um livro e dois pés de alface colhidos em nossa
horta. Dona Ana não disse mais palavras. Sorriu e voltou a seu apartamento ao lado.
Ela é de poucas palavras e muito sorriso. Dona Ana é dos tempos que, em
criança, se aprendia a tricotar com a vovó. Nunca imaginei pôr chapéu em
liquidificador.
Dias passados, em plena pandemia, sem máscara, Dona
Ana bateu novamente à nossa porta. Tinha em mãos um tricotado amplo e colorido.
Uma espécie de saia rodada. Sorrindo, perguntou se tínhamos bojão de gás.
A pandemia fez Dona Ana voltar aos tempos de menina.
Tricotar é preciso.
26.8.2020
domingo, 23 de agosto de 2020
CARTAS DA PRISÃO - ISOLAMENTO – DISTANCIAMENTO
ISOLAMENTO – DISTANCIAMENTO
São palavras básicas do paradigma de convivência do novo normal. O dicionário do novo normal se restringiu a essas duas palavras. Despidas do floreio poético que lamenta a perda de um amor ou da pátria distante, elas propõem a fuga incessante de um vírus invisível que, para sobreviver, requer aproximação e ajuntamento. O isolamento é a vacina disponível. Estamos condenados ao isolamento por termos cometido atos antissociais contra a natureza. Isolamento, afastamento, apartamento, distanciamento. Longe, retirados, separados, excluídos, segregados, desagregados, ilhados, descasados, desterrados. Mascarados. Isolar-se de quem? Do quê? Por quê? O que os outros têm que eu possa receber de ruim ou de bom? A espécie humana é gregária. Adora ajuntamento. Carnaval. Futebol. Bar. Aniversários. Festas. Agora, não pode mais. A ordem é: isola o vírus! Há mais de 20 mil anos, o homem sapiente vem domesticando seres vivos: arroz, feijão, soja, boi, cão, cavalo, gato, cobra, periquito. Desorganizou a vida nas florestas e no mar. Agora, tem que fugir do vírus que se rebelou contra a desordem. Fugir do vírus. Fugir dos outros que fogem do vírus. Não basta isolar-se. Há que manter distância. A vizinhança sempre foi um fator de ajuda, de apoio, de companhia, de união. Agora, o novo normal é ficar longe. É arredar pé! É certo que a vizinhança, os ajuntamentos ocasionam fofocas. Mas a fofoca é o combustível da convivência. Afasta uns e une outros. O novo normal está marcado por mortes, sem o carinho dos amigos. O sepultamento sem a lágrima refrescante dos familiares. Uma separação, um isolamento definitivo e sem volta. O novo normal nos esconde a boca sensual, o belo nariz, o sorriso do rosto, o brilho dos olhos.
O novo normal. Cada um, por si. O vírus, por todos.
Nada melhor do que isolar-se em campo aberto. (Foto: E. G. Sítio das Neves)
23.8.2020
terça-feira, 18 de agosto de 2020
GLORIA E QUEDA DO HOMO SAPIENS
MENSAGEM AOS SOBREVIVENTES
Eugênio
Giovenardi
Escritor e
Ecossociólogo
2020
Há quatro décadas, observo as relações de convivência
e de interdependência da espécie humana com milhares de outras espécies da
biodiversidade, especialmente no Cerrado brasileiro.
Todos os caminhantes deixam pegadas de seus passos.
Por caminhos abertos passam os que vêm depois. Nestas respostas, deixo minhas
pegadas. Tenho certeza de que as medidas nem sempre servem a todos os pés. Vivo
numa nova capital e na antessala de um novo mundo. Lanço um novo olhar sobre o
planeta e especificamente sobre a natureza.
Estamos numa encruzilhada. Andamos muito. Cometemos
afoitezas. Corremos, quando devíamos andar devagar. Atropelamos a natureza.
Empobrecemos o planeta. A resposta ecológica do planeta está clara. A covid/19
é um alerta global
A água, os esgotos, o lixo matam vidas e, nessa onda,
vamos nós, a insigne espécie sapiente. Há que ouvir a natureza. Ouvir as
árvores e seus gritos silenciosos. Comover-se com os clamores dos pássaros e
sentir-se culpados pelas mortes de animais nas rodovias.
Como sairmos desse labirinto ou desta prisão que
construímos sem prever uma porta de saída? Temos riqueza contrabalançada com
extrema pobreza. Não sabemos o que e como fazer com elas.
Nesta comunicação, em forma de entrevista, colecionei vinte
perguntas que me fiz e que outros mais jovens me fazem diante das certezas,
incertezas e alertas de nosso tempo às voltas com um vírus invisível.
-– Há milhares de anos, os hominídeos
vêm enfrentando mudanças climáticas. Nossos antepassados próximos, os
Neandertais, abriram caminho para o Homo Sapiens. Eles se extinguiram. Nosso
destino poderá ser o mesmo?
O degelo no Hemisfério Norte, os desertos do
Hemisfério Sul tenham talvez provocado o encontro entre Neandertais e Homo Sapiens, ao longo de séculos.
Mudança de rumos na história da espécie humana. O homo sapiens se adaptou ao frio, ao calor, aos vales e às
montanhas. Arriscou-se à travessia de rios e mares, por terra, mar e ar.
Mudamos permanentemente, mesmo sem perceber que mudamos. O tempo é testemunho das
mudanças, das adaptações, de êxitos e fracassos. Da GLÓRIA E QUEDA DO HOMO
SAPIENS. Nossa época e nossa cultura são o resultado de contínuas mudanças.
Saímos da coleta de folhas e frutos, da caça individual ou cooperativa, há 15
ou 20 mil anos. Domesticamos cereais, e animais. Construímos cidades, palácios,
impérios, templos, universidades, bibliotecas, teatros, arenas para os mais
variados esportes.
Parece que a tão almejada felicidade ou o paraíso
prometido ficaram para trás ou se mantêm escondidos das elucubrações do cérebro
humano.
Há fenômenos naturais ou a natureza das coisas que
atropelam a rotina ou os planos da espécie humana. Somos o único mamífero cujo
cérebro é capaz de perceber, compreender e acompanhar o funcionamento das leis
físicas.
Temos, hoje, séries históricas de fenômenos
climáticos. Produzimos sensores de grande alcance. Operamos cálculos
matemáticos e estatísticos que permitem antever alguns eventos. Os animais
também pressentem mudanças ou eventos perigosos e buscam abrigo. Uma coisa é
prever a ameaça de fenômenos físicos, outra, muito diferente é prever nosso
comportamento diante deles. Alguns, como inundações, são favorecidos pela
urbanização em espaços inadequados, pelo desmatamento, pelo desvio de cursos de
água, ou pelo esgotamento de lagos.
O planeta é sacudido desde sempre por fenômenos
físicos e mudanças climáticas. A esses fenômenos naturais se associa a ação
humana em seu afã de extrair do planeta mais do que ele pode dar. Arrasa
montanhas, desvia cursos de rios, esgota aquíferos superficiais e profundos,
destrói florestas, polui águas, o solo e o ar com a queima de combustível
fóssil, petróleo e gás.
As mudanças climáticas, aquecimento local e global,
cataclismos imprevisíveis, secas, inundações, tormentas, vendavais arrasadores,
tornaram-se o pão de cada dia em todos os países e com frequência perturbadora.
Perdemos vidas e o produto do trabalho, da técnica e da arte empregados.
O que sabemos sobre a natureza? Sobre seus segredos?
Sobre os riscos da rota do planeta no Sistema Solar? Sobre seu potencial
positivo ou negativo para a manutenção da vida? Sobre terremotos ou maremotos?
E, agora, sobre vírus? Ou bactérias? Se soubéssemos antecipadamente, pela via
da ciência preventiva como parte da biodiversidade, não teríamos 100 mil mortes
causadas por um vírus, no Brasil, até agora.
A ciência preventiva está ainda em cueiros. Os
complicados caminhos no labirinto da biodiversidade e da interdependência de
todos os microssistemas de vidas não foram devassados. Estultos os que acham
que se pode criar um vírus. Pode-se
criar o ambiente favorável para que vírus e bactérias apareçam sem avisar. O
vírus também defende a própria vida e busca seu espaço. O vírus tanto pode
viajar de avião quanto na patinha de um canário. Com toda a tecnologia
acumulada em 20 mil anos, ainda estamos na antessala do desbravamento da
natureza que nos sustenta. Nossa corrida, no estágio atual, é apelar
desesperadamente para a ciência curativa, no afã de vencer a força das
calamidades, de guerrear vírus invisíveis, nos livrar de suas ameaças, de fugir
delas ou de conviver com elas.
O vírus é um ser vivo, animado. E todos os seres
animados assumem sua cota de predador para sobreviver. Os humanos também são predadores
e lutam para se reproduzir. Atacam outros seres vivos e se defendem na luta
pela vida. É a natureza das coisas. O vírus é um alerta da natureza.
O fracasso do capitalismo, do crescimento econômico,
do consumismo, das inversões no supérfluo para oferecer felicidade à espécie
humana é um alerta para o homo sapiens.
Se quiser sobreviver tranquilo no conjunto de vidas da biodiversidade terá que rever
a maneira de se relacionar com a natureza.
Há que ter humildade para reconhecer o fracasso, as causas do fracasso,
os efeitos do fracasso sobre os elementos vitais da sobrevivência, como água e
florestas, poluição do ar e das águas. Mas também reconhecer o fracasso nas
relações humanas, na distribuição de oportunidades, na repartição dos bens
comuns da natureza para saciar a fome de milhões, no tratamento solidário e
respeitoso a culturas milenares.
Os quarenta milhões de trabalhadores brasileiros que o
crescimento econômico excluiu do bem-estar não terão mais lugar nas empresas
que os demitiram.
Não serão, com certeza, os donos do poder que, hoje, ditam
normas autoritárias e corporativas de convivência desigual, os que se apressarão
a mudar de rumo. São os que enfrentarão a vida nos próximos cinquenta anos.
Eles já estão gritando e exigindo o início de uma nova era. A era deles. Preparada por eles. Nossa herança cultural é
indefensável. Em todas as partes do planeta há demonstrações de que os jovens não
querem propriedades industriais globalizadas nem contas bancárias sujas de
sangue e de exploração das pessoas e da natureza.
As condições de vida que as novas gerações irão
encontrar dependem do que se faz hoje. O que se deseja encontrar no futuro não
acontecerá no futuro. O futuro começa a acontecer no presente. É o presente,
com as lições do passado, o tempo de pensar, decidir e fazer.
Parece-me que três atitudes devem ser adotadas no
presente:
a)
Conhecer e
respeitar a força do funcionamento das leis da natureza e não atentar contra
ela.
b)
Compreender a
interdependência de todos os seres vivos para alcançar conhecimentos
científicos preventivos que possam enfrentar fenômenos naturais repentinos.
c)
Preparar
estruturas diversificadas para contornar os efeitos de fenômenos naturais
físicos (terremotos, tormentas) ou de conflitos nas relações de
interdependência dos organismos vivos (bactérias, vírus).
Mas, parece claro que as mudanças provocadas por nós e
as que a natureza nos impõe serão enfrentadas de outra maneira pelas novas
gerações.
O que muda no ambiente exterior que circunda a espécie
humana a obriga a se adaptar às mudanças para não ser extinta por elas. A
realidade é a sirene do alarme. A natureza não é virtual. É real. Tentamos fugir
da realidade. Queremos transformar a realidade das coisas em realidades
virtuais com as quais podemos lidar, mexer, trocar. Eis a ilusão que nos faz
desviar do caminho.
Mudanças acontecem, no universo há bilhões de anos.
Nosso planeta passou do fogo à água. Vulcões e terremotos frequentes atestam as
mudanças climáticas de um remotíssimo passado.
Desde que a vida surgiu das águas, os seres vivos, ao
se diversificarem, foram se adaptando ao meio, à alimentação necessária para a
reprodução e sobrevivência. Mas a interdependência dos seres vivos é uma lei
natural. Nossos antepassados nos deixaram esta herança: sobreviver às mudanças.
Mudanças de clima, mudanças geológicas, nascimento e extinção de espécies,
obedecendo ao processo de regeneração lenta, mas contínua, no conjunto da
natureza.
A energia das mudanças atinge a espécie humana pelo
inestimável fato de ela possuir um cérebro capaz de perceber, compreender e
acompanhar os fenômenos físicos, e o impacto das atividades do homo sapiens sobre eles.
Atingimos um ponto elevado na história da convivência
humana, da ciência, da organização social, da exploração econômica dos bens do
planeta. Esse ponto da escalada vertical parece indicar que as mudanças a serem
enfrentadas, podem catapultar o homo
sapiens para um patamar mais equilibrado e calmo, mas não sem sofrimento e
pesadas perdas.
Os jovens, neste segundo tempo, atual e moderno,
constroem um novo cenário de relações com um vocabulário tirado de um
dicionário que a velha guarda tem dificuldades de interpretar.
A nova história da espécie humana não borra o passado.
O passado será um museu histórico no qual se evidenciam as eras culturais da
turbulenta convivência humana ao longo de milhares de anos.
Como a energia das mudanças, em nossa época, afetará a
velha guarda do homo sapiens e a nova
geração cibernética é a questão a ser respondida pelas duas partes ao mesmo
tempo. Os conflitos durante esse lento e longo período de mudanças aparecerão e
serão solucionados com as ferramentas de cada etapa.
No período de mudanças, ou no tempo em que elas se
anunciam como fenômeno sociocultural irreprimível, de pouco adianta querer
indicar rumos ou situações possíveis ou previsíveis. Há que ater-se à realidade
dos fatos que as mudanças impõem no presente. O passado é indestrutível. O
futuro se constrói no presente. O futuro são nossos netos e bisnetos quando
completarem 50 ou 80 anos. O trabalho cerebral dos dois grupos, simultaneamente
tocados, terá que se dobrar à realidade, sem deixar-se conduzir pela fantasia.
O planeta, a natureza é real. Não virtual.
Num terremoto há mortos que serão enterrados. Há
prédios destruídos que serão reerguidos com diferentes técnicas e engenharia.
Num terremoto cultural, de abrangência universal, haverá perdas estruturais que
sustentavam concepções afetadas pela obsolescência. Em compensação, longos e
fatigantes esforços de regeneração das energias levarão as novas gerações para
outras plataformas com novos paradigmas de convivência.
As mudanças levam tempo. A reação contra a segregação
racial se arrasta por mais de cem anos. A diferença no tratamento ou a
discriminação de gênero avança a passos lentos. Quanto mais cresce a população
mundial e quanto mais se criam grupos racialmente independentes, economicamente
desiguais, regidas por leis discriminatórias, mais difícil será consolidar um
novo paradigma para a mudança. Por isso, a globalização dos comportamentos
estereotipados está ruindo.
O caminho em direção à mudança de paradigma da
convivência humana é imposto pelo fracasso da exploração econômica que condena
2 bilhões de pessoas à pobreza, à miséria, à desilusão da vida. Pelo fracasso
político das nações em guerras localizadas. Pelo fracasso ecológico revelado na
destruição de ecossistemas favoráveis à vida. Pelo ataque sistemático à
interdependência dos seres vivos.
O Brasil, hoje, parece estar na rabeira das mudanças
estruturais para um novo caminho, pois algumas lideranças insistem em
retrocessos éticos, morais, culturais e ambientais. A nossa geração arrisca de
deixar aos descendentes uma dívida impagável.
Na década de 1970, demógrafos avaliavam a capacidade
de suporte do planeta diante do risco da bomba populacional (The population bomb, Paul Eherlich,
1968). No começo dessa década, a população humana (3 bilhões) teria atingido o
número adequado (ideal) para manter o equilíbrio das riquezas limitadas que o
planeta dispõe para benefício equitativo da espécie humana. Ao mesmo tempo, estaria
preservado o equilíbrio reprodutivo da biodiversidade e facilitaria a regeneração
das espécies vivas.
A superlotação do planeta, estimulada por fatores
econômicos, culturais ou religiosos, é um tema a ser tratado com seriedade,
franqueza e urgência. A superlotação de um espaço inibe a cooperação entre as
pessoas e a natureza, acirra a competição para o uso dos elementos essenciais à
vida e dificulta a solução de conflitos sociais e ambientais. A racionalidade é
uma das virtudes do homo sapiens que
lhe permite ordenar o equilíbrio entre as limitações das riquezas naturais do
planeta e a intensidade do uso dos bens essenciais: água, alimentos e energia
físico-eletrônica. O controle do crescimento da população, em todas as regiões
do planeta, é uma decisão racional e urgente, cujos efeitos abrangem a
biodiversidade em todos os ecossistemas.
Somos, hoje, 7,8 bilhões de humanos a consumir as
riquezas do planeta, a começar pela água. Em duas décadas, haverá cerca de 11
bilhões.
“Essa progressão, no entanto, vai terminar, afirma o
sociólogo Jeremy Rifkin (Denver Unv.). As razões para isso têm a
ver com o papel das mulheres e sua relação com a energia. Na antiguidade, as
mulheres eram escravas, eram provedoras de energia, tinham que manter o
abastecimento de água e alimentar o fogo para cozinhar.”
As mulheres acumularam sabedoria e prudência para dar
continuidade à vida, estimular e introduzir mudanças nas relações sociais e
econômicas adequadas às limitações da casa comum que habitamos. Cabe a elas
decidir.
A dita classe política, as empresas preocupadas com o
crescimento econômico não perceberam nem ouviram o grito dos que enfrentarão o
novo milênio. Os milenares, os jovens deste milênio já estão nascendo e
deixando para trás seus antecessores.
Que sentido terá e que lugar ocupará o PIB numa era
cibernética na qual os valores culturais, sociais, ambientais e econômicos
serão reordenados e sustentados por novos códigos éticos? Como e até quando se
sustentará a economia baseada em combustíveis fósseis, em consumo irracional de
supérfluos, em urbanização massiva do planeta, em redução constrangedora da
vegetação milenar e em esgotamento de mananciais aquíferos?
Vozes jovens, como a de Greta Thunberg e da brasileira
Valentina Ruas, lideram outros milhões da geração deste milênio e reclamam por
um novo cenário em que viverão nos próximos cinquenta anos. A geração que
dominou no século 20 será substituída, mesmo a contragosto, pelos novos chegados
a este milênio. Os 3 bilhões de pirralhos conscientes de hoje terão pela frente
um novo mundo com outras decisões.
No ritmo das mudanças climáticas, cientistas
consideram evidente o impacto da ação da espécie humana sobre o agravamento dos
efeitos negativos, especialmente sobre a poluição do ar e das águas. Durante a
pandemia provocada pelo novo Coronavírus, as medidas de restrição à circulação
de pessoas, fechamento de fronteiras, interrupção de transporte por vias
aéreas, marítimas e terrestres, constatou-se sensível melhora na qualidade do
ar. No entanto, o volume de lixo não coletado para reciclagem continua comprometendo
os ecossistemas. Os esgotos não tratados afetam a qualidade das águas
superficiais e profundas e são uma reserva viva de bactérias e vírus.
A ação da espécie humana agride, ao mesmo tempo, o
ventre, a pele e os pulmões do planeta: águas, solo e vegetação. Destruímos grande
parte do passado do planeta. Imensas jazidas de material fóssil já não existem.
Viraram combustível de máquinas poderosas e espalham CO2 na
atmosfera. O planeta levará milhões de anos para se regenerar. Por isso, não
são apenas ameaças de extinção de espécies e do próprio homem sapiente. É uma lei da natureza. Por isso, o crescimento
zero de nossa ação econômica destruidora é uma imposição da natureza.
Antes de 1800, ninguém falava em aposentadoria. Eram
tempos de trabalho escravo e defendido por normas sociais e apelos filosóficos.
Humanizou-se, depois, legalmente o trabalho. Essas leis, chamadas trabalhistas,
já não se sustentam. Criar-se-á um novo paradigma a sustentar a criatividade
humana, as iniciativas econômicas restritas à limitação do planeta.
Não houve um planejamento explicito para chegar à
Revolução Industrial, nem à Revolução Tecnológica, nem à Revolução Cibernética
Digital. A espécie humana foi levada pelos fatos, pelas necessidades de cada
época. Hoje, os fatos são outros, as necessidades são outras. As soluções serão
outras. A revolução será outra. A Quarta Revolução não é para derrubar
governos. A Revolução do século 21 é proteger e plantar árvores para
devolver ao planeta o que extorquimos dele.
A realidade indica que nossos métodos econômicos não
conseguem resolver os problemas crônicos e cada dia mais presentes. É bom, e com
urgência, lançar os fundamentos para que as futuras gerações encontrem novas
soluções às dificuldades do relacionamento da espécie humana consigo e com
todas as espécies da biodiversidade, que a natureza insiste em defender.
Os fenômenos da natureza não costumam se anunciar com
antecipação, nem o lugar onde irão aparecer, nem escolhem ou discriminam
possíveis vítimas ou expectadores.
A natureza é fatalista e, por isso, temos que estar
preparados para eventuais cataclismos, infestações de vírus e bactérias. Há
evidências de que a complexa atividade humana tem gerado pandemias porque
alterou o ciclo da água e do ecossistema que mantém o equilíbrio ecológico do
planeta. As mudanças climáticas, desde milhares de anos, provocam movimentos de
populações humanas e de outras espécies. Atualmente, quase oito bilhões de
humanos estreitaram, com outras vidas animais, suas relações de convivência e
subsistência. Em consequência as mudanças climáticas atingem a saúde de todos
os seres vivos. Vírus e bactérias viajam juntos no mesmo avião.
– Temos parte no empobrecimento do planeta. Qual é nossa parte na reconstrução e na regeneração dos ecossistemas?
Nos últimos 200 anos foi
intensa a exploração da Terra. O solo se havia mantido quase intato até
estriparmos o ventre do planeta para lhe roubar o gás, o carvão, o petróleo,
além do ouro, da prata e do diamante.
Depende da espécie humana construir, no presente,
infraestruturas que a levem a olhar a natureza e o planeta de maneira distinta.
E isto é possível. As novas gerações revelam a necessidade de nova visão, uma
visão distinta do futuro. Infelizmente, os líderes dos principais países não demonstram
essa visão. A manutenção dos investimentos e da riqueza acumulada continua na
mesa das decisões. São as novas gerações a pôr, sobre a mesa, novas formas de
atuar. Elizabeth Kolbert alertou a
humanidade sobre a sexta extinção silenciosa de espécies animais e vegetais,
sequer percebida pela maioria distraída. A principal autora é a espécie humana.
Milhares de espécies de animais se extinguem pela perda do habitat, das fontes
de alimentação e de água. A cegueira e o sonambulismo anestesiam os
consumidores, cada dia mais vorazes para ter mais e mais. Frente a essa anunciada
catástrofe que atingirá a natureza, é animador ouvir milhares e milhares de
jovens a bradar a declaração universal de uma emergência climática e pedem um
novo olhar verde sobre o planeta. Sim, há esperança!
28.6.2020