sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

2021 – O ANO DO NARIZ

 2021 – O ANO DO NARIZ

Aos que buscam o conhecimento contínuo, o ano 2020 indicou que 2021 será o ano do NARIZ. Em outras palavras, não ponha o nariz onde não lhe compete. O nariz é xereta e fofoqueiro, Chega sempre antes do corpo. Ele capta tudo o que está no ar. O ridículo disso é que contaminamos o ar que respiramos de mil e uma maneiras. O nariz traz para dentro do corpo tudo o que jogamos no ar.
A todos os amigos e a todas as amigas, neste fim de ano trágico e durante o imprevisível novo que se anuncia, desejo que cuidem do próprio nariz e sejam sensatamente felizes.
(Extrato do artigo: 2021 - O ANO DO NARIZ - Homenagem a Cyrano de Bergerac - 1619-1655)
24.12.2020
Busquem a companhia e a sombra das árvores.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

POR QUEM DOBRAM OS SINOS

 AMIGOS,

POR QUEM DOBRAM OS SINOS

POR QUEM CHORAM OS VIVOS

 

Até hoje, 184.000 mortos, ao longo e largo do país, foram recrutados pelo vírus covid/19. Quase dois milhões choram por quem dobram os sinos: pais, mães, viúvos e viúvas, avós e avôs, irmãos e irmãs, tios e tias, sobrinhos e sobrinhas, amigos e amigas, sem despedida.

Se nesse jogo aleatório do V/19 fossem sorteados 90 deputados e 60 senadores, quem choraria por eles?

Se a escolha da roleta do V/19 levasse 300 ministros, juízes, desembargadores dos tribunais de justiça, quem choraria por eles?

Se o covid/19 abatesse toda a cúpula do exército, a elite dos funcionários do Estado, quem choraria por eles?

Se metade da família presidencial fosse dizimada pelo vírus/19, quem choraria por ela?

A pátria desolada, todos os sinos dobrariam e o povo compassivo choraria por eles.

Quem e quantos ainda precisam ser sacrificados para que se acenda a luz do bom senso, da sensatez, do altruismo e da sabedoria política?

As ambições pequenas aprisionaram o país e levantaram grades entre os cidadãos.

Desta prisão, escrevi cartas aos amigos como um brado de alerta e de estímulo esperançoso à nobreza da convivência entre as pessoas, à reaproximação e ao respeito à natureza generosa do país.

 




quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

NEGAVIRUS/19

 

NEGAVIRUS/19
Manifestou-se, em 2019, no ambiente brasileiro, um vírus político que resiste a todas as medidas científicas de controle para evitar o contágio das instituições em vigor. O Negavírus/19 se revela por frases de efeitos, bravatas soltas, espasmos culturais, desprezos provocativos, cansaço institucional, canetaços quixotescos.
O vírus se caracteriza pela negação da realidade. É a principal atitude que permite detectar sua presença e seu comportamento nas relações de convivência pública. Negar é preciso.
Não há pandemia no Brasil. A contaminação de milhões de pessoas pela gripe letal Sars2 é uma gripezinha que, até o momento, sacrificou apenas 181.000 cidadãos, que afinal, se escusa o Negavírus, um dia teriam que morrer.
Não há racismo no Brasil, apenas tensões sociais e injúrias raciais.
Não há negros, apenas brasileiros de cor verdade-amarelo.
Não há racismo, apenas discriminação de pobres, desempregados, gente de cor.
Não há corrupção no governo, apenas incompetência, leilão de cargos bem-pagos, desvios milionários, processos negociados.
Não há desmatamento na Amazônia, no Cerrado, na Mata Atlântica, apenas corte de arvores para a passagem da boiada, plantio da soja e exploração de minérios.
Não há queimadas na Amazônia, no Pantanal, no Cerrado, apenas alguns focos de calor.
Não há país no mundo que trate tão bem as florestas como o Brasil.
Não são os grileiros de terras públicas que incendeiam a Amazônia, são os índios e os pequenos agricultores.
Não houve apagão no Amapá, apenas um sinistro elétrico.
Não são confiáveis as urnas eletrônicas por alterarem votos. fraudar os eleitores e a esperança dos candidatos.
Não são as empresas brasileiras que compram ilegalmente quatro quintos da madeira ilegalmente serrada por madeireiros.
Não há vacina infelizmente para o negavírus. E, se porventura fosse oferecido pelo generalato que comanda a guerra contra o vírus, ninguém pode obrigar o contaminado a tomá-la em nome da liberdade e da democracia.
O coronavírus é uma questão de saúde física e mental e não de liberdade. A ignorância cobra mais caro do que a educação.
26.11.2020

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

IDIOMA DA NATUREZA

 

IDIOMA DA NATUREZA 

 

O idioma da natureza é o silêncio.

Os sinais são visíveis para o olhar, são audíveis para o ouvido, são tactáveis para o tato, são oloríferos para o olfato e saborosos para o paladar.

É com os cinco sentidos que se pode ouvir a natureza.

Penetrando em silêncio no espaço virgem de um ambiente natural, uma cena impactante é a conjugação indissolúvel da árvore com a água.

Esses dois elementos, acariciados pelo sol ou embalados pelo vento ou pela carinhosa brisa matinal ou vesperal configuram a paz saudável da qual desfrutam todos os seres animados em terra, ar ou água.

 

Para ouvir a natureza, há que se chegar de mansinho perto dela.

Ela fala pelo trovão da tempestade,

Pela chuva que molha os campos.

Pelo cicio das folhas embaladas pelo vento.

Pelo grito uníssono das curicacas.

Pelo grunhido cadenciado do tucano.

Pelo choro reprimido dos bambus.

Pelo chuá das cachoeiras saltando pedras.

A natureza fala pela vida que palpita no chão, no ar, na água.

A natureza fala pela dança alegre das borboletas azuis.

A natureza fala pelo silêncio das árvores.

 

18.11.2020

sexta-feira, 6 de novembro de 2020

O ROSTO DAS ÁRVORES

 

O ROSTO DAS ÁRVORES

Amigos,
As árvores não têm frente e verso como os bípedes inteligentes que as cortam sem pena. O homo sapiens, por apresentar apenas dois lados, o peito e o dorso, sempre caminha na incerteza: olhar para frente ou para trás. Olha para frente desconfiado do que pode vir detrás dele.
As árvores vivem seu quadrilátero. Olham incessantemente para os quatro cantos do planeta ao mesmo tempo. Tomam o sol da manhã, do meio dia e da tarde. Abraçam os ventos que sopram em todas as direções. E, além de olhar para todos os lados, miram o céu de dia, as estrelas à noite e apontam sabiamente para baixo onde está a água, o coração da Terra.
O bípede inteligente, também conhecido como homo sapiens, diante da pandemia linear, pode adotar a sabedoria das árvores e olhar serena e pacientemente para todos os lados da realidade.
É fascinante compreender e aceitar que a paz vegetal das árvores nasce dessa simples capacidade de estarem voltadas para todos os lados.

6.11.2020

quinta-feira, 5 de novembro de 2020

 

PROJETO OLHO D’ÁGUA

RELATO DE EXECUÇÃO

SÍTIO DAS NEVES - DF 

 

INTRODUÇÃO 

O projeto Olho d’Água começou em 1980, no Sitio das Neves,. com a finalidade de proteger uma área de 70 hectares do bioma Cerrado. Localizada à margem esquerda da Rodovia BR 060, direção Brasília Goiânia, na altura do Km 26, no perímetro do Distrito Federal. Integra a bacia hidrográfica do Rio Santo Antônio do Descoberto e a micro bacia do Ribeirão das lajes..

A área total do DF é de 582.200 hectares (5.822 km2). Segundo o plano de ocupação regional do DF, 80% (450.000 ha) seriam reservados às atividades rurais, reflorestamento, preservação de nascentes e cursos de água, e 20% (132.000 há) à urbanização ( serviços, habitação, educação, comércio, lazer, rodovias).

Atualmente, a urbanização absorve 60% (348.000 há), restando para o rural, 40% (234.200 ha), com tendência galopante a se reduzir ainda mais a área rural.

Essa inversão do uso do solo desencadeou um processo de desertificação do Cerrado, com eliminação de nascentes, desmatamento indiscriminado, perturbação dos aquíferos subterrâneos por meio de poços tubulares, impermeabilização de grandes áreas, causando assoreamento do Lago Paranoá, de rios e córregos de imensa área adjacente do Distrito Federal.

 OBJETIVOS DO PROJETO

 A proteção de nascentes mediante vegetação nativa garante a sustentabilidade da água, da produção agrícola e da qualidade ambiental.

Sob o aspecto ecológico e ambiental, o Projeto Olho d’Água propõe-se, de forma continuada, a preservar essa área de 70 hectares de Cerrado (700 mil metros2), denominada Sítio das Neves, mantendo suas características originais de fauna e flora.

A preservação ecológica e ambiental tem, portanto, caráter contínuo a fim de proteger a área de ocupações inadequadas e prejudiciais à natureza, seguindo orientações técnicas e científicas sobre a fenomenologia climática.

A preservação da área mencionada se estende por quatro décadas, com práticas de contenção e detenção das águas pluviais, por meio de barragens simples de pedra ou barragens-castor (galhos secos e terra de cupim), de tamanho adequado à declividade do terreno e ao volume, peso e velocidade da água. O desenvolvimento vegetal e a recuperação da biodiversidade são resultados que podem ser comprovados.

As matas ciliares dos córregos perenes que nascem na propriedade, Córrego Capão Azul, Córrego da Onça e as das nascentes intermitentes se ampliaram geometricamente. As matas de galeria dos vários cursos de água se ligaram umas às outras. As águas pluviais contidas e detidas nas barragens, sombreadas pelas matas de galeria, permanecem durante todo o período seco. A umidade mantida nessas áreas modifica lentamente o ambiente e fortalece as nascentes perenes e estimula as intermitentes.

Conseguiu-se, ao longo de três décadas, aumento dos índices de umidade com o armazenamento de água nos quatro aquíferos:

− aquífero radicular, volume de água contida nas raízes das árvores, plantas e gramíneas, graças ao sombreamento da vegetação.

− aquífero vegetal, volume de água contida nos troncos, galhos e folhas das árvores, em consequência da captação de umidade do solo pelas raízes.

− aquífero superficial, volume de água que brota das nascentes e forma córregos e rios, alimentado pelas barragens de contenção das águas da chuva.

− aquífero subterrâneo, volume de água estocada entre as camadas de rocha, preservado pela recarga das precipitações que se infiltram no solo e percolam até os mares interiores, graças ao repouso das águas nos lagos temporários resultantes das barragens.

 No âmbito da propriedade, a captação e detenção das águas da chuva são efetivadas por uma rede sistêmica de pequenas barragens de baixo custo e eficientes, que permitem a comunicação subterrânea das águas. Nas grotas e canais de escoamento, detém-se mais da metade do volume de água das chuvas do período, estimado em 400 milhões de litros, considerando um índice médio de precipitação de 1.300 mm/ano. É um processo fácil de multiplicar em todas as propriedades rurais.

A captação de água no Sítio das Neves atende a todas as necessidades de consumo humanas, criação de pequenos animais e produção de legumes e frutas.

O volume diário de captação e uso da água no Sítio das Neves foi determinado por um ato administrativo de outorga da água pela ADASA. Segundo cálculos técnicos, a vazão diária, no período de estiagem, da nascente de captação é de, aproximadamente, 30 mil litros de água. O consumo autorizado monta a 2.000 litros diários. A captação de água é feita por gravidade num percurso de 750 metros.

Graças aos resultados obtidos até o momento, a ADASA concedeu ao Sítio das Neves, em ato público, o PRÊMIO GUARDIÃO DA ÁGUA, no Dia Mundial da Água, em 22 de março de 2010. Instituto Brasília Ambiental (Ibram), após o georeferenciamento, por satélite, concedeu o registro do CAR (Cadastro Ambiental Rural), da Reserva Legal e determinação de Áreas de Preservação Permanente (APP).

Sob o aspecto educativo, por meio de parcerias com ong’s ambientalistas, palestras em colégios e universidades, publicações na mídia e visitas guiadas, propõe-se despertar nas crianças e pesquisadores o apreço pela natureza e a possível reprodução do processo de preservação em curso por outros proprietários de terra, agricultores ou não.

O projeto Olho d’água está aberto a pesquisadores de universidades e institutos ou centros de pesquisa ambiental, alunos e estudantes, funcionários e técnicos de secretarias de agricultura com funções de extensão e educação rural.

 EXTENSÃO E MORFOLOGIA

 A área do Sítio das Neves tem uma extensão de 70 hectares, com um desnível de oitenta metros entre o ponto mais alto, rodovia BR 060, e o mais baixo, desembocadura dos córregos Da Onça e Capão Azul no Ribeirão das Lajes.

O acesso à sede da propriedade é feito por estrada de chão de 1.100 metros de extensão, a contar da porteira de entrada. A conservação da via é feita manualmente.

As terras da propriedade são banhadas por três cursos permanentes de água. Ao sul, pelo Ribeirão das Lajes, integrado à bacia do Rio Santo Antônio do Descoberto, a Leste, pelo Córrego Capão Azul e, a Oeste, pelo Córrego da Onça.

Os córregos que nascem nas terras do Sítio das Neves têm uma extensão de aproximadamente 1.200 metros e desembocam no Ribeirão das Lajes.

 OBRAS DE PRESERVAÇÃO

 Todas as obras e atividades de preservação ambiental se realizam de forma manual, em caráter contínuo, segundo as estações do ano, utilizando material local. Exceção feita da classificação de plantas e aves, executada por profissionais em colaboração com o Ibram e ONG’s.

Até o presente momento, os custos da preservação ambiental, incluindo a construção de barragens, de aceiros e proteção das nascentes, do transporte de material, do combustível e placas de avisos são sufragados pelo proprietário.

As principais despesas se referem à construção e manutenção de barragens, classificação de plantas, aves e animais selvagens, comunicação e combustível.

 Brasília, abril, 2014

Atualizado 5.11.2020 

___________________________________

Eugênio Giovenardi

RG: 139.828 SSP/DF

CPF: 090.928.381-87

Fone: 61 9981 2807

eugeniogiovenardi@gmail.com

blog: www.eugeobservador.blogspot.com

 

Endereço:

SÍTIO DAS NEVES – Rodovia BR 060, Km 26 – DF

 

Registros Institucionais:

Código do imóvel rural (INCRA) - 9410180282315

Código da pessoa (INCRA) - 014353407

Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) - 04132124057

Número do Imóvel na Receita Federal (Nirf) - 3407896-7

 

Obras do autor sobre o tema ambiental:

1)  Os pobres do campo, Tomo Editora, 2004, Porto Alegre.

2)  O retorno das águas, Editora Ser, 2005, Brasília

3)  A saga de um Sítio, LGE, 2007, Brasília:

4) Ecologia - Prosperidade sem destruição

5) Ecossociologia - Relações do ser humano com a natureza

6) Reencontro - o que aprendi da natureza

7) As árvores falam - 

8) Uma obra em verde - Economia humana

 

 

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

CHUVAS DE OUTUBRO – 2013-2020

 

CHUVAS DE OUTUBRO – 2013-2020

EM MILÍMETROS – 1 mm = 1 litro/m2

 

ANOS       OUTUBRO            TOTAL ANO

                   Milímetros

2013          179.5                          2.255,6

2014          54.0                             1.677,5

2015          79.9                              1.642,7

2016          185.4                           1.921,7

2017          44.1                              1.478,7

2018          228.8                            1.760,5

2019          41.2                              1.068,7

2020          205.6                            1.263.4 (até 31.10)

 

No  registro de precipitações destes oito anos, o mês de outubro de 2020 confirma a irregularidade das chuvas. Dos oito anos, quatro oferecem menos de 100 mm, sendo 2019 o outubro menos chuvoso.

O acumulado de 2020 se aproximará da média anual de 1.500 mm, no Centro-Oeste, mas muito aquém dos anos de 2013 a 2016.

O  obscurantismo, a insensatez, a miopia, a insensibilidade diante de biomas queimados, do empobrecimento da biodiversidade, da contaminação das águas e do ar, estão entre as causas políticas e biológicas das pestes, vírus e patógenos múltiplos que assolam os brasileiros.. As decisões econômicas devem submeter-se ao sábio princípio da preservação  dos ecossistemas.

 

PLUVIÔMETRO

Índices registrados pela estação meteorológica digital instalada no Sítio das Neves, onde a mão humana é conduzida pela sabedoria silenciosa das árvores.

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

ANIVERSÁRIO DE HILKKA MÄKI GIOVENARDI

 

ANIVERSÁRIO DE HILKKA MÄKI GIOVENARDI

 

Lembro, hoje, algumas datas:

Maio/68, Paris, meu fatal encontro com a jornalista e tradutora Hilkka Mäki (foto PB), natural da longínqua Helsinque, Finlândia, país de Sibelius.

JULHO, 1969, nosso casamento em Helsinque.

JULHO, 1970, nascimento de nossa filha Aino Alexandra, que nos deu duas netas: LUIZA e LAURA.

JULHO, 1972, nossa mudança para Brasília.

JULHO, 2019 (foto), celebração de cinquenta anos de união estável, Bodas de Ouro.

Agradeço a Hilkka, em nome da literatura brasileira, a tradução de autores brasileiros, para a língua finlandesa, entre eles Machado de Assis, Jorge Amado e Érico Veríssimo. Especial gratidão também pela tradução de meu primeiro romance O HOMEM PROIBIDO.

Nossa conivência e cumplicidade mútuas nos ajudaram a “fazer caminho ao andar”.

Meu abraço,

Eugênio Giovenardi

 

 

 

 

terça-feira, 13 de outubro de 2020

FÓSFORO E CEB -INCÊNDIOS

 

FÓSFORO E CEB

 

O mito do fogo espontâneo foi desmentido pela quinta vez, no Sítio das Neves (DF), em regeneração ecossistêmica desde 1974.

O planeta, em milhões de anos de formação e esfriamento, com erupções superficiais e profundas, ardia de noite e de dia. Quando aparecemos no planeta congelado, tivemos que reinventar o fogo. No Brasil, incêndios espontâneos, se ainda possam acontecer, serão raríssimos e devem ser comprovados. Mas a informação falsa corre de boca em boca, entre sábios e ignorantes, e até ministros de estado.

No incêndio que ocorreu no dia 10.10.2020, e destruiu 13 hectares (dos 70 ha) durante oito horas, em área de nascentes do Sítio das Neves, teve uma causa comprovada: a mão do homo sapiens, que ainda não domina a tecnologia para enfrentar as leis físicas. Não dispõe de material adequado para conviver com outras energias, como o poder e a resistência do raio. Nas redes da CEB, os fios de alta tensão são presos no alto do poste por um isolador de louça e amarrados com fio de alumínio. A energia do raio, correndo pela rede em direção ao para-raios, encontrou um ponto fraco e detonou o arame de alumínio (foto). O arame encandecido caiu no pé do poste sobre capim seco e incendiou a área no meio do cerrado.

Desde 1976, quando foi estendida a rede na área, a Companhia Energética de Brasília (CEB) não faz revisão da rede que alimenta a região.

As cinco queimadas que atrasaram a regeneração deste protegido pedaço de Cerrado tiveram duas causas: fósforos de incendiários ignorantes e desatenção técnica dos administradores da CEB.

Leio, hoje (13.10.2020)  nos jornais, a decisão dos atuais administradores de vender a Companhia, construída com dinheiro público e sustentada por milhões de usuários e funcionários dedicados. Em vez de privatizar um bem público essencial, por que os atuais ocupantes da direção da CEB não pedem, corajosamente, demissão de seus cargos?

13.10.2020

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

CARTAS DE PRISÃO - BOM SENSO

BOM SENSO

CELA 101
Amigos,
Numa época tumultuada pela desorientação em quase todos os níveis das relações políticas, sociais e econômicas, ampliada pela insistente pandemia, tenho ouvido uma recomendação insistente: é preciso um pouco mais de bom senso.
Recolhi alguns pensamentos que ocuparam a mente de filósofos e escritores. O bom senso parece ter sido atropelado ao longo da história humana.
O bom senso é elemento central da conduta ética. Uma capacidade virtuosa de achar o meio termo e distinguir a ação correta, o que é, em termos mais simples, nada mais que bom senso. Aristóteles (384-322)
Se for algo que pode evitar, evite. Se você não tem porque ir pra Lombardia, por que ir pra Lombardia? Luis Mandetta (Min. da Saúde, 2020)
O bom senso é a aptidão a bem julgar, a arte de deslindar os fios embaraçosos, mantendo uma fiel submissão à realidade. Neste sentido, ele será sempre inimigo tanto da casuística como do rigorismo. António Rocha Martins (Univ. Lisboa)
Nos tempos que correm a maior parte das pessoas morrem de uma espécie de bom senso servil e descobrem demasiado tarde que não existem mais do que irremediáveis erros. Oscar Wilde (1854-1900)
Muitas vezes, há mais bom senso numa única pessoa do que numa multidão. Fedro (30 a.C)
O homem poderoso que junta a eloquência à audácia torna-se num cidadão perigoso quando lhe falta bom senso. Eurípedes (480-406)
É preciso termos muito bom senso para sentirmos que não temos nenhum., Pierre de Marivaux (1688-1763)
9.10.2020

quarta-feira, 30 de setembro de 2020

 

CHUVAS DE SETEMBRO – 2013 a 2020

 

EM MILÍMETROS – 1 mm = 1 litro/m2

 

ANOS       SETEMBRO          TOTAL ANO

                   Milímetros

2013          40.5                             2.255,6

2014            7.0                              1.677,5

2015          39.3                              1.642,7

2016          16.2                              1.921,7

2017          10.5                              1.478,7

2018          37.5                              1.760,5

2019          20.3                              1.068,7

2020          14.7                              1.057,8(até 30.9)

O registro de precipitações de oito anos, o mês de setembro se apresenta como antessala irregular dos meses chuvosos.

A partir de 2017 é evidente que os volumes de chuva decrescem.

O acumulado de 2020 será maior do que o de 2019, em razão das boas precipitações de fevereiro, março e abril, mas muito aquém dos anos de 2013 a 2016.

O  obscurantismo, a insensatez, a miopia, a insensibilidade diante de biomas queimados, do empobrecimento da biodiversidade, da contaminação das águas e do ar, estão entre as causas políticas da pobreza de mais de 70 milhões de brasileiros. O milagre econômico está em preservar os ecossistemas.

 

PLUVIÔMETRO

Índices registrados pela estação meteorológica digital instalada no Sítio das Neves, onde a mão humana é conduzida pela sabedoria silenciosa das árvores..

domingo, 27 de setembro de 2020

Cartas da prisão - PUDIM

 

 PUDIM

Amigos,

Chateado de andar com mascara até para levar o lixo no contêiner, tive um desejo infantil: comer pudim  Lembrei-me do pudim de dona Inez, minha mãe. De avental branco, cestinho na mão, ia ao galinheiro buscar ovos frescos. Abria o armário para pegar o leite condensado. O leite fervido da Estrela estava na leiteira. Batia tudo numa tigelona de vidro. Fechava a porta do forno do fogão a lenha e dizia: “pronto! Agora, é só esperar!” O pudim de dona Inez era famoso em toda a redondeza.

Nossa diarista Val, depois de meses, retornou ao trabalho semanal em nosso apartamento. Dei-lhe bom-dia, ao abrir a porta, e lhe disse: antes de ligar o aspirador, vou querer que a senhora faça um pudim. Nem terminei o pedido e Val, com tremenda autoestima, fez sua autopromoção. “Também na casa de Ligia Moreno (famosa pianista brasiliense, nascida na Ceilândia),  só comem do meu pudim”. A cozinha, em poucos minutos, cheirava a pudim, com aroma de baunilha. O pudim da Val é muito bom! Por que não pedi dois?

O terceiro pudimeiro de minhas lembranças, quem diria, é um arquiteto cearense, Fred Holanda, com receita não revelada. Segundo me informei com o sempre presente Coutinho, também arquiteto, o período de gestação desse incomparável pudim é de oito dias. Durante a maturação do excepcional pudim, o pudimeiro cearense executa ao piano peças de Villa-Lobos. É um pudim de alta musicalidade e, principalmente, super-super suculento.

Pudim, um presente da pandemia!

 

27.9.2020

quarta-feira, 23 de setembro de 2020

ICARTAS DA PRISÃO - IGNORÂNCIA

 

IGNORÂNCIA

Amigos,

A pandemia revelou minha generalizada ignorância sobre os mais variados temas. É verdade que, em matéria de coronavírus, literalmente todos: médicos, políticos, filósofos, teólogos ignoravam o bichinho da gripezinha. Ninguém sabia o que era, de onde veio, se do morcego, da girafa ou do pandolino (tatu) e aonde ia. Mortes, covas em série, enterros apressados, choros à distância foram realidades tão incômodas que os do andar de cima preferiram ignorá-las e negá-las.

A novíssima linguagem dos aplicativos digitais é a mais moderna tortura mental. Internará  a espécie humana no manicômio planetário. Levei três dias de pesadelo para achar os números necessários, nos sites do Ibraim e do Ibama, para validação de informações que ofereci à Receita Federal referentes ao pagamento de dez reais do Imposto Territorial Rural anual.  

Confesso envergonhado que não sabia que o planeta Terra é plano. Mesmo com a autoridade científica dos planistas, mantenho minha tênue e já ultrapassada convicção de um planeta redondo ou quase.

Vivo num país que abriga as mais variadas nuances religiosas, de extração cristã, anunciando milagres pelas TV’s e rádios. Confesso que ignoro a existência de adeptos da Cristofobia, religião denunciada pelo Presidente da República do Brasil, na 75a Assembleia da ONU, 2020. Quantos cristófobos existem neste país demonofóbico?

Inesperadamente, recebi uma ligação intersideral de Millôr Fernandes que habita, há alguns anos, uma avenida virtual na belíssima e fosfina Vênus. Seguindo as indicações do filósofo humorista, fui à estante de meus livros. Ler é indicado aos ignorantes. Em geral, os sábios chegam a tal estágio por aceitarem humildemente sua ignorância. Todo livro é a confissão humilde do escritor ao relatar a experiência de sua trágica ignorância.

Foi essa lucidez que inspirou Millôr a me revelar suas descobertas metafísicas no livro Lições de um ignorante (Ed. Paz e Terra, 1977). São apenas 43 lições. Fáceis de assimilar. Uma por dia. Ao final de gostosas gargalhadas, já me sentia um erudito, quase sábio.

Posso, agora, compreender a linguagem cifrada da alta cúpula do governo, dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado e, especialmente, a dos ministros do STF. Num país cronicamente ameaçado pelo comunismo, “os homens públicos falam sem nenhuma propriedade”, disse-me o mestre. Percebo também com mais clareza a acusação de pedófilo feita ao lobo-mau que devorou Chapeuzinho Vermelho. Meninas não devem andar sozinhas pelas florestas urbanas.

Indico algumas das Lições de um ignorante que me ajudaram a compreender o novo Brasil, Pátria Amada.

- Num acesso de ignorância eu acreditava “nas crônicas oficiais que mostram um país com uma sociedade absolutamente sem classe”. (Brasil, Pais Comunista)

- Colecionei algumas frases ditas pelo presidente da república: E daí? Quem manda é a caneta Bic... É uma gripezinha... Não sou coveiro. Ficar em casa é para fracos. Brasil é um exemplo de cuidados ambientais. Estamos vencendo a pandemia. (Frases que ficam e que vão)

- Aprendi que a regra do indiciado é negar os fatos até a última instância do trânsito em julgado. (A máquina da justiça e suas peças principais)

 -“O Brasil é maior do que os menores e menor do que os maiores. É o País do Futuro.(O Brasil)

- Na última lição (Resumo – 1963), olhando as árvores pela janela de minha prisão, no silêncio metafísico de meu isolamento, cumprindo a sentença do juiz invisível, li o derradeiro conselho sábio de Millôr Fernandes aos ignorantes:

Estejam certos porém de que a Justiça será igual para todos”.

21.9.2020

sexta-feira, 11 de setembro de 2020

QUEIMADAS, INCÊNDIOS,

 

QUEIMADAS, INCÊNDIOS,

O Grupamento Especializado em Proteção Ambiental (Gepram), entre maio e setembro de 2020, registrou, no DF, 4.858 queimadas de diferentes proporções. Uma delas foi de 602 hectares. O risco de incêndios, nesse período, é amplamente divulgado. Alertas são dados por todos os meios de comunicação a uma população que parece surda e insensível. Os incêndios anuais se dão quase sempre nos mesmos locais, com mais frequência à beira das vias.

Um dos efeitos maléficos das queimadas é o desnudamento das áreas, antes das chuvas. Os incêndios retardam a regeneração vegetal, dificultam a captação das águas pluviais e favorecem a lavagem do solo ao levar areia e sedimentos aos córregos e rios. Empobrecem o solo e assoreiam os rios. Tornam mais lenta a regeneração vegetal e arrasam milhões de vidas que formam a diversidade quase invisível de insetos que constituem o alimento de outras vidas.

É de se notar, com preocupação, que, nos últimos 30 anos, a região do Centro Oeste registrou 30 dias a menos de chuvas anuais. A redução de dias chuvosos, registrada pelo Inmet, passou de 137 dias de chuva, nos anos 1970, para 113 dias em 2019. A relação desmatamento-queimadas-escassez de chuva deveria sugerir medidas públicas não só de planejamento ambiental, como de comportamento ecológico da população.

Essas condições ambientais, poluição do ar e das águas, associadas á baixa umidade e ao calor, reduzem as energias vitais e favorecem um sem número de enfermidades. Entopem-se os hospitais e enchem-se as farmácias que se multiplicam em Brasília.

É um ingrediente a mais em tempo de pandemia.

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

CARTAS DA PRISÃO - DONA ANA

 

DONA ANA

Antigamente, a casa da vizinha era a extensão da dispensa das outras donas de casa. Uma xícara de arroz, uma colher de banha, pó de café quebravam o galho. Dona Ana é nossa vizinha há cinco anos. Pela idade, chamada de risco, curte sozinha o isolamento determinado pela pandemia do vírus 19. Meses antes, seus netos a visitavam com moderada frequência. Outras pessoas da família têm visitado Dona Ana. Sei pelos sapatos que deixam fora da porta. Por discrição, nunca perguntei se são filhos, noras ou genros. Encontro-me esporadicamente com ela. Ela sorri.

Na véspera da Páscoa de 2020, Dona Ana tocou à nossa porta. Minha mulher e eu fomos atender. Trazia em mãos um trabalho em tricô colorido. Perguntou se tínhamos liquidificador.

- Sim, Dona Ana. Precisa dele?

- Eu fiz um chapéu para cobrir o liquidificador. Se é um Walita, vai servir.

- Quanto é?

- É um presente de Natal.

Ela sorriu ao saber que era Walita. Aceitamos o presente. Em troca dei-lhe um livro e dois pés de alface colhidos em nossa horta. Dona Ana não disse mais palavras. Sorriu e voltou a seu apartamento ao lado. Ela é de poucas palavras e muito sorriso. Dona Ana é dos tempos que, em criança, se aprendia a tricotar com a vovó. Nunca imaginei pôr chapéu em liquidificador.

Dias passados, em plena pandemia, sem máscara, Dona Ana bateu novamente à nossa porta. Tinha em mãos um tricotado amplo e colorido. Uma espécie de saia rodada. Sorrindo, perguntou se tínhamos bojão de gás.

A pandemia fez Dona Ana voltar aos tempos de menina.

Tricotar é preciso.

26.8.2020

domingo, 23 de agosto de 2020

CARTAS DA PRISÃO - ISOLAMENTO – DISTANCIAMENTO

 ISOLAMENTO – DISTANCIAMENTO

São palavras básicas do paradigma de convivência do novo normal. O dicionário do novo normal se restringiu a essas duas palavras. Despidas do floreio poético que lamenta a perda de um amor ou da pátria distante, elas propõem a fuga incessante de um vírus invisível que, para sobreviver, requer aproximação e ajuntamento. O isolamento é a vacina disponível. Estamos condenados ao isolamento por termos cometido atos antissociais contra a natureza. Isolamento, afastamento, apartamento, distanciamento. Longe, retirados, separados, excluídos, segregados, desagregados, ilhados, descasados, desterrados. Mascarados. Isolar-se de quem? Do quê? Por quê? O que os outros têm que eu possa receber de ruim ou de bom? A espécie humana é gregária. Adora ajuntamento. Carnaval. Futebol. Bar. Aniversários. Festas. Agora, não pode mais. A ordem é: isola o vírus! Há mais de 20 mil anos, o homem sapiente vem domesticando seres vivos: arroz, feijão, soja, boi, cão, cavalo, gato, cobra, periquito. Desorganizou a vida nas florestas e no mar. Agora, tem que fugir do vírus que se rebelou contra a desordem. Fugir do vírus. Fugir dos outros que fogem do vírus. Não basta isolar-se. Há que manter distância. A vizinhança sempre foi um fator de ajuda, de apoio, de companhia, de união. Agora, o novo normal é ficar longe. É arredar pé! É certo que a vizinhança, os ajuntamentos ocasionam fofocas. Mas a fofoca é o combustível da convivência. Afasta uns e une outros. O novo normal está marcado por mortes, sem o carinho dos amigos. O sepultamento sem a lágrima refrescante dos familiares. Uma separação, um isolamento definitivo e sem volta. O novo normal nos esconde a boca sensual, o belo nariz, o sorriso do rosto, o brilho dos olhos.
O novo normal. Cada um, por si. O vírus, por todos.

Nada melhor do que isolar-se em campo aberto. (Foto: E. G. Sítio das Neves)

23.8.2020

terça-feira, 18 de agosto de 2020

GLORIA E QUEDA DO HOMO SAPIENS

 

 

 GLORIA E QUEDA DO HOMO SAPIENS

 

 

 

 

 

 

 MENSAGEM AOS SOBREVIVENTES

 

 

 

 

Eugênio Giovenardi

Escritor e Ecossociólogo

2020

 

 

     

Há quatro décadas, observo as relações de convivência e de interdependência da espécie humana com milhares de outras espécies da biodiversidade, especialmente no Cerrado brasileiro.

Todos os caminhantes deixam pegadas de seus passos. Por caminhos abertos passam os que vêm depois. Nestas respostas, deixo minhas pegadas. Tenho certeza de que as medidas nem sempre servem a todos os pés. Vivo numa nova capital e na antessala de um novo mundo. Lanço um novo olhar sobre o planeta e especificamente sobre a natureza.

Estamos numa encruzilhada. Andamos muito. Cometemos afoitezas. Corremos, quando devíamos andar devagar. Atropelamos a natureza. Empobrecemos o planeta. A resposta ecológica do planeta está clara. A covid/19 é um alerta global

A água, os esgotos, o lixo matam vidas e, nessa onda, vamos nós, a insigne espécie sapiente. Há que ouvir a natureza. Ouvir as árvores e seus gritos silenciosos. Comover-se com os clamores dos pássaros e sentir-se culpados pelas mortes de animais nas rodovias.

Como sairmos desse labirinto ou desta prisão que construímos sem prever uma porta de saída? Temos riqueza contrabalançada com extrema pobreza. Não sabemos o que e como fazer com elas.

Nesta comunicação, em forma de entrevista, colecionei vinte perguntas que me fiz e que outros mais jovens me fazem diante das certezas, incertezas e alertas de nosso tempo às voltas com um vírus invisível.

 

-– Há milhares de anos, os hominídeos vêm enfrentando mudanças climáticas. Nossos antepassados próximos, os Neandertais, abriram caminho para o Homo Sapiens. Eles se extinguiram. Nosso destino poderá ser o mesmo?

 

O degelo no Hemisfério Norte, os desertos do Hemisfério Sul tenham talvez provocado o encontro entre Neandertais e Homo Sapiens, ao longo de séculos. Mudança de rumos na história da espécie humana. O homo sapiens se adaptou ao frio, ao calor, aos vales e às montanhas. Arriscou-se à travessia de rios e mares, por terra, mar e ar. Mudamos permanentemente, mesmo sem perceber que mudamos. O tempo é testemunho das mudanças, das adaptações, de êxitos e fracassos. Da GLÓRIA E QUEDA DO HOMO SAPIENS. Nossa época e nossa cultura são o resultado de contínuas mudanças. Saímos da coleta de folhas e frutos, da caça individual ou cooperativa, há 15 ou 20 mil anos. Domesticamos cereais, e animais. Construímos cidades, palácios, impérios, templos, universidades, bibliotecas, teatros, arenas para os mais variados esportes.

Parece que a tão almejada felicidade ou o paraíso prometido ficaram para trás ou se mantêm escondidos das elucubrações do cérebro humano.

Há fenômenos naturais ou a natureza das coisas que atropelam a rotina ou os planos da espécie humana. Somos o único mamífero cujo cérebro é capaz de perceber, compreender e acompanhar o funcionamento das leis físicas.

 - Fala-se, cientificamente, em mudanças climáticas com ênfase no aquecimento global. Como olhar esse tema? A espécie humana corre risco de extinção?

 Todas as espécies vivas que se originaram há milhões de anos podem desaparecer com a mesma naturalidade com que apareceram, ou por fenômenos naturais, ou por violenta e continuada ação depredadora da espécie humana. A vida depende grandemente das condições climáticas que podem mudar o ambiente favorável à reprodução dos seres vivos. A vida é um milagre que inclui seu desaparecimento. O milagre da vida é inexplicável. O universo não tem como objetivo servir à espécie humana. Ela é apenas um dos habitantes de um planeta.

 . – Que fazer para deter o esgotamento das riquezas do planeta?

 Todos os sinais acenam para um novo olhar compreensivo sobre a natureza. O planeta é conformado por ecossistemas e biomas. Neles se origina o milagre da vida que engloba a biodiversidade unida pela interdependência de todos os seres vivos. A chegada lenta e gradual do homem sapiente, neste planeta, introduziu uma nova maneira de tratar a interdependência de todos os seres da biodiversidade da qual ele faz parte. Seu cérebro e suas mãos tentam adaptar a natureza a suas necessidades essenciais e da forma como considera mais adequada a alcançar esse fim. Nesta trajetória, a espécie humana optou erroneamente a utilizar a natureza apenas como objeto de exploração econômica, rompendo os processos estruturais da regeneração ecológica dos ecossistemas.

 - Qual é nossa parte na devastação ou no esgotamento do planeta?

 A ação de todos os seres vivos sobre os ecossistemas e respectivos biomas modifica com maior ou menor intensidade, o ambiente externo. Os seres vivos, que se alimentam de vegetais ou de proteínas não vegetais, exigem da natureza uma energia contínua de regeneração. Parece claro que grandes animais necessitaram volumes proporcionais de alimentos. É razoável pensar que muitas espécies, ao longo de milênios tenham desaparecido no meio de mudanças climáticas que os deixaram sem comida. A ação do homem sapiente, graças a seu desenvolvimento cerebral, sua capacidade de intervenção, invenção e inovação, pode alterar drástica, contínua, e perigosamente as relações da interdependência dos seres vivos. A mão humana tanto pode extinguir espécies animais como florestas. Este comportamento incontrolado compromete a biodiversidade, rompe e retarda o ciclo da regeneração dos sistemas vivos.

 – A sobrevivência da espécie humana se baseia na busca permanente de alimentos. Como salvar a biodiversidade?

 As ações complexas da espécie humana sobre os ecossistemas, sobre a biodiversidade, definidas como econômicas, culturais, sociais, religiosas, políticas, tecnológicas, cibernéticas, se orientam a preservar, antes de tudo, sua sobrevivência e reprodução. A intensidade da exploração das riquezas do planeta pelo aumento da população nos cinco continentes está gerando efeitos globais que afetam basicamente a água dos rios e do mar, e o ar: elementos essenciais para a biodiversidade em todos os ecossistemas. Segundo o Atlas Mundial da Desertificação (2020), três quartos do solo do planeta estão degradados As mudanças climáticas assumem proporções incontroláveis diante dos efeitos maléficos da ação humana sobre a água que tomamos e o ar que respiramos. Os vírus, as bactérias e as doenças atacam e matam populações e espécies da biodiversidade por esses dois caminhos. Todos tendem a defender a própria vida, sejam seres visíveis ou invisíveis como os vírus. Nós pertencemos à biodiversidade e também defendemos nossa vida. Mas sempre há riscos nessas relações de sobrevivência. Busquem-se, nas águas sujas e nos esgotos ao redor do planeta, os restos mortais de muitos vírus.

 – Temos tecnologia, meios, instrumentos para prever mudanças climáticas. Terremotos, maremotos, altas e baixas temperaturas. Isso não é suficiente para nos defender?

 A espécie humana tem se adaptado aos mais diferentes ambientes do planeta. Nas regiões polares ou no equador. Sua experiência de mais de 300 mil anos lhe deu conhecimentos para resistir e se defender de grandes mudanças climáticas.

Temos, hoje, séries históricas de fenômenos climáticos. Produzimos sensores de grande alcance. Operamos cálculos matemáticos e estatísticos que permitem antever alguns eventos. Os animais também pressentem mudanças ou eventos perigosos e buscam abrigo. Uma coisa é prever a ameaça de fenômenos físicos, outra, muito diferente é prever nosso comportamento diante deles. Alguns, como inundações, são favorecidos pela urbanização em espaços inadequados, pelo desmatamento, pelo desvio de cursos de água, ou pelo esgotamento de lagos.

O planeta é sacudido desde sempre por fenômenos físicos e mudanças climáticas. A esses fenômenos naturais se associa a ação humana em seu afã de extrair do planeta mais do que ele pode dar. Arrasa montanhas, desvia cursos de rios, esgota aquíferos superficiais e profundos, destrói florestas, polui águas, o solo e o ar com a queima de combustível fóssil, petróleo e gás.

As mudanças climáticas, aquecimento local e global, cataclismos imprevisíveis, secas, inundações, tormentas, vendavais arrasadores, tornaram-se o pão de cada dia em todos os países e com frequência perturbadora. Perdemos vidas e o produto do trabalho, da técnica e da arte empregados.

 – O conhecimento cada vez maior da espécie humana poderia retardar ou evitar seu desaparecimento? A tecnologia não dará os meios para vencer os obstáculos naturais, especialmente as doenças?

 Há dois momentos em que o conhecimento pode prolongar nossa presença no planeta. Ciência preventiva e ciência curativa.

O que sabemos sobre a natureza? Sobre seus segredos? Sobre os riscos da rota do planeta no Sistema Solar? Sobre seu potencial positivo ou negativo para a manutenção da vida? Sobre terremotos ou maremotos? E, agora, sobre vírus? Ou bactérias? Se soubéssemos antecipadamente, pela via da ciência preventiva como parte da biodiversidade, não teríamos 100 mil mortes causadas por um vírus, no Brasil, até agora.

A ciência preventiva está ainda em cueiros. Os complicados caminhos no labirinto da biodiversidade e da interdependência de todos os microssistemas de vidas não foram devassados. Estultos os que acham que se pode criar um vírus.  Pode-se criar o ambiente favorável para que vírus e bactérias apareçam sem avisar. O vírus também defende a própria vida e busca seu espaço. O vírus tanto pode viajar de avião quanto na patinha de um canário. Com toda a tecnologia acumulada em 20 mil anos, ainda estamos na antessala do desbravamento da natureza que nos sustenta. Nossa corrida, no estágio atual, é apelar desesperadamente para a ciência curativa, no afã de vencer a força das calamidades, de guerrear vírus invisíveis, nos livrar de suas ameaças, de fugir delas ou de conviver com elas.

O vírus é um ser vivo, animado. E todos os seres animados assumem sua cota de predador para sobreviver. Os humanos também são predadores e lutam para se reproduzir. Atacam outros seres vivos e se defendem na luta pela vida. É a natureza das coisas. O vírus é um alerta da natureza.

 – Como mudar a forma de coparticipação da espécie humana na interdependência e na regeneração da biodiversidade?

 A lei da gravidade econômica nos lançou num abismo do qual teremos que sair para sobreviver. Por algum tempo ainda, estaremos sob o efeito da lei da inércia capitalista arrasadora que arrastou a espécie humana ao consumismo destruidor.

O fracasso do capitalismo, do crescimento econômico, do consumismo, das inversões no supérfluo para oferecer felicidade à espécie humana é um alerta para o homo sapiens. Se quiser sobreviver tranquilo no conjunto de vidas da biodiversidade terá que rever a maneira de se relacionar com a natureza.  Há que ter humildade para reconhecer o fracasso, as causas do fracasso, os efeitos do fracasso sobre os elementos vitais da sobrevivência, como água e florestas, poluição do ar e das águas. Mas também reconhecer o fracasso nas relações humanas, na distribuição de oportunidades, na repartição dos bens comuns da natureza para saciar a fome de milhões, no tratamento solidário e respeitoso a culturas milenares.

Os quarenta milhões de trabalhadores brasileiros que o crescimento econômico excluiu do bem-estar não terão mais lugar nas empresas que os demitiram.

Não serão, com certeza, os donos do poder que, hoje, ditam normas autoritárias e corporativas de convivência desigual, os que se apressarão a mudar de rumo. São os que enfrentarão a vida nos próximos cinquenta anos. Eles já estão gritando e exigindo o início de uma nova era. A era deles.  Preparada por eles. Nossa herança cultural é indefensável. Em todas as partes do planeta há demonstrações de que os jovens não querem propriedades industriais globalizadas nem contas bancárias sujas de sangue e de exploração das pessoas e da natureza.

 – Quem e quando, então, começará um movimento de mudança cultural tão global quanto as mudanças climáticas?

 O que e como se fará essa mudança faz parte de um processo de regeneração cultural que se inicia nas comunidades locais e se prolongará lentamente por toda a floresta humana. A globalização econômica, submetida ao poder dos detentores da riqueza acumulada, pasteurizou as diferentes culturas e lhe deu um caráter de modernidade à qual parece indispensável aderir. Há quem sugira uma nova glocalização, ou seja, trazer para o local a solução das dificuldades locais, com recursos locais proporcionais às necessidades da população e adequados à preservação do ambiente. A tecnologia da informação será o instrumento para dar vida às comunidades locais. Em vez de bancos centrais para explorar gigantescamente as riquezas globais do planeta, bancos de solidariedade poderão apoiar-se mutuamente para que o ambiente local seja preservado em favor da população.

 – A invenção, a criatividade, a ambição do poder cederiam ao gigantismo incontrolável da globalização?

 Descuramos e até afrontamos o princípio da precaução que orienta a não se tomar medidas que provavelmente trarão resultados negativos. Avançamos o sinal na ilusão de não sermos punidos com um tremendo acidente. O momento que vivemos não é de concertar o vaso quebrado, mas de criar novos instrumentos de trabalho e novos caminhos para a paz social e econômica no planeta.

As condições de vida que as novas gerações irão encontrar dependem do que se faz hoje. O que se deseja encontrar no futuro não acontecerá no futuro. O futuro começa a acontecer no presente. É o presente, com as lições do passado, o tempo de pensar, decidir e fazer.

Parece-me que três atitudes devem ser adotadas no presente:

a)     Conhecer e respeitar a força do funcionamento das leis da natureza e não atentar contra ela.

b)    Compreender a interdependência de todos os seres vivos para alcançar conhecimentos científicos preventivos que possam enfrentar fenômenos naturais repentinos.

c)     Preparar estruturas diversificadas para contornar os efeitos de fenômenos naturais físicos (terremotos, tormentas) ou de conflitos nas relações de interdependência dos organismos vivos (bactérias, vírus).

 . – Que podemos prever para o futuro, diante das dificuldades atuais e da urgência de enfrentar as mudanças climáticas e os fenômenos naturais imprevisíveis?

 Gostamos de números. O homem sapiente usa os números do passado e joga para o futuro como se eles fossem obedientes ao nosso raciocínio. Números não expressam a realidade. A realidade não tem compromissos com estatísticas. Números são apenas nossas referências, são convenções. Os números geraram uma doença intelectual incurável: os percentuais. Achamos que os percentuais explicam mais claramente do que um número inteiro para mostrar uma suposta realidade. Mil mortos são mil mortos cujo desaparecimento do convívio arranca lágrimas de pelo menos outras dez mil pessoas, entre parentes e amigos. Nada se acrescenta se esses mortos representam 5,79% de uma população. Claro que uns mortos têm mais amigos que outros. De que adianta buscar um percentual para saber quantos tiveram mais amigos ou parentes que outros? Cometemos diariamente esses absurdos.

 – Todos os sinais visíveis da natureza indicam que mudanças radicais se aproximam e outras já estão em curso. Teremos força e vontade para mudar nossas atitudes diante dessas mudanças?

 Acumulamos conhecimentos importantes durante 20 mil anos. Mais intensamente, nos 5 mil anos passados. E mais proximamente, nos últimos 200 anos. Mudanças não são novidade na existência dos hominídeos e do homem sapiente.

Mas, parece claro que as mudanças provocadas por nós e as que a natureza nos impõe serão enfrentadas de outra maneira pelas novas gerações.

O que muda no ambiente exterior que circunda a espécie humana a obriga a se adaptar às mudanças para não ser extinta por elas. A realidade é a sirene do alarme. A natureza não é virtual. É real. Tentamos fugir da realidade. Queremos transformar a realidade das coisas em realidades virtuais com as quais podemos lidar, mexer, trocar. Eis a ilusão que nos faz desviar do caminho.

Mudanças acontecem, no universo há bilhões de anos. Nosso planeta passou do fogo à água. Vulcões e terremotos frequentes atestam as mudanças climáticas de um remotíssimo passado.

Desde que a vida surgiu das águas, os seres vivos, ao se diversificarem, foram se adaptando ao meio, à alimentação necessária para a reprodução e sobrevivência. Mas a interdependência dos seres vivos é uma lei natural. Nossos antepassados nos deixaram esta herança: sobreviver às mudanças. Mudanças de clima, mudanças geológicas, nascimento e extinção de espécies, obedecendo ao processo de regeneração lenta, mas contínua, no conjunto da natureza.

 – Como conciliar cooperação e competição?

 Uma compulsiva tendência à cooperação, presente já no período coletor e caçador, levou a espécie humana a dominar energias naturais, a inventar meios técnicos para facilitar sua sobrevivência e reprodução. O princípio da cooperação conduziu os diferentes grupos, estabelecidos em distintos espaços geográficos, com variadas oportunidades de viver e conviver, para definir normas, códigos e leis com o fim de ordenar a convivência. A cooperação não elimina a energia da competição que pode servir de vitamina para novos movimentos ou germe para conflitos a serem resolvidos.

A energia das mudanças atinge a espécie humana pelo inestimável fato de ela possuir um cérebro capaz de perceber, compreender e acompanhar os fenômenos físicos, e o impacto das atividades do homo sapiens sobre eles.

Atingimos um ponto elevado na história da convivência humana, da ciência, da organização social, da exploração econômica dos bens do planeta. Esse ponto da escalada vertical parece indicar que as mudanças a serem enfrentadas, podem catapultar o homo sapiens para um patamar mais equilibrado e calmo, mas não sem sofrimento e pesadas perdas.

 .– Como avaliar as grandes conquistas que deram energia à espécie humana para tantas vitórias sem eliminar o risco da própria extinção?

 As revoluções parecem ser nossa glória e, ao mesmo tempo, nossa queda. Todos os impérios conhecidos tiveram sua glória. Pouquíssimos resistiram à queda. Convém dividir a espécie humana em dois tempos mais visíveis. O primeiro é o que, nos últimos 200 anos, parece ter achado o caminho do êxito, da glória, da felicidade, do paraíso por caminhos pedregosos com uma engenharia de labirinto. O segundo tempo é representado pela nova geração, por um novo homo sapiens, com células cerebrais cibernéticas que questionam todos os valores sociais, familiares, religiosos, culturais, econômicos, políticos, sexuais e raciais.

Os jovens, neste segundo tempo, atual e moderno, constroem um novo cenário de relações com um vocabulário tirado de um dicionário que a velha guarda tem dificuldades de interpretar.

A nova história da espécie humana não borra o passado. O passado será um museu histórico no qual se evidenciam as eras culturais da turbulenta convivência humana ao longo de milhares de anos.

Como a energia das mudanças, em nossa época, afetará a velha guarda do homo sapiens e a nova geração cibernética é a questão a ser respondida pelas duas partes ao mesmo tempo. Os conflitos durante esse lento e longo período de mudanças aparecerão e serão solucionados com as ferramentas de cada etapa.

No período de mudanças, ou no tempo em que elas se anunciam como fenômeno sociocultural irreprimível, de pouco adianta querer indicar rumos ou situações possíveis ou previsíveis. Há que ater-se à realidade dos fatos que as mudanças impõem no presente. O passado é indestrutível. O futuro se constrói no presente. O futuro são nossos netos e bisnetos quando completarem 50 ou 80 anos. O trabalho cerebral dos dois grupos, simultaneamente tocados, terá que se dobrar à realidade, sem deixar-se conduzir pela fantasia. O planeta, a natureza é real. Não virtual.

Num terremoto há mortos que serão enterrados. Há prédios destruídos que serão reerguidos com diferentes técnicas e engenharia. Num terremoto cultural, de abrangência universal, haverá perdas estruturais que sustentavam concepções afetadas pela obsolescência. Em compensação, longos e fatigantes esforços de regeneração das energias levarão as novas gerações para outras plataformas com novos paradigmas de convivência.

  – Não parece ameaçador o confronto entre mudanças e capacidade de adaptação?

 O que determinará a boa e racional adaptação às novas circunstâncias provocadas, simultaneamente, pelas mudanças climáticas e pelo esgotamento e obsolescência do modelo e do paradigma cultural, social e econômico vigente, estará condicionado a uma nova resposta verde, a um novo olhar sobre a natureza. Esse novo olhar significa melhor compreensão do sentido da interdependência dos seres componentes da biodiversidade nos diferentes ecossistemas do planeta.

As mudanças levam tempo. A reação contra a segregação racial se arrasta por mais de cem anos. A diferença no tratamento ou a discriminação de gênero avança a passos lentos. Quanto mais cresce a população mundial e quanto mais se criam grupos racialmente independentes, economicamente desiguais, regidas por leis discriminatórias, mais difícil será consolidar um novo paradigma para a mudança. Por isso, a globalização dos comportamentos estereotipados está ruindo.

O caminho em direção à mudança de paradigma da convivência humana é imposto pelo fracasso da exploração econômica que condena 2 bilhões de pessoas à pobreza, à miséria, à desilusão da vida. Pelo fracasso político das nações em guerras localizadas. Pelo fracasso ecológico revelado na destruição de ecossistemas favoráveis à vida. Pelo ataque sistemático à interdependência dos seres vivos.

O Brasil, hoje, parece estar na rabeira das mudanças estruturais para um novo caminho, pois algumas lideranças insistem em retrocessos éticos, morais, culturais e ambientais. A nossa geração arrisca de deixar aos descendentes uma dívida impagável.

 – A urbanização cada vez maior da população não torna mais difícil enfrentar as mudanças climáticas e culturais?

 A urbanização, a atividade de produção de alimentos e indústrias correlatas são elementos ou atividades que necessariamente serão cenários de mudanças. Essas atividades se atrelam ao crescimento da população. Maior população exigirá maior ocupação de espaços, maior invasão dos ecossistemas, tanto pelo desmatamento implacável, pelo uso diversificado e poluição das águas, desvio do curso de rios, alteração do ambiente pela poluição e produção sistêmica de lixo e esgotos.

Na década de 1970, demógrafos avaliavam a capacidade de suporte do planeta diante do risco da bomba populacional (The population bomb, Paul Eherlich, 1968). No começo dessa década, a população humana (3 bilhões) teria atingido o número adequado (ideal) para manter o equilíbrio das riquezas limitadas que o planeta dispõe para benefício equitativo da espécie humana. Ao mesmo tempo, estaria preservado o equilíbrio reprodutivo da biodiversidade e facilitaria a regeneração das espécies vivas.

A superlotação do planeta, estimulada por fatores econômicos, culturais ou religiosos, é um tema a ser tratado com seriedade, franqueza e urgência. A superlotação de um espaço inibe a cooperação entre as pessoas e a natureza, acirra a competição para o uso dos elementos essenciais à vida e dificulta a solução de conflitos sociais e ambientais. A racionalidade é uma das virtudes do homo sapiens que lhe permite ordenar o equilíbrio entre as limitações das riquezas naturais do planeta e a intensidade do uso dos bens essenciais: água, alimentos e energia físico-eletrônica. O controle do crescimento da população, em todas as regiões do planeta, é uma decisão racional e urgente, cujos efeitos abrangem a biodiversidade em todos os ecossistemas.

Somos, hoje, 7,8 bilhões de humanos a consumir as riquezas do planeta, a começar pela água. Em duas décadas, haverá cerca de 11 bilhões.

“Essa progressão, no entanto, vai terminar, afirma o sociólogo Jeremy  Rifkin (Denver Unv.). As razões para isso têm a ver com o papel das mulheres e sua relação com a energia. Na antiguidade, as mulheres eram escravas, eram provedoras de energia, tinham que manter o abastecimento de água e alimentar o fogo para cozinhar.”

As mulheres acumularam sabedoria e prudência para dar continuidade à vida, estimular e introduzir mudanças nas relações sociais e econômicas adequadas às limitações da casa comum que habitamos. Cabe a elas decidir.

 - Por que ainda se insiste em indicadores que dependem um do outro e não saímos do lugar: Produto Interno Bruto (PIB), Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), Índice de Felicidade Humana (IDFH)?

 Há alguns anos penso num Índice de Conservação e Regeneração da Biodiversidade e dos Ecossistemas a ser aplicado em comunidades locais sem contaminá-lo com médias nacionais ou globais.  Pode não ser um indicador ideal para os que insistem no crescimento econômico. Nos novos tempos, há que se medir a ação humana sobre a globalidade de seus efeitos em relação com a capacidade de regeneração dos ecossistemas e da biodiversidade com um paradigma de economia ecológica. A preservação racional do conjunto da biodiversidade propicia um ambiente de sustentação da vida. Esse novo olhar sobre a natureza dignifica a espécie humana e dá sentido universal ao milagre da vida.

A dita classe política, as empresas preocupadas com o crescimento econômico não perceberam nem ouviram o grito dos que enfrentarão o novo milênio. Os milenares, os jovens deste milênio já estão nascendo e deixando para trás seus antecessores.

Que sentido terá e que lugar ocupará o PIB numa era cibernética na qual os valores culturais, sociais, ambientais e econômicos serão reordenados e sustentados por novos códigos éticos? Como e até quando se sustentará a economia baseada em combustíveis fósseis, em consumo irracional de supérfluos, em urbanização massiva do planeta, em redução constrangedora da vegetação milenar e em esgotamento de mananciais aquíferos?

Vozes jovens, como a de Greta Thunberg e da brasileira Valentina Ruas, lideram outros milhões da geração deste milênio e reclamam por um novo cenário em que viverão nos próximos cinquenta anos. A geração que dominou no século 20 será substituída, mesmo a contragosto, pelos novos chegados a este milênio. Os 3 bilhões de pirralhos conscientes de hoje terão pela frente um novo mundo com outras decisões.

 – Quais são os pontos sensíveis para a biodiversidade em meio às mudanças climáticas atuais?

 Todo alerta deve ser respeitado para termos tempo de tomar medidas adequadas a compreender e adaptar-se às mudanças.

No ritmo das mudanças climáticas, cientistas consideram evidente o impacto da ação da espécie humana sobre o agravamento dos efeitos negativos, especialmente sobre a poluição do ar e das águas. Durante a pandemia provocada pelo novo Coronavírus, as medidas de restrição à circulação de pessoas, fechamento de fronteiras, interrupção de transporte por vias aéreas, marítimas e terrestres, constatou-se sensível melhora na qualidade do ar. No entanto, o volume de lixo não coletado para reciclagem continua comprometendo os ecossistemas. Os esgotos não tratados afetam a qualidade das águas superficiais e profundas e são uma reserva viva de bactérias e vírus.

A ação da espécie humana agride, ao mesmo tempo, o ventre, a pele e os pulmões do planeta: águas, solo e vegetação. Destruímos grande parte do passado do planeta. Imensas jazidas de material fóssil já não existem. Viraram combustível de máquinas poderosas e espalham CO2 na atmosfera. O planeta levará milhões de anos para se regenerar. Por isso, não são apenas ameaças de extinção de espécies e do próprio homem sapiente. É  uma lei da natureza. Por isso, o crescimento zero de nossa ação econômica destruidora é uma imposição da natureza.

 – Novos paradigmas, novas atitudes, novas soluções serão possíveis em pouco tempo ou teremos décadas de ansiedade para romper as estruturas que sustentam o insustentável?

 Nossos tataranetos, daqui a 60 anos, talvez não discutam mais aposentadoria, nem carteira de trabalho. Eles não compreenderão porque tentamos, durante décadas, guardar os dedos e os anéis.

Antes de 1800, ninguém falava em aposentadoria. Eram tempos de trabalho escravo e defendido por normas sociais e apelos filosóficos. Humanizou-se, depois, legalmente o trabalho. Essas leis, chamadas trabalhistas, já não se sustentam. Criar-se-á um novo paradigma a sustentar a criatividade humana, as iniciativas econômicas restritas à limitação do planeta.

Não houve um planejamento explicito para chegar à Revolução Industrial, nem à Revolução Tecnológica, nem à Revolução Cibernética Digital. A espécie humana foi levada pelos fatos, pelas necessidades de cada época. Hoje, os fatos são outros, as necessidades são outras. As soluções serão outras. A revolução será outra. A Quarta Revolução não é para derrubar governos. A Revolução do século 21 é proteger e plantar árvores para devolver ao planeta o que extorquimos dele.

A realidade indica que nossos métodos econômicos não conseguem resolver os problemas crônicos e cada dia mais presentes. É bom, e com urgência, lançar os fundamentos para que as futuras gerações encontrem novas soluções às dificuldades do relacionamento da espécie humana consigo e com todas as espécies da biodiversidade, que a natureza insiste em defender.

Os fenômenos da natureza não costumam se anunciar com antecipação, nem o lugar onde irão aparecer, nem escolhem ou discriminam possíveis vítimas ou expectadores.

A natureza é fatalista e, por isso, temos que estar preparados para eventuais cataclismos, infestações de vírus e bactérias. Há evidências de que a complexa atividade humana tem gerado pandemias porque alterou o ciclo da água e do ecossistema que mantém o equilíbrio ecológico do planeta. As mudanças climáticas, desde milhares de anos, provocam movimentos de populações humanas e de outras espécies. Atualmente, quase oito bilhões de humanos estreitaram, com outras vidas animais, suas relações de convivência e subsistência. Em consequência as mudanças climáticas atingem a saúde de todos os seres vivos. Vírus e bactérias viajam juntos no mesmo avião.

– Temos parte no empobrecimento do planeta. Qual é nossa parte na reconstrução e na regeneração dos ecossistemas?

 Na era do antropoceno, (como relata Eugene Stoemer, biólogo americano), parte importante das mudanças climáticas e ambientais sobre o ecossistema entra na conta da espécie humana.

Nos últimos 200 anos foi intensa a exploração da Terra. O solo se havia mantido quase intato até estriparmos o ventre do planeta para lhe roubar o gás, o carvão, o petróleo, além do ouro, da prata e do diamante.

Depende da espécie humana construir, no presente, infraestruturas que a levem a olhar a natureza e o planeta de maneira distinta. E isto é possível. As novas gerações revelam a necessidade de nova visão, uma visão distinta do futuro. Infelizmente, os líderes dos principais países não demonstram essa visão. A manutenção dos investimentos e da riqueza acumulada continua na mesa das decisões. São as novas gerações a pôr, sobre a mesa, novas formas de atuar. Elizabeth Kolbert alertou a humanidade sobre a sexta extinção silenciosa de espécies animais e vegetais, sequer percebida pela maioria distraída. A principal autora é a espécie humana. Milhares de espécies de animais se extinguem pela perda do habitat, das fontes de alimentação e de água. A cegueira e o sonambulismo anestesiam os consumidores, cada dia mais vorazes para ter mais e mais. Frente a essa anunciada catástrofe que atingirá a natureza, é animador ouvir milhares e milhares de jovens a bradar a declaração universal de uma emergência climática e pedem um novo olhar verde sobre o planeta. Sim, há esperança!

 (Nota: Ecossociologia é a observação crítica das relações entre todos os seres interdependentes da biodiversidade que habitam a mesma casa planetária.) WA: 9 9981 2807 -  Blog  eugeobservador

28.6.2020