segunda-feira, 22 de abril de 2019

BRASÍLIA AOS 59 ANOS


BRASÍLIA AOS 59 ANOS ( Artigo não publicado pelo Correio Braziliense)


Eugênio Giovenardi, sociólogo e escritor, membro da Academia de Letras do Brasil e do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal.

“A única defesa para Brasília está na preservação do seu Plano Piloto. [...] Considero indispensável uma barreira às arremetidas demolidoras que já se anunciam vigorosas” (Bilhete de Juscelino Kubitschek, em 15.6.1960, a Rodrigo de Mello Franco de Almeida, Presidente do IPHAN).

Brasília ainda é administrável?
Aos 59 anos, Brasília dá sinais de cansaço. Clama por carinho humano dos cidadãos e dos administradores públicos. O Projeto Piloto de Lucio Costa com suas quatro escalas: residencial, gregária, monumental e bucólica ficou confinado nos limites da área que acolheu os serviços burocráticos do Estado. A nova capital foi concebida para plantar um novo país no coração geográfico do Brasil.
A concepção das superquadras, dos clubes de vizinhança e de convivência, das escolas localizadas ao pé das crianças, do gabarito modesto de seis andares que respeitam os horizontes, da concentração dos serviços públicos, da amplidão dos espaços sob um céu generoso, das amplas e arejadas avenidas, não foi além da área privilegiada do Plano Piloto. Nunca chegou nem chegará às cidades satélites transformadas em aviários humanos ou dormitórios de servidores públicos ou trabalhadores de empresas centralizadas na área do Plano Piloto. Fora dos limites do Projeto Lucio Costa, Brasília se “ordinarizou”.
A migração desenfreada, nesse meio século, surpreendeu os administradores, arquitetos, engenheiros e planificadores. A capacidade instalada para administrar grandes populações naufragou diante da ocupação de centenas de milhares de pessoas que acudiam ao Planalto Central. Ocupamos cegamente os espaços
Aos 59 anos, Brasília recebe, anualmente, 40 mil novos habitantes e abriga, hoje, mais de três milhões de pessoas, acolitadas por um milhão e oitocentos mil automóveis. O carro particular impôs à cidade um desenho dominado por avenidas, viadutos, retornos, pontes. Interditaram-se os caminhos de pedestres. Até o Parque da Cidade se transformou em pistas de corrida, diferentemente do Jardim de Luxemburgo e outros pelo mundo.
A amplidão dos espaços concebidos sugeria um modelo de transporte moderno, universalizado, rápido, capaz de unir todos os pontos habitados ao mercado dos serviços públicos. O transporte público poderia ser complementado por ciclovias.  Embora se tenha dado importância ao tráfego de bicicletas, as ciclovias oferecidas têm sérios obstáculos para a mobilização de cidadãos, interrompidas por longos trechos e com travessias de risco e mal sinalizadas.
Uma cidade (urbs) não é apenas um conjunto imobiliário, ainda que arquitetonicamente belo, majestoso e empolgante. A civitas é uma praça de convivência de seres inteligentes, (ágora para os atenienses) onde as pessoas se encontram, dialogam, discutem, trocam, propõem e expõem suas riquezas interiores, seus pensamentos, seus sentimentos, sua vida.
A cidade deve ser um elo entre as pessoas, as árvores, os pássaros, os animais, todos hóspedes do mesmo bioma. O bioma Cerrado, no qual foi plantada a nova capital do país, foi furiosamente atacado pela violência imobiliária, pela desídia administrativa, pela ignorância coletiva. Atrasamos, ou quase impedimos o desenvolvimento das energias regenerativas do Cerrado. A regeneração vegetal, a volta de espécies da fauna, os pássaros e insetos polinizadores que contribuem para o reflorestamento precisam de décadas de paciência e silêncio para  restabelecer o sistema da biodiversidade. O tempo da natureza não é o tempo do relógio econômico da exploração das riquezas naturais. A ocupação criminosa dos espaços nativos torna extremamente difícil, senão impossível, a regeneração do bioma Cerrado.
É motivo de esperança que, em vários países, os jovens compreenderam que é preciso ter um novo olhar sobre a natureza.  Em preparação aos 60 anos de Brasília, é importante que toda a população brasiliense, estimulada pelos jovens, pressione fortemente os planejadores, os administradores e representantes legislativos dos cidadãos a propor e realizar ações que favoreçam, nos próximos 50 anos, a regeneração necessária do Cerrado do Distrito Federal para sobrepor-se ao deserto urbano.


21.4.2019

quarta-feira, 10 de abril de 2019

INUNDAÇÕES 2019


INUNDAÇÕES 2019

FOTO:  SÍTIO DAS NEVES (DF) PODE SER UM EXEMPLO DE PRESERVAÇÃO DO ECOSSISTEMA CERRADO.(Eugênio Giovenardi - Córrego da Mata Azul)

As inundações que afetaram a população do Rio de Janeiro, São Paulo, Teresina, e outras centenas de cidades, têm sábias e científicas explicações e poucas soluções.
Não há notícias de que, nas RESERVAS INDÍGENAS e em áreas de proteção vegetal, as águas da chuva tenham agredido a biodiversidade do ambiente preservado.
O volume de águas que cai sobre as grandes e desorganizadas cidades do Brasil de hoje é o mesmo, gota mais gota menos, desde 1500. A diferença é que as florestas detinham grande parte dos milhões de metros cúbicos que as nuvens despejavam sobre elas. A marca visível da pegada ecológica tem 500 anos.
PRIMEIRO, o aumento das populações urbanas; SEGUNDO, a devastação ocasionada pela ocupação do espaço contra todas as regras e normas mais elementares de proteção dos ecossistemas; TERCEIRO, imensas áreas desmatadas, ao longo e largo do pais, para produção de alimentos vegetais e animais são as causas mais evidentes da alteração do rumo das águas em direção ao mar.
As perspectivas de solução para os próximos anos poderão ser positivas, se esses três pilares forem simultaneamente administrados em nome da preservação da vida, isto é, da biodiversidade da qual a população humana faz parte.

10.4.2019