terça-feira, 31 de março de 2020

CARTAS DA PRISÃO - CIÊNCIA PREVENTIVA

CARTAS DA PRISÃO
AMIGOS, tendo vivido mais de 85 anos, acertado e errado, observado, olhado, visto, ouvido e, agora, isolado em casa pela força de um vírus, percebo que o homo sapiens, ainda não alcançou a era da ciência preventiva. Fez, sim, importantes avanços tecnológicos na ciência curativa de males que afetam os seres vivos, do cérebro aos pés, das folhas às raízes.
Penso que a ciência preventiva se origina da percepção profunda da natureza das coisas (Lucrécio). É a fase do conhecimento da vida que perpassa todos os seres vivos. É na relação de interdependência de todos os seres, como uma grande família, que está o segredo misterioso da vida. Compreender a natureza das coisas é conhecimento, não tecnologia.
A ciência curativa de males físicos, psíquicos ou sociais usa tecnologia experimental para obter resultados matemáticos e estatísticos, positivos ou negativos. Ao insistir apenas na ciência curativa, o homo sapiens chegará sempre atrasado e surpreendido com o misterioso comportamento da vida vegetal e animal.
A natureza das coisas é a pedra fundamental da ciência preventiva, do conhecimento e da aceitação do mistério da vida.
Por enquanto, lavem bem as mãos e fiquem em casa.
Nas águas do riacho lavo as mãos e molho os pés (Foto: Eugenio Giovenardi

domingo, 29 de março de 2020

CARTAS DA PRISÃO -VAL - DIARISTA

CARTAS DA PRISÃO





Amigos, leio que há 60 mil trabalhadores domésticos no DF, com e sem carteira assinada. Prestam serviços às classes alta e média. A medida é pagar para não morrer. Val, nossa diarista, é aconselhada a não vir prestar seu trabalho de profissional da limpeza em nossa casa. Pois, não venha, Val. Você poderia trazer o vírus fatal aos dois velhos da fila de espera, pois somos do grupo de risco, da linha de frente dessa guerra declarada. Você perderá os 200 reais da quarta-feira se cairmos na batalha. Combinemos assim: Nós lhe pagamos a diária, via banco, para não morrer. Para alguma coisa humana, sensata e salvadora serve a rede eletrônica de comunicação. Descanse na quarta-feira, Val. Cuide de sua diabetes, de sua perigosa pressão sanguínea, de suas dores lombares e de seu filho Leandro.  Nesta guerra, estamos todos na linha de frente, estamos todos no grupo de risco e na fila de espera.  Quando voltar a paz, todas as luzes se acenderão e todas as portas se abrirão. Até lá, Val!



quinta-feira, 26 de março de 2020

CARTAS DA PRISÃO - RACHEL CARSON

CARTAS DA PRISÃO
Querida RACHEL CARSON,
Obrigado por tua carta Silent Spring. Escrevo-te à sombra de um jatobá. Informo-te que o novo Coronavírus19 se manifestou no esplendor da primavera silenciosa do Hemisfério Norte, ao lado das cerejeiras floridas e no meio da brotação nova das árvores. A primavera silenciosa virou um furacão pandemônico desconhecido. Estamos tão longe da natureza (cientistas e economistas) que pouco sabemos dela, como funciona, quando e por quê. Não damos atenção à interdependência dos seres vivos e acreditamos que a espécie humana seja um ente independente. Se o vírus vivo veio do morcego, do tatu ou da girafa, ele nasceu do mesmo tronco vital do homo sapiens. É nosso hóspede. Por que ele mata a espécie humana? O que ignoramos, por não conhecer a natureza, em seu profundo silêncio, é a inter-relação e interdependência de todos os seres vivos. Por isso, o tomamos como inimigo. Ainda estamos na fase embrionária dos remédios e das vacinas. A imprevisibilidade dos incalculáveis efeitos dessa constante e ininterrupta interdependência dos seres vivos deveria nos aproximar humildemente da primavera silenciosa da natureza para compreendê-la. Transmito aos que gozam de liberdade de pensar o que escreveste em 1962: ”Nessa hoje universal contaminação do ambiente, os produtos químicos são os parceiros sinistros e pouco reconhecidos da radiação na mudança da própria natureza do mundo – a natureza da própria vida.”
Foto: Orquídeas à sombra da pitangueira, Sítio das Neves,

quarta-feira, 25 de março de 2020

CARTAS DA PRISÃO - DIA DE VISITA POR APLICATIVO


CARTAS DA PRISÃO

Amigos,
Dia de visita, por aplicativo, aos isolados sociais.
Minha neta Luiza, via WA:
- Vovô, está precisando de alguma coisa, algum produto de supermercado?
- Oi, Luiza! Obrigado pela atenção. Não é urgente, mas se puder, antes do meio-dia, meia-dúzia de tomates e um pacote de batatinhas.
- E a vovó não precisa nada? O jornal?
- Ah, sim! Um pacote de granola. O jornal é entregue pelo CB.
- Manteiga, leite, pão, não precisam?
- Não, obrigado, por enquanto. Ah! Vou deixar, no lado de fora da porta do apartamento, alface, cebolinha e ovos frescos que trouxe do Sítio para vocês. E a sacola do lixo, por favor, levar ao contêiner.
- Legal! Telefono do carro, depois de deixar as compras na porta e pegar a alface e o lixo.
- Obrigado! Depois a gente se vê pela chamada de vídeo. Opa, esqueci-me de dizer que o saruê voltou a dormir na janela de nosso quarto, esta noite, Há dias não aparecia.
Pelo Cobogó, vi o carro de Luiza indo embora.

24.3.2020

CARTAS DA PRISÃO - LUCRÉCIO


CARTAS DA PRISÃO

Meus amigos,
Um silêncio de fim de tarde pelos corredores. Todos os detentos mudos. Sentado num banco tosco está Tito Lucrécio Caro. Traz no colo um pergaminho com a Carta de Epicuro a Meneceu sobre a felicidade. Felicidade como objetivo de toda a ordenação do universo. Epicuro morrera há 300 anos, mas o epicurismo rondava a juventude romana. Dois mil anos depois, Lucrécio me acorda com seu poema epicurista dirigido a Vênus, patrona de Roma: De rerum natura. A natureza das coisas. Permanecendo apenas nas coisas da natureza, em seus fenômenos imprevisíveis, em suas mensagens esotéricas, cai-se no precipício das superstições. Ao contrario, a natureza das coisas é a realidade simples. Há que descobri-la, compreendê-la, aceitá-la. A natureza é viva, se move, se modifica, nos dá o prazer do movimento. As coisas da natureza, a serenidade das árvores, o murmúrio das águas, a luz das estrelas nos dão o prazer do repouso. Lucrécio me ensinou o caminho das árvores. As árvores me levaram ao olho d’água.
Hoje é o Dia Mundial (universal) da Água. Fui visitar o olho d’água. O buriti nasceu nas pálpebras do olho d’água.

22.3.2020

sexta-feira, 20 de março de 2020

CARTAS DA PRISÃO - GALILEU


A grandeza serena das árvores. (Foto: Eugênio Giovenardi)

CARTAS DA PRISÃO - GALILEU
AMIGOS,
Encontrei GALILEU (1564–1642), confinado num dos corredores da casa. Amavelmente, mostrou-me que “o livro da natureza está escrito em caracteres matemáticos” e que “sem um conhecimento dos mesmos, os homens não poderão compreendê-lo”.  Ouvindo-o, compreendi que os fenômenos naturais têm sua lógica e há que identificá-la e descobrir sua regularidade matemática. Ousou contradizer teólogos escolásticos e Aristóteles. Percebi, de suas explicações, que a vida de qualquer ser é um ecossistema capaz de sobreviver por tempo indeterminado e se reproduzir. Que os ecossistemas vivos trazem consigo a fatalidade da morte comandada por um sistema de predação que controla a expansão da biodiversidade. O leão sobrevive comendo o cordeiro, não o elefante. O predador V19 sobrevive instalando-se em vidas menos resistentes. O predador é quem decide e obriga as vítimas a se defenderem. O V19 matou, esvaziou ruas, shoppings, teatros, parques. Contrariou a Constituição Nacional, as leis trabalhistas, quebrou as bolsas!!! O planeta respira um silêncio reparador. As árvores cantam alegres.. O planeta entrou em retiro espiritual, propício ao pensar, à reflexão do Grande Predador – HOMO SAPIENS – para  compreender os fenômenos naturais e descobrir-lhes a regularidade matemática. GALILEU, de olhos cerrados pela cegueira, serenamente, com um sorriso irônico, lembrando Copernico, repetiu-me: EPPUR SE MUOVE.


CARTAS DA PRISÃO - SÓCRATES


CARTAS DA PRISÃO

Na Ágora de Atenas, 399 a.C.
BOM-DIA, SÓCRATES!
- Minha solidariedade. Também penso que “os deuses não velam com especial solicitude pelo nosso mundo”.  Ao tomar a cicuta,  disseste que “ias encontrar a verdade no outro lado da vida ou da morte”. Que me aconselhas para os dias de prisão preventiva?
- “Conheça-te a ti mesmo”, detento preferencial.
- É difícil aceitar-se. Sabes, Sócrates, que me pareço contigo. Xenofonte disse que tu “nunca saíste de uma honesta mediocridade. Não foste nem grande militar, nem grande agricultor, nem grande historiador, nem grande filósofo.” Sócrates, andaste por toda a Atenas, tocando lira e recitando versos de Homero, a perguntar aos jovens e aos velhos sobre tantas questões. Por quê?
- “Porque sei que nada sei! A ignorância é o ponto de partida”.

19.3.2020

quinta-feira, 19 de março de 2020

CARTAS DA PRISÃO - EPICURO

CARTAS DA PRISÃO
Meus amigos,
Estou em prisão domiciliar por ter cometido o crime de me apoderar irresponsavelmente de 85 verões. Minha delação não foi premiada. Andando pelo cárcere, encontrei muitas centenas de condenados. Um deles é o velho EPICURO, paralisado. Disse-me, ao olhá-lo com simpatia: “Há duas espécies de prazer: o prazer de movimento e o prazer de repouso. O terror do destino e da morte não mais poderá atormentar quem reconheceu como verdadeira a física dos átomos”. Sentamos à beira da janela. Tomamos umas taças de vinho bordô saudando o prazer de movimento, O prazer do repouso logo veio. Amanhã visitarei Sócrates.
Em casa, com Epicuro.

segunda-feira, 9 de março de 2020

ÁRVORES MUTILADAS.

ÁRVORES MUTILADAS.


ESTARRECIDO, DIANTE DELAS,
QUISERA SER
Quisera ser a casca
Da árvore antiga
Ser a seiva que alimenta
Ser o cerne que resiste
Ser a folha que acena
Ser os galhos que olham
Para o nascente e o poente
Ser a copa verde-escura
Banhada pelo Sol e pela chuva
Ser as flores e os frutos
Que acolhem generosos
Com leal hospitalidade
Os peregrinos do ar, da terra e mar.
Quisera ser a sombra amiga
Da silenciosa árvore antiga.

quarta-feira, 4 de março de 2020


CHUVAS DE FEVEREIROS  – ANOS  2013 a 2020–

    EM MILÍMETROS – 1 mm = 1 litro/m2
                   FEVEREIROS                    ANOS
2013 -                 132.7                  >       2.255,6
2014 -                 173.0                  >       1.677,5
2015 -                 292.2                  >       1.642,7
2016 -                 288.0                  >       1.921,7
2017 -                 203.8                  >       1.478,7
2018 -                 115.5                  >       1.760,5
2019 -                 358.7                  >       1.068,7
2020 -                 276.4                            ???????

2020 já recebeu 628,8 mm ou 628,8 litros de água por metro quadrado, na área d microbacia do Ribeirão das Lajes, Janeiro de 2020 superou a média dos meses (235.0 mm) em 41,4 mm, com precipitações irregulares, localizadas e esparsas durante o mês.
A área em regeneração de 700.000 m2 (70 ha) do Sítio das Neves recebeu, gratuitamente, em janeiro, 193.480.000 litros de água da chuva (193,48 mil metros3).  Graças à vegetação intensa, três quartos desse volume ficaram retidos nas árvores e no solo, propiciando melhor  recarga dos aquíferos subterrâneos. As águas restantes correram limpas córrego abaixo.
Houve áreas, como a Bacia do Paranoá, com volumes acima da média (mais de 500mm). Infelizmente, a maior parte dessa água caiu sobre áreas impermeabilizadas sem chegar aos aquíferos subterrâneos. Essa é a diferença entre arborização e impermeabilização. Impedimos as águas de cima a se comunicarem com as águas subterrâneas.
As inundações no Sudeste e da Estrutural (DF) mostram a irregularidade das chuvas, o descaso com as áreas verdes protetoras e a agressão ao ambiente pela urbanização desrespeitosa e sem previsão e aceitação das mudanças climáticas. Há uma solução regenerativa que ameniza essa irregularidade: ARBORIZAÇAO E RESPEITO AOS CURSOS DOS RIOS E CÓRREGOS. A urbanização intensa, com negligência das autoridades e com a pressão habitacional, destrói encostas, desvia o curso dos rios, sem dar espaço suficiente aos fenômenos físicos. Para o Distrito Federal, com o acréscimo de mais de 40 mil habitantes por anos, algo mais tem que ser feito além de viadutos, novos bairros, (Urbitá e Quadras 500), água poluída bombeada do Corumbá IV, aumento da tubulação, ou desvio de água de uma represa a outra. Há que se olhar um pouco além do nariz. Mirar os anos 2060 e oferecer segurança hídrica aos milhões de habitantes que sobreviverão, em Brasília, nas próximas décadas. A degradação do ecossistema de forma contínua cobrará muito sofrimento aos nossos descendentes.

Fonte: PLUVIÔMETRO/ANA/ SÍTIO DAS NEVES, BR-060, KM 26, destinado a medir a precipitação regional de parte da bacia do Descoberto e seus afluentes no DF.

Foto – Eugênio Giovenardi, Área regenerada, Sítio das Neves,
BR 060 km 26,