quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

CRIANÇA DA NOVA ECONOMIA



Lembro-me da longínqua infância, meus oito anos. Sentados à mesa, disputávamos, os cinco irmãos, a parte da galinha assada que jazia na travessa. A gravidez de minha mãe anunciava outro competidor na batalha da distribuição de asas e coxas, e um lugar à mesa. Nossos parcos presentes, ao nascer, eram fraldas de pano costuradas na velha Singer e, mais adiante, uma boneca de pano para as meninas, umas bolinhas de gude para os meninos. Um cabo de vassoura servia de cavalo xucro. Éramos crianças econômicas. Tínhamos casa, roupa, calçado e comida. Íamos à escola com a mesma devoção obrigatória de ouvir missa aos domingos. Os meninos mais avançados e modernos se distinguiam por ter um canivete de duas lâminas.
Meu sonho, aos nove anos, era ter um par de botas para as lides da Charqueada e montar a cavalo. Tudo o mais era dádiva da natureza. A água vinha do poço, puxada no balde. A caldeira do fogão a lenha esquentava a água do banho. O galinheiro abastecia de ovos a cozinha e a panela do risoto. A horta e o pomar nos brindavam com frutas e legumes frescos.
Nos tempos modernos, a criança nasce exigindo do poder publico 200 litros/dia de água encanada, luz elétrica e coleta de lixo. Previne a comunidade, antes da chegada, para recolher fraldas, chocalhos, mamadeiras, pijamas, penduricalhos de música no berço. Anuncia, aos berros, que precisará de um automóvel, um celular, um laptop, um tablet, uma bicicleta, uma excursão a Disney, uma prancha de surf.
Hoje, a criança nasce consumidora voraz para tornar-se milionária com emprego garantido na câmara ou no senado, na Petrobrás, no Tribunal de Contas ou na Receita Federal. Seus amiguinhos de infância estão na telinha da TV cujos nomes ela aprende já aos doze meses. Sai da TV e entra do Facebook, no Orkut, no Twitter, fala com todo o mundo, conhece todos os segredos e fofocas, sabe que Luiza esteve no Canadá. O cidadão atual é um eleitor virtual. Mora num país é virtual. Os governos são virtuais. A antiga verdade é virtual. Apenas as mentiras são reais transformadas em virtudes.

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EXTRAVAGÂNCIAS DIÁRIAS

São tantas as provocações no embate diário das extravagâncias humanas que um cronista se perde no tiroteio. Há cenas divertidas como a gangorra do sai-não-sai de ministros ou a surpreendente notícia de que Luiza esteve no Canadá.
Há cenas trágicas como as mortes na porta de hospitais por não ter o paciente o talão de cheques para garantir a vida. Ou as mortes nas rodovias provocadas por cidadãos bêbados.
Cenas dramáticas de pacientes que esperam a doação de um rim, um fígado ou um coração. Desejam eles a morte de uma criança, de um jovem tresloucado na direção de um automóvel?
De quem seriam estas últimas palavras: em que peito desconhecido palpitará meu coração? Será num corpo de homem ou de mulher? Que diferença fará para o coração? Amará como eu amei?
E o novo portador dirá ao amado ou à amada: eu te amo com a mesma fúria do antigo dono! Como se sentirá o novo anfitrião amando com coração alheio?
Assim como um enxerto modifica a forma da planta e o sabor do fruto, corações de crianças inocentes num corpo adulto podem oferecer alguma esperança à paz mundial e à honestidade pública.
Impossível é passar indiferente diante destes cenários humanos tão recheados de excentricidades onde os palhaços vestidos de terno e gravata tomam conta do circo.

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terça-feira, 24 de janeiro de 2012

ÁGUA EM 2040 NO DF

Vista do Manancial do Pipiripau, Distrito Federal, ameaçado de extinção.

Acompanhei, durante duas horas e meia, no Conselho de Recursos Hídricos, do Distrito Federal, uma detalhada exposição de cenários que antecipam a realidade de oferta de água em 2040. Sobrevoei a plateia com o olhar e concluí que metade dos presentes não estará, nessa data, para comprovar as profecias dos cenários apresentados. E como sobreviverá a outra metade é problema dela.

O expositor impressionou a atenta assistência com números, gráficos, curvas, colunas em variadas cores. As imagens apareciam e desapareciam, magicamente, mostrando que a base da oferta de água dependeria de cenários de crescimento econômico nacional e internacional, acelerado, moderado, retraído. O PIB, evidentemente, será o general a comandar as forças econômicas, os investimentos e o consumo que determinarão maior ou menor oferta de água. A função divina do PIB é transformar toda a obra humana em um percentual.

Na lógica pibeana, água escassa será mais cara e mais difícil de comprá-la. Daí a necessidade de uma “estratégia de gestão hídrica” consolidada num plano institucional integrado para chegar ao ano 2040 com falta de água, mas bem gerenciada. Esse plano terá o suporte de leis, regulamentos, normas de controle, fiscalização, um forte ingrediente educativo, instituições especializadas, profissionais ligados a redes e satélites para coordenar a guerra da oferta e demanda de água. Hoje, existe uma orquestra institucional tocada por uma dezena de instrumentos desafinados, com partituras incompletas e sem maestro. Todos, porém, querem tocar sua parte institucional sem ouvir os do lado, nem olhar para o maestro e, menos ainda, para as reações da plateia distraída que manda, como na sala Villa Lobos, mensagens pelo Iphone.

Em se tratando de água, sabe-se que a quantidade existente no planeta é a mesma desde milhões de anos. O que varia é o número de consumidores humanos, vegetais e animais. O cenário é simples: temos um volume fixo de água, nem sempre no local desejado, e uma quantidade variável de consumidores. A água disponível no DF, por exemplo, é a mesma de 1960, quando Brasília foi inaugurada, com 140 mil habitantes, e a de 2012, com uma população de 2,6 milhões de pessoas.

Estima-se que, em 2040, haverá uma população humana de 6 milhões. A oferta de água não se altera. Apenas que terá que ser canalizada de muito longe. A projeção do consumo é aritmética. Passa-se de um consumo, hoje, de 520 milhões de litros/dia para 1 bilhão e 200 milhões em 2040 (consumo per capita de 200 litros/dia). Essa demanda é apenas de consumo humano, isto é, o uso diário das pessoas. O comércio, a indústria e a agricultura têm suas demandas setoriais.

A pergunta, então, é: quem vai ficar sem água? Os humanos, os vegetais, os animais? Como reagirão eles à falta de água? Salta aos olhos que o cenário demográfico, nas três dimensões, é mais importante do que cenários macroeconômicos. Populações menores pressionam menos a economia e gasta menos água. Quem se importa com o cenário demográfico em três dimensões?

As taxas de fertilidade humana vêm caindo, mas isto não impede que a população cresça. E, hoje, vive-se alguns anos a mais. Portanto, se gasta mais água. Nos cenários apresentados pelo competente expositor, ficou claro que, em 2040, a água estará escassa e não alcançará democraticamente a todos.

Estranhei que nas medidas aventadas para gerenciar os “recursos hídricos” não se mencionasse a captação de águas da chuva que, atualmente, têm sido abundantes. A civilização Zenú, nos Andes colombianos, alguns séculos antes da imigração europeia à América do Sul, captava as águas nas cheias do rio Madalena, nas áreas planas, por meio de canais em forma de espinha de peixe. Os japoneses recolhem em galerias subterrâneas as imensas águas que caem sobre Tóquio em volume mil vezes superior às que inundam Minas e São Paulo.

Em vez de captação de águas pluviais, os sobreviventes de 2040 terão que preparar-se para o racionamento diário associado ao custo implacável da água. Por essas falhas no planejamento demográfico humano e pelo consequente aumento da população animal destinada a suprir a população de proteína é que será quase impossível deter a invasão da Amazônia e do Cerrado. Em consequência, a expansão de áreas de desertos rurais e urbanos torna ainda mais difícil o suprimento de água.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

OÁSIS PRODUTIVOS



Na vivência de quase quarenta anos, numa área de cerrado original, acumulei experiências úteis tanto para produzir alimentos quanto para preservar a natureza integrando-me nela. O segredo para construir o que chamo de oásis produtivos é alcançar um equilíbrio congruente e previsível das distintas energias e forças da natureza que atuam sobre um espaço físico.

As energias e forças não são lineares. Em consequência, o equilíbrio depende da organização lenta dos diversos elementos que se combinam assimetricamente obedecendo à complexidade e ação constante das leis físicas. Os fenômenos físicos se manifestam incontrolavelmente segundo tempos e regiões. E é para eles que deve apontar a observação permanente, ao longo dos anos.

A tendência do ser humano na luta pela sobrevivência é transformar pragmaticamente a complexidade da manifestação das energias e forças da natureza em linearidade com artifícios técnicos. Essa tentativa torna a linearidade tão ou mais complexa do que a complexidade das forças e energias naturais. Tão complexa que embaraça o caminhar dos humanos em sua busca de soluções técnicas e tecnológicas a problemas por eles criados.

Nessa inversão da canalização de forças e energias naturais reside a origem do desequilíbrio ecológico e ambiental. A forma rudimentar de produção agrícola, na qual o fogo é um auxiliar primitivo e arrasador, ou o uso de alta tecnologia por meio de máquinas, fertilizantes químicos e defensivos tóxicos de efeitos prolongados, ambos produzem desequilíbrios difíceis de corrigir.

A linearidade das práticas produtivas e de ocupação do solo está substituindo gradativa e perigosamente a complexidade da organização natural. Ela impõe agressivos mecanismos na exploração de elementos necessários à produção de alimentos e o uso abusivo de riquezas disponíveis à sobrevivência, ao conforto e à convivência humana.

Para administrar o rompimento da complexidade das forças e energias naturais, a criatividade da inteligência humana recorre a truques e fórmulas técnicas e tecnológicas cada dia mais apuradas sem, no entanto, alcançar o desejado equilíbrio rompido. É palpável o conflito atual entre a filosofia tecnológica de que é possível resolver problemas e situações criadas pelo desequilíbrio no funcionamento complexo das forças e energias naturais e a filosofia ecológica da interdependência de todos os seres vivos em igualdade de condições. Este confronto requer pelo menos a revisão cuidadosa da rota seguida, se não uma corajosa mudança de rumo. Não se trata de uma visão catastrófica em curto prazo e, sim, da impossibilidade de incluir a humanidade inteira, disseminada em distintas regiões do globo, nessa estratégia suicida de contornar o desequilíbrio apenas com alta tecnologia teoricamente democratizada.

A desigualdade dentro de países, de regiões e no contexto global, fruto da desinteligência relativa ao funcionamento das leis naturais, aguça o desequilíbrio e produz o impasse atual em aspectos financeiros, econômicos, políticos e ecoambientais.

A formação de oásis produtivos em pequenos ou grandes espaços físicos, no meio rural ou urbano, pode ser uma forma de minimizar os desequilíbrios ocasionados pela pegada humana. O principio básico assenta na observação cuidadosa do funcionamento, da relação e do comportamento sazonal das energias e forças que compõem a complexidade dos elementos naturais. Água proveniente das chuvas ou de nascentes (mananciais), ventos, luminosidade, altitude (montanhas e vales), variedade da vegetação (frutífera e madeireira), fauna (aves, animais silvestres, insetos), são elementos que, com o ser humano, formam a cadeia de interdependência imprescindível para a continuidade da vida no planeta. O rompimento da corrente de interdependência, seja pelo desmatamento programado para produção agrícola, seja pela construção de barragens e desvio de cursos naturais de água ou pela urbanização não planejada, causa inundações nas cidades, perda irreparável de espécies de vegetação, da fauna e de seres humanos. A recomposição do equilíbrio, nestas circunstâncias, nem sempre é possível, se não impossível.

O desequilíbrio ambiental, muitas vezes não seguido de desequilíbrio ecológico, causado por fenômenos naturais, tem capacidade intrínseca para se recompor ao longo do tempo. Os tempos da natureza nem sempre coincidem com os tempos das necessidades e interesses humanos. Metas impostas para justificar programas políticos e econômicos nem sempre respeitam o tempo necessário para a recomposição do equilíbrio ambiental. Secas e inundações, na maior parte desses eventos, ocorrem em espaços naturais modificados pela mão humana. São denominados equivocadamente “desastres naturais”. Na verdade, são fenômenos naturais conhecidos e previsíveis que se manifestam com forças incontroláveis. Podem alagar planícies, derrubar árvores, matar pessoas e animais, cujas consequências atingem todas as formas de vida em seu caminho. Se este caminho foi, de alguma forma, interrompido pela mão humana, as forças e as energias contidas nos elementos como água e vento encontram situações favoráveis para multiplicar sua velocidade e capacidade destrutiva para arrastar com violência os obstáculos que se lhes antepõem.

Terremotos, vulcões, maremotos, tempestades, tufões, tornados, ventanias ou períodos de seca são fenômenos naturais incontroláveis com os quais as espécies vivas têm que aprender a conviver. A ocupação humana dos espaços de campos e florestas para a produção de alimentos (cereais, animais domésticos) ou para a urbanização provoca a formação de imensos desertos, cenário propício para a manifestação descontrolada dos fenômenos naturais.

As florestas foram substituídas por vegetação rasteira ou por cidades e rodovias, ocasionando mudanças nos cursos dos rios e canais de esgotamento das águas pluviais, na direção e contenção dos ventos. O desconhecimento e a imprevidência dos efeitos e impactos da expansão e da pegada demográfica sobre vales e montanhas recebem em troca a cobrança pelo choque da natureza, suas forças e energias liberadas sobre o ser humano e suas obras.

Trata-se, então, simplesmente, de recuperação de espaços perdidos à invasão descuidada das pessoas em áreas necessárias à manifestação dos fenômenos naturais. A natureza devolve o impacto causado sobre ela com intensidade e força multiplicadas por anos de agressão.

É sensato constatar que a recuperação do equilíbrio perturbado pela manifestação incontrolável dos fenômenos naturais – erupção vulcânica, terremoto, tornado – toma anos ou séculos. E, com a volta do equilíbrio natural, as circunstâncias não serão exatamente as mesmas de outrora. Vidas se perderam, rios mudaram de curso, montanhas deslocaram-se. O equilíbrio reclama uma readaptação das espécies vivas. Um novo ciclo de interdependência se inicia para a continuidade da vida no planeta. Quando a ação dos fenômenos naturais atinge as obras humanas, seja em seus campos de produção de alimentos e exploração das riquezas disponíveis, seja no conjunto cultural de seus agrupamentos urbanos, a recomposição do equilíbrio costuma sugerir inovações, mudança de hábitos, revisão da arquitetura, abandono de locais, deslocamento provisório ou definitivo dos habitantes para áreas mais seguras e/ou reestudo das formas de ocupação do solo.

O descuido com o funcionamento implacável das leis físicas que atinge com mais frequência, hoje, a obra humana, induz à reflexão sobre as relações entre o ser humano e a natureza. Truques, aparentemente inteligentes, com artifícios técnicos ou tecnológicos, pragmáticos e funcionais em busca de resultados imediatos para desfrutar os poucos anos da curta vida nem sempre são aprovados, aceitos e respeitados pela manifestação explosiva dos fenômenos naturais.

As circunstâncias tendem a se agravar quando a displicência desrespeita os espaços necessários à manifestação desses fenômenos naturais, muitos deles previsíveis no tempo e na intensidade. 

Oásis é uma pequena região que conjuga um afloramento de água com fertilidade do solo. A vegetação que se forma ao redor do manancial, ao longo de séculos, fertiliza o solo, favorecendo a prática agrícola em escala reduzida ao oásis. O essencial, portanto, é a água.

São famosos os oásis de Awjila, Ghadames e Kufra, na Líbia, pontos vitais para as rotas Sul/Norte e Leste/Oeste, no deserto. Para esses oásis eram degradados os criminosos do império romano. A previdência dos nômades e caravanas do deserto preserva os oásis durante séculos como garantia de sobrevivência na travessia.

Oásis é sinônimo de esperança, de sobrevivência e de vida. Sua perenidade depende da água, das plantas nativas e da consequente fertilização formando um sistema de interdependência ininterrupta desses elementos. A preservação desse conjunto simples de fatores possibilita o desfrute permanente da ocupação e uso do solo para satisfazer às necessidades humanas. O risco de extinção do oásis consiste em substituir a complexidade natural desses elementos integrados por uma complexidade artificial. Ao invés de adaptar-se com sabedoria à natureza, a aventura humana prefere, muitas vezes, adaptar a natureza a seus interesses com artifícios tecnológicos. Até onde e até quando essa inversão se sustenta é uma questão que pertence ao tempo, aos séculos, aos milênios.

As observações acumuladas nesses quarenta anos, numa pequena ilha de cerrado no Planalto Central, dão-me algumas indicações para sugerir a formação de oásis produtivos no meio rural ou urbano. Ao mencionar oásis produtivos não significa necessariamente cultivar o solo para extrair algum produto.

O elemento essencial e vital da existência e preservação do oásis, vale insistir, é a água. A vida depende dela. Em regiões de chuvas regulares, com duas ou quatro estações, mesmo com incidências de períodos mais secos ou mais chuvosos, o primeiro cuidado será preservar a água. A água não é um bem privado. É um bem público, universal. A preservação de mananciais e cursos de água é de responsabilidade do Estado como gestor do patrimônio comum, e do cidadão como usuário desse bem vital.

Na vida cotidiana, dá-se maior importância ao uso da água e quase nenhuma à sua captação na estação chuvosa ou à preservação dos mananciais nos períodos de estiagem. “Produzir” água é tão importante quanto usá-la e saber poupá-la.

Para a formação de oásis produtivos, entre outras iniciativas de âmbito público e particular, estão a captação de águas pluviais e o plantio ou preservação de árvores nativas da região, adaptadas ao clima e resistentes às condições adversas de seu hábitat.

Civilizações que antecederam a ocupação europeia da América do Sul, como a Zenu, na Cordilheira Andina da Colômbia, controlaram as cheias do rio Madalena por meio de canais, em forma de espinha de peixe, os quais continham a água e os sedimentos férteis para produzir milho e batas no período seco.

As formas de captação das águas pluviais variam de pequenas barragens (como as que construí em meu Sítio), a grandes galerias no subsolo urbano como em Tóquio. A presença de água na superfície ou a umidade acumulada sob a vegetação impulsionam a diversidade de plantas nativas. Tanto as áreas destinadas à produção de alimentos e à extração controlada de minérios ou as de urbanização precisam ser protegidas por corredores vegetais ou cortinas verdes. Sua função é dupla: captar e guardar parte considerável das águas da chuva e facilitar sua infiltração no solo para recarga dos aquíferos; e transformar carbono em oxigênio. (Uma árvore absorve 2kg de gás carbônico por hora e devolve à atmosfera, no mesmo tempo, 2kg de oxigênio.)

Graças à água, à umidade e aos bosques nativos, estabelecem-se refúgios de pássaros, animais e insetos que encontram alimentação adequada para sua reprodução, assegurando a biodiversidade e a interdependência das espécies vivas. É possível criar condições que garantam equilíbrio aceitável e administrável entre ocupação e utilização do solo, minimizando-se os efeitos mais agressivos da eventual manifestação atípica dos fenômenos naturais.

Em alguns países (Finlândia, Suécia), o equilíbrio entre áreas de ocupação humana, vegetal e animal é garantido com delimitação de espaços para cada um desses agrupamentos. Florestas atravessadas por rodovias e ferrovias, são cercadas por telas para impedir o atropelamento de animais selvagens.

Os oásis produtivos, sejam pequenos ou grandes, sugerem uma nova concepção da ocupação, uso e exploração racional e cuidadosa do solo. Implica tomar em consideração todos os elementos sistêmicos, forças e energias que se combinam para garantir a permanente recomposição do equilíbrio ecoambiental e a relação de interdependência de todos os seres vivos e a própria continuidade da vida no planeta.



Eugênio Giovenardi

domingo, 15 de janeiro de 2012

FELICIDADE VEGETAL


Este pedaço verde de cerrado, que eu chamo de Meu Sítio, enche-me de felicidade vegetal. Estas grandes árvores estendem sobre mim seus galhos formosos, espreguiçam-se para cima e para os lados. Dançam balé ao sopro do vento que passa, beija-as e corre para o sul.
E centenas e centenas de plantas e arbustos, anônimos para mim, trazem-me, em hieróglifos, a história milenar do universo. Elas me contam histórias de mares e vulcões. Um pelotão de bambus disciplinados, eretos, me observa. Todos trazem uma listra verde no corpo amarelo, de cima a baixo.
Um silêncio antigo e sempre novo move-se devagar na sombra espessa destes bosques. Assusta-se ele, aqui e ali, com o pio da jaó, o trinado do sabia, o grito espalhafatoso do joão-de-barro, ou o alerta vigilante do bem-te-vi. Mas, logo volta a se esconder por trás de jatobás, angicos e guapevas.
As árvores me olham, sorriem-me, aceitam-me e me injetam doses longas de felicidade vegetal extraída de seivas clandestinas. É segredo essa felicidade vegetal. É um código que só as árvores decifram. E pedem-me que não dê a senha.
Caminho entre as árvores. Não estou só. Há vidas outras que sugam delas essa felicidade vegetal. As borboletas azuis, em voos desajeitados, mas sublimes, equilibram-se no ar sobre as águas do riacho. Os saguis espicaçam e devoram mangas. Os coatis chupam graciosamente caroços de jaca. Os macacos-prego rompem as duras vagens de jatobá.
A floresta, com milhões de anos de paciência, é um laboratório de energias e variada felicidade. Uma usina de harmonias e melodias, de sinfonias e óperas, de danças e festas.
Nestes bosques, a vida e a morte se abraçam, riem e choram, amanhecem e anoitecem com a mesma despreocupação dos séculos que o tempo engoliu. É dessa milenar felicidade vegetal que é feita a alegria frágil e passageira da alma das pessoas.
Nem sempre me compreendem quando revelo que as árvores têm alma, detêm o código da felicidade, falam e, às vezes, choram.

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BRASÍLIA EM JANEIRO

Um manto de silêncio se estende sobre Brasília ao término do pipocar estonteante de fogos fátuos na virada do ano. A imaginação dos programadores da queima de rojões não vai além desse quase ridículo espetáculo. O barulho do último dia evaporou-se com as luzes cromadas e a fumaça dos fogos.
Janeiro penetrou Brasília com sua calmaria e chuva fina. Avenidas vazias. Semáforos em verde ou vermelho esperando que apareçam os carros que rodam por outras terras. O vazio humano ressalta a presença das árvores. Há tempo para contemplá-las, admirar sua altura, descobrir seus segredos e sentir o perfume de tantas flores. Brasília, em janeiro, volta ao cidadão com sua majestade singela, monumental e bucólica.
A Esplanada dos Ministérios está deserta como uma paisagem esquecida da Lua. Ministros e sua presidente buscaram, em sítios secretos e distantes, o descanso de suas fadigas burocráticas. Fugiram, em tempo, dessas vozes clandestinas e severas que o silêncio emite aos que não sabem ouvi-lo.
Aqueles monumentos brancos e enormes contra o horizonte, onde senadores e deputados tratam de seus interesses particulares fingindo serem públicos, estão vazios e com cheiro de fantasmas. Deles, senadores e deputados, escreveu D. Pedro II em seu diário, há cento e cinquenta anos: “Há muita falta de zelo, e o amor à pátria só é uma palavra – para a maior parte –”.
Brasília encheu-se de verde, de pássaros, de quietude. Pode-se até atravessar a rua pela passagem de pedestres sem medo de ser atropelado. Mesmo no semáforo, tem-se a tentação de desobediência civil, pois não há automóveis à vista quando o bonequinho caminhante está vermelho.
Janeiro entregou Brasília ao cidadão, ao pedestre, ao legítimo dono das ruas. Janeiro vem lembrar a todos que a cidade é para o cidadão de carne e osso. Como é diferente o janeiro de Brasília! Ele nos dá a sensação de estarmos tolerando os poucos automóveis que resistem ao silêncio de janeiro.
Janeiro sabe que, nos outros onze meses, mal o cidadão pedestre é tolerado pelos monstrinhos de rodas que invadem ruas, parques, estacionamentos e os enchem de veneno.
Volto ao diário de D. Pedro II: “...vejo que (no Império) não se fala quase senão em política, que é, as mais das vezes, guerra entre interesses individuais”. Brasília ainda não era, mas, cento e cinquenta anos depois, a realidade é a mesma.
Há que se aproveitar o mês de janeiro. Ele é curto para tanto silêncio espalhado por Brasília. 

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sábado, 14 de janeiro de 2012

A MONTTANHA FERIDA

O poeta gaúcho Daniel Paese restituiu a alma à montanha com estes primorosos versos que o OBSERVADOR oferece aos leitores. As montanhas também choram ao lhe arrancarem a alma.

A MONTANHA FERIDA.



Ali na minha frente
está a enorme montanha
com fisionomia estranha
toda colorida
pelo belo sol da manhã.

Bem ali
ante meus olhos extasiados
está a majestosa montanha
abrigando com cuidado
verdejante floresta
com mil ninhos
canções de pássaros
gritos espantados de ventanias
e segredos
que só as nuvens brancas conhecem.

Quem disse
que as montanhas não falam
não sentem
e não choram?

Claramente escuto
a voz da bela e alta montanha
que senhora de si mesma
proclama aos quatro ventos
que sua idade é de milhões de anos
e sua alegre missão
carregar nos ombros verdes
com alegria e muito suor
florestas
pássaros
ninhos e nuvens.
Um ar de secreta magia
delineia e marca na verde paisagem
a IMAGEM
da misteriosa montanha
que parece viver
em estado de permanente meditação.

Olhando melhor
para a altiva montanha
vejo-a ferida de morte
e suas entranhas expostas
por criminosa cratera
que em mim dói e dilacera!

Pessoas aos milhares passam
e em cúmplice silêncio
contemplam a dolorosa
FERIDA
que mãos assassinas
abriram em seu coração
com brocas de aço
e dentes de ferro.

De nada servem
suas lágrimas e sangue
seus gritos de dor
e seu pranto!

As mãos assassinas
os braços de aço
com nada se comovem
e seguem dia e noite
na arte louca de rasgar
e triturar
as vestes verdes
e a alma da enorme montanha.

Sua dor
seu coração
selvagemente aberto
a ninguém enternece!
Os assassinos
derramaram seu sangue
sujaram seu encantamento
riram de seus gemidos
desprezaram sua dor
e seguiram adiante
com estúpido ar de inocência!

Ao cair da tarde
a silenciosa montanha ferida
de silhueta aflita
geme e chora baixinho
expondo
a todos os viandantes
que por ali passam
seu verde coração rasgado
que desde a criação do mundo
somente conhecera vozes de pássaros
cantos de fontes
afagos de ventos perfumados
e abraços de nuvens passageiras.

Meu coração não entende
os que passam diante de ti
e nem param e nem choram
ao ver-te de coração
aberto e sangrando!
Por que será
que as vozes de tua dor infinita
a ninguém irritam
e se perdem
nos labirintos tristes
do áspero moinho da indiferença?

DANIEL PAESE

Palhoça,l2 de fevereiro 2003-Sc.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

AMIGOS



Pergunto-me, em momentos de súbito emudecer de tudo em volta, no ar, na rua, no horizonte, se tenho amigos e se eles me amam. Amar, isto é, aceitar-me como sou e quantos sou.
Penso nisso porque eu não sou apenas um. Tentei insinuar, em meu frágil romance Silêncio, que sou trezentos e oitenta. Minha dúvida, lógica e metódica, é a de que meus amigos, se houver, não percebam a maior parte de meus eus e me tomem apenas por aquele que é visível.
A indagação gerada por essa dúvida metódica situa-se em saber qual ou quais dos trezentos e oitenta eus foram escolhidos para serem amados. Percebo que nem sempre o eu que gostaria de oferecer aos amigos é o que eles levam consigo. Sobram eus pelo caminho.
E, nesses pensamentos, mesclados de alegrias e tristezas, detenho-me a escutar os gritos que se levantam de todos os lados e pergunto ao eco o que Mario de Andrade sondava:
“Eco, responda bem certo,
Meus amigos me amarão?
E o eco me responde: sim.”

Um amigo a quem amamos é um múltiplo comum. Dividimos e somos divididos.

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quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

MONTANHAS SEM ALMA


Foto, gentileza de leotri.blogspot.com
Amigos, mandem-me um pedaço de alma envolta num poema. Ou numa palavra singela, verdadeira e única. Sinto falta de almas. A humanidade está perdendo a alma dispersa entre as quinquilharias supérfluas. As mensagens que recebo falam de tudo menos da alma de quem as manda. Guardem vivas a ironia, o sarcasmo as farpas. Apontem a displicência e o descaso que se derramam por toda parte. Ponham um pedaço da alma na indignação que parece tomar conta das ruas.
Tenho saudade da alma das pessoas e das coisas, não de palavras da moda impostas por costureiros de inutilidades. Tenho saudade da alma que sorria de graça, que olhava nos olhos.
As grandes águas que arrasam cidades rio abaixo são torrentes de lágrimas das montanhas que perderam a alma. Decepamos, arrancamos, queimamos sem piedade as almas verdes das montanhas, das serranias, dos vales. Levantamos cidades sem alma, sobre o cadáver da terra. As águas turvas que passam por elas em corrida desabalada são torrentes desalmadas à procura da alma das montanhas.
Como as águas que vão e não voltam, as almas verdes das montanhas evaporaram-se. Ao ver pessoas soterradas sob grandes pedras e casas levadas pela corrente desalmada tenho infinita saudade da alma verde das montanhas. Voltarão as almas verdes das montanhas? Alguma coisa que se foi ainda volta neste nosso mundo? Percebo que, sem alma, a humanidade desaba.
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quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

SEXTA POTÊNCIA


O Brasil, pela leitura do PIB (US 2,5 tri), alcançou a posição de sexta potência na soma aritmética do valor de riquezas acumuladas no país. Incluem-se nele os investimentos, o valor das obras e produtos, a poupança, as dívidas a pagar e os roubos ao Erário.
Quantas vidas humanas, animais e vegetais se perderam com a imprevidência da administração pública e privada diante dos fenômenos naturais previsíveis? Não há subtração nem perdas nessa contabilidade do PIB? Ou os desastres, seu custo, os investimentos da reconstrução jogam intencionalmente a favor do PIB?
Em que posição fica o Brasil se forem somadas as irresponsabilidades, a ineficiência administrativa, o descaso, o desvio dos recursos orçamentários, a construção de obras inúteis ou mal-acabadas, seguidas de justificativas cínicas e pífias?
Que dizer de uma administração pública, da Presidente ao prefeito municipal, dos senadores a deputados e vereadores, de ministros dos 38 ministérios a diretores de empresas estatais que não suspeitaram das montanhas peladas pelo desmatamento incapazes de deter as águas da chuva, nem descobriram, em cem anos, que os rios e córregos que atravessam todas as cidades inundadas foram afunilados entre ruas e casas?
Que dizer desses administradores públicos que aprovam projetos de construtoras de rodovias com valores superestimados sem fiscalização e sem olhar para as montanhas desmatadas e para os rios apertados pelo espartilho das cidades desordenadas?
Se os critérios forem irresponsabilidade administrativa, ausência de planejamento humano, descaso diante dos previsíveis fenômenos naturais exacerbados, o Brasil estará vergonhosamente nas primeiras posições.
Senhora presidente Dilma, não se esconda atrás de incompetentes. Seus ministros não têm que se explicar a senadores. Demita-os para que se expliquem, sem torturas, à polícia administrativa da Controladoria Geral da União.
São esses os crimes de colarinho branco.

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terça-feira, 10 de janeiro de 2012

BOICOTE EMPRESARIAL


Esta mensagem é dirigida aos insatisfeitos usuários dos serviços técnicos da Vivo Internet 3G. Além de lento, sem mais nem menos aparece na janela: “O dispositivo foi desconectado ou não está disponível”. Ou: “Você precisa estar conectado a uma rede”.
Procuro ajuda pelo *8486. Após 23 minutos de irritante música e avisos comerciais, ouço uma voz: ”em que posso ajudá-lo”? Faço a descrição do “problema”. Pede-me o nome completo, os três primeiros números do CPF, Registro Geral, data de nascimento. Aguardo mais 10 minutos enquanto o representante identifica meu cadastro. Já se passaram 33 minutos. Repito a ele o aviso da janelinha. “Reinicie o computador e conecte-se à Internet”. Nada. O problema continua. “Tire o modem e recoloque-o.” Nada. “Tire o chip do modem”. O representante desaparece por 10 minutos. “Recoloque o chip no modem e tente novamente”. Mais 10 minutos. O ser humano da Vivo desaparece definitivamente.
Uma hora depois, chateadíssimo, irritadíssimo, desiludidíssimo, ao ouvir um novo representante de nome Sílvio, descrevo-lhe com termos adequados à raiva pelo que se passou nesta hora. Peço- lhe, POR FAVOR, o cancelamento de minha assinatura. Educado, Sílvio desculpa-se em nome da “empresa” pelo péssimo atendimento do colega e me informa que devo dirigir-me ao Departamento de Cancelamento. Ele me transferiria para lá. Sabendo da inevitável demora, gentilmente se oferece para me acompanhar ao telefone enquanto se faz a passagem de Campo Grande (MS) a Curitiba ou Rio de Janeiro. Alguns minutos depois, surge uma voz civilizada, feminina. Repito minha ordem de cancelamento. Confirmo CPF, RG, data de nascimento, e endereço. Quer saber qual o motivo do cancelamento. Resumo-lhe a história. Pede desculpas. A bateria do celular está para acabar. A conexão se enfraquece. O sinal se corta. Entrego o telefone ao ouvido mais aguçado de minha neta. A voz civilizada pede uma nova chance para resolver o “problema”. Luiza (13 anos) segue as novas orientações. Tira o chip, recoloca-o. Segue tudo igual. 70 minutos. A bateria do celular arriou. Estamos no Sítio. O carregador ficou em casa. Cortou-se a ligação com a Vivo.
Toda esta trágica história de ajuda técnica é para dizer à VIVO duas coisas. Primeira, desconfie dos conhecimentos e das atitudes profissionais de seus representantes. Segunda, considere a possibilidade de espionagem empresarial e de consequentes boicotes operados por infiltrados que atuam contra seus negócios.
Sabem quem resolveu o “problema” por telefone? Meu genro que é engenheiro de sistemas. O que a Vivo não fez, ele o fez? Quem sabe, sabe. Ele se chama Alexandre Goretti.
Eu estou decidido a cancelar minha assinatura eletrônica com a Vivo Internet 3G. Ontem, não deu. Hoje, dará.

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segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

MÁGICAS DA PREVENÇÃO

<<   PEQUENA BARRAGEM EM CANAL DE ESCOAMENTO PARA CAPTAR. CONTER E DETER A VELOCIDADE DA ÁGUA DA CHUVA. (Sítio das Neves, DF)

Prevenir quer dizer antecipar-se a fenômeno natural em razão de possíveis consequências desastrosas para os cidadãos ou a comportamentos humanos que possam causar distúrbios à sociedade. Um sistema inteligente de prevenção não impede, por exemplo, que a natureza derrame sobre nossas cidades, campos e montanhas milhões de metros cúbicos de água. Mas pode impedir que elas invadam residências.
As medidas naturais de prevenção relativas a chuvas torrenciais anuais previsíveis consistem em proteger a vegetação desde a nascente dos rios até a desembocadura final no oceano. As florestas, especialmente as que originalmente cobriam as montanhas e as margens dos rios, detinham parte considerável das águas pluviais. Há cálculos que estimam terem as plantas capacidade para deter um quarto da água da chuva, isto é, 250 litros a cada mil que caem sobre uma região.
Em determinados pontos dos canais de esgotamento próximos às nascentes e ao longo de grotas, a construção de pequenas barragens pode ajudar na prevenção de inundações. As cidades anualmente inundadas têm mais de cem anos de existência e todas elas estão situadas em regiões degradadas pela exploração agrícola intensa e inconsequente sob o aspecto ambiental. As monoculturas e as grandes explorações que devastaram imensas regiões provocaram o descontrole das águas pluviais. É necessário que se revisem esses métodos de exploração agrícola e se construam corredores vegetais para minorar os efeitos das trombas de água que parecem ser a constante dos próximos anos.
As modificações do clima do planeta tornam as consequências das grandes chuvas ainda mais desastrosas. Pode-se prever que as medidas tradicionais de prevenção, sem atentar para o reflorestamento das regiões onde se situam as cidades inundadas, não terão efeito satisfatório. Nos próximos trinta anos, essas populações terão que convier com os desastres. É o tempo necessário para recompor as florestas.
O dinheiro previsto no orçamento para prevenção de desastres causados por fenômenos naturais é apenas um número sem destino certo. É uma operação mágica de caráter político e eleitoral que incentiva a solidariedade emocional aos danificados. Nada tem a ver com os fenômenos naturais previsíveis e determinados pelas leis físicas. O montante destacado para a prevenção é absolutamente insuficiente para ser utilizado na reconstrução das cidades alagadas. É um absurdo aritmético compatível com o absurdo do manejo político do dinheiro que devia ser aplicado na prevenção. Seria talvez suficiente se tivesse sido dirigido no tempo certo à prevenção.
Depois do desastre, isto é, das consequências de um fenômeno natural previsível, a correria, as entrevistas, as acusações mútuas, os sobrevoos de helicópteros para avaliar prejuízos, as decisões categóricas de ordenar o envio de milhões que se perderão pelo caminho fazem parte da mágica de transformar um real para prevenção em milhões para recuperação.

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sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

RODANDO NO ESPAÇO



Ouço um grito trazido pelos ventos uivantes.
– Onde está o amigo?
Rodando a uma desmesurada velocidade. Rodando pelo espaço a bordo de um planeta entre sóis, estrelas e galáxias.
Encontro-me num ponto variável, pois tudo roda em ritmo preciso.
Ora caminhando por vales longos, ora sentado à sombra de um mogno, ora deitado nos braços da noite.
Em qualquer posição, desta altura indefinida, equidistante de todas as lonjuras, equilibrado no vazio, convivo com a grandeza que vislumbro por todos os lados.
Amigo, tudo aqui é fantasticamente grande, enorme, infinito.
Os abismos luminosos ou escuros são gigantescos.
Daqui, tudo parece imenso na singeleza do colossal, na simplicidade do magnífico.
Vou rodando, pois, pelo espaço, agarrado à casca do planeta Terra em busca de nada.
Rodo pelo prazer de rodar no espaço aberto, entre estrelas e galáxias, vencendo silêncios descomunais.
Não conto horas nem dias.
Milênios me esperaram para esta aventura.
Milênios restam para rodar pela vastidão descomunal do universo.
Saudações siderais aos ventos de hoje e de outrora.

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quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

PREVENIR OU REMEDIAR?



Os que entendem desta matéria, afirmam com cálculos matemáticos que é menos custoso prevenir do que remediar, recompor, reconstruir.
Num desastre – incêndio, inundação, acidente de trânsito ou choque elétrico – há inúmeros aspectos que tornam a prevenção complexa, mas fisicamente possível.
Vamos aos dois orifícios de uma tomada elétrica. Por comodidade de ligar aparelhos elétricos, elas estão situadas à altura que uma criança de dois anos pode alcançar. Nessa idade de querer tudo saber e em tudo tocar, os dedinhos tentam descobrir o que se esconde nesses buraquinhos redondinhos, no canto escuro do quarto.
Um dos alertas a observar é que havendo tomadas na sala ou no quarto é fato conhecido que crianças normais podem enfiar os dedinhos nos furinhos. O ensaio que a criança pretende realizar é se seus dedinhos cabem nos furinhos. Ela não teve, no ventre materno, lições de física. Não sabe de eletricidade. O único choque térmico foi ao sair do ventre quente da mãe e entrar para a atmosfera fria.
Para prevenir o choque elétrico e, ao mesmo tempo, não decepcionar a curiosidade de saber se os dedinhos cabem nos furinhos, tomam-se providências. Um falso plugue esconde os buraquinhos e uma caixa cúbica com orifícios de formas geométricas é posta à disposição das experiências da criança para que ela descubra as dimensões não só de seus dedinhos como dos triângulos e retângulos a enfiar em seus respectivos lugares.
Ana Clara, porém, impressionando as visitas com sua esperteza, aos dois anos, burlou a vigilância da mãe e testou o tamanho dos furinhos. O choque elétrico quase lhe custou a vida. Passou horas, em observação, no Pronto-Socorro . Movimentou ambulância, médicos e enfermeiras. O pai foi avisado no local de trabalho. Pediu permissão para se ausentar. A mãe chorava de angústia lamentando-se da imprevidência. As demais atividades da casa se paralisaram.
O custo do falso plugue é infinitamente menor do que o das consequências da curiosidade infantil malconduzida.  A informação sobre a experiência histórica de crianças que enfiam dedinhos na tomada é o primeiro aspecto a ser considerado na construção de um sistema de prevenção que inclui um falso plugue e uma caixa com orifícios de formas geométricas.
No caso das inundações, na temporada de chuvas anuais, as cidades afetadas têm mais de cem anos de história, uma série suficientemente longa para ilustrar a inteligência prática das pessoas que residem nelas e dos funcionários que foram designados para construir um sistema de prevenção que reduza os efeitos de fortes chuvas, a cada ano mais intensas, em razão das mudanças climáticas.
Um sábio sistema de prevenção que inclua itens correspondentes ao falso plugue e à caixa com orifícios de formas geométricas. Os que entendem do assunto repetem, todos os anos, que um real aplicado em prevenção poupa milhões em reconstrução.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

ÁGUA E OXIGÊNIO


Perguntam-me, frequentemente, qual é o produto cultivado no Sítio que preservo no perímetro do Distrito Federal. A exploração da terra, para arrancar dela algum produto, é uma preocupação atávica. Originou-se, há dez mil anos, quando os seres humanos começaram a desenvolver a ideia de propriedade, isto é, um lugar fixo para sobreviver cultivando a terra.
Evoluí desse ponto atávico para um entendimento mais universal das propriedades oferecidas pelo planeta Terra. Os fatores e as condições essenciais de sobrevivência dos seres vivos, como água, carbono e oxigênio, perderam espaço de importância na exploração desses mesmos elementos com o fim de produzir alimentos e riquezas. O resultado tornou-se mais importante do que os elementos necessários para produzi-lo. Só o fato de que dois bilhões de pessoas não tenham acesso à boa ou à suficiente comida para sobreviver demonstra que a prática agrícola atual não é a mais acertada. É preciso produzir mais com menos água e com menos agressão à natureza.
No Sítio das Neves (70 ha), invisto parte de meus rendimentos na proteção das condições e elementos físicos para a biodiversidade vegetal e animal. É simplesmente inumerável a quantidade de espécies vivas da fauna e da flora que sobrevive ao refrear o assalto da exploração agrícola desordenada e irracional. Da quase invisível gramínea ao frondoso jatobá vivem, nessa área protegida, milhares de espécies cujo papel é nada menos que a vital transformação de carbono em oxigênio e proteção de nascentes de água.
Quanto custa aos seres vivos, pessoas e animais, a produção permanente de milhões de metros cúbicos de oxigênio? Quanto custa para eles a manutenção de milhares de metros cúbicos de água nos troncos, galhos e folhas das árvores mesmo em longos períodos de estiagem? Quanto custa à humanidade a falta de ar puro e de água limpa com a desertificação de imensas áreas do planeta?
Eis minha resposta aos que perguntam com ar de cobrança o que produz a terra do Sítio das Neves: água e oxigênio.
Decisão racional dos Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente deverá ser a de isentar e oferecer subsídios aos que preservam as condições de produção natural de água e oxigênio para contrabalançar as emissões de gás carbônico de milhões de automóveis, aviões e indústrias. Estará, assim, garantida a biodiversidade, essencial fator de sobrevivência de todos os seres vivos do planeta Terra.

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domingo, 1 de janeiro de 2012

COMENTÁRIO A ADEUS PLANETA TERRA

Eugênio,

       Gostei muito da sua crônica sobre a profecia dos Maias. Muito boa tirada, com reflexões pertinentes. Parabéns! Pelo menos, feliz início de 2012, com saúde e disposição. Cordialmente. Taveira

COMENTÁRIO A ADEUS PLANETA TERRA

Caro sonhador Eugenio - ao final de tua genial crônica "ADEUS PLANETA TERRA", me senti tão paralizado como quando assisti ao filme O PROCESSO, de Kafka, quando se tem a nítida impressão de que todos somos culpados e ao mesmo inocentes e não sabemos o por quê. Um abraço e mais uma vez um ótimo 2012. Daniel. Lages.SC.