terça-feira, 6 de dezembro de 2011

RAZÕES DO OTIMISMO OFICIAL

Vez por outra, ocasiões raras, reúnem-se amigos para conversar. Nos últimos anos, as circunstâncias do mundo e do país mudaram drasticamente e já não se sabe quem está do lado do colonizado ou do colonizador, descontados os arroubos da retórica de circunstância.
Há comentários ditos por críticos da situação e outros proferidos por privilegiados do sistema em vigor. O crítico, com ou sem alternativa possível ao regime vigente, vê o lado fraco dos acontecimentos políticos, como a corrupção ou obras gigantescas, antiecológicas e pseudoprioritárias, e se expressa, por vezes, em tom duro e negativo. As opiniões do privilegiado, que usufrui do bom e do melhor que o governo estabelecido lhe oferece, tendem a ser positivas, otimistas e mostram os avanços na forma de tomar decisões políticas.
O privilegiado crê que os administradores temporários do poder precisam ser tolerantes em graus flexíveis com os aliados para manter-se na cadeira e decidir o melhor para o país. Não importa a quem se deva tolerar, mesmo que o passado dos aliados seja cronicamente torpe e reprovável. O grito “tolerância zero” não se aplica com rigor à política, segundo o privilegiado. Sim, são intoleráveis o roubo de bens particulares, o sequestro de pessoas, o assalto a bancos, o latrocínio, a infração de trânsito contra a lei seca que causa mortes, o uso e comércio de drogas, o contrabando, a grilagem de terras, a invasão de áreas públicas urbanas, a prostituição de menores, as agressões contra a mulher, o trabalho escravo, os juros extorsivos, os altos impostos e outros crimes mais. A ética do privilegiado aceita a aplicação da “tolerância zero” em qualquer um dos fatos cotidianos desse grupo de contravenções.
Já o desvio de verbas para atender a projetos pessoais, indenizações milionárias por supostos danos morais, concessões de contratos de obras sem licitação, favorecimentos de empresas ou ONGs para fortalecer partidos políticos e garantir suporte à dita governabilidade, alianças com personalidades condenadas pelos tribunais ou processadas por ilícitos gritantes, nomeação de ministros publicamente conhecidos por sua duvidosa conduta ética ou por arrombamento dos cofres do Erário, são tratados com flexibilidade jurídica e panos quentes.
Essa corrupção oficial entra no jargão dos analistas políticos ligados ao poder com justificativas tais como: “a corrupção não é de hoje, existe em todos os países, nunca se prenderam tantos suspeitos (provisoriamente) e se demitiram tantos ministros e funcionários acusados de peculato e improbidade administrativa, mas democracia é tolerância ao voto popular”.
Dos milhares de prisões provisórias efetuadas, contam-se nos dedos das mãos os criminosos de gravata e colarinho branco que foram punidos ou que tivessem devolvido o produto do roubo. Ao contrário, voltam ao poder como deputados, senadores, ministros, altos funcionários de empresas públicas. Este estado mole, flexível, usa os artifícios da máquina administrativa e a ignorância democrática da população para garantir o êxito eleitoral com forte alienação política. Consolida-se, assim, administração do privilégio.
Em matéria de ética política é preciso ser radical sem perder a ternura. Num partido político, não há apenas ladrões, aproveitadores, arrivistas insubstituíveis. O amadurecimento político de governantes supõe que negociações, concertações e alianças se façam com as partes sadias dos agrupamentos representativos das opiniões ecumênicas e diversificadas da sociedade.

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