quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

A CIDADE QUE HABITO


A cidade que habito, adotou-me há quarenta anos. Brasília nasceu da cabeça, da prancheta e da régua do Dr. Lúcio Costa. Plantada na vastidão de um planalto, se tornou uma formosa ilha verde cercada de casas inacabadas por todos os lados. Uma galeria de monumentos desenhados pelo arquiteto Oscar Niemeyer brotam do chão árido e apontam para cima perdidos no ar.
 Presidente da República, uma pilha de 37 Ministros de Estado, não sei quantos outros ministros de Supremas Cortes, de Tribunais civis e militares, de Conselhos, Autarquias, Controladorias e uma centena de embaixadores do mundo se abrigam aqui. Em edifícios de alta rotatividade, se alojam 80 senadores, 513 deputados federais e 15 mil agregados da produção de leis.
A cidade que habito é cortada por artérias, ruas, ruelas, calçadas, avenidas, eixos, eixinhos, eixões que desembocam na Esplanada dos Ministérios ociosos. A cidade que habito é uma enorme rodoviária atopetada de automóveis, ônibus e motos. Imenso estacionamento onde se guarda o sonho brasileiro e o máximo valor da nova moral do consumo. Nele mourejam centenas de cuidadores e lavadores de sonhos e valores.
A cidade que habito é tetraplégica. Anda em cadeira de rodas. Para uso de pedestres diaristas, domésticas, vigilantes e vagabundos, de olhares medrosos  e passos apressados, há passagens subterrâneas à meia-luz que cheiram a cloacas e vômitos.
A cidade que habito, ainda jovem, modelo arquitetônico nas passarelas do mundo, é submetida a implantes, próteses, vasectomias, plásticas e puxadinhos.
Na cidade que habito, à noite, passam todos os astros do universo, grandes e pequenos, conhecidos e desconhecidos para se mirarem nas águas do Lago Paranoá.
Sou feliz na cidade que habito e saio à noite para ver estrelas.

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