quinta-feira, 20 de junho de 2013

O CAVALEIRO E O CABRESTO


A insatisfação, a indignação, a náusea civil, a mentira econômica, a corrupção política são os ingredientes do basta! que milhares de cidadãos estão gritando pelas ruas e pelas janelas. Até as depredações que vieram no bojo das manifestações são simbólicas do vandalismo explorador do sistema econômico e da devastação de nossas florestas pela ganância insana de investidores. Nem uma nem outra são aceitáveis.
Enganam-se os que tomam apenas decisões intempestivas e amedrontadas de eliminar centavos no preço do transporte que continuará ruim. O buraco é mais embaixo. O que está podre é a desigualdade imposta pela filosofia do crescimento econômico que canaliza os lucros para poucas mãos e garante migalhas à periferia do grande banquete em nome da sustentabilidade do consumo.
Expressões como “tirar milhões da miséria”, participar do “mercado de trabalho”, integrar os pobres ao “consumo de bens” revelam a pobreza mental e a limitação intelectual dos que se aferram ao poder a qualquer custo. Mantêm intocada a sólida ignorância nacional consolidada pela aplicação da máxima que os cônsules romanos, em prístinas eras, sugeriam aos imperadores: pão e circo.
Talvez o cidadão brasileiro esteja cansado de ter só esse cardápio que exige fabulosos investimentos em arenas que servem de vitrina para vender jogadores aos mercadores e exploradores do corpo humano, de chuteiras e uniformes.
O recado das ruas é outro. Educação universal e gratuita, conhecimentos básicos e sólidos, ampliação da capacidade de pensar, criticar e agir são os ingredientes da receita que ainda não alcançou os políticos, os ideólogos e os manipuladores do poder.
Pão e circo é o cabresto que os cavaleiros do poder usam para se equilibrar no lombo do povo. Nessa corrida, há os que foram amansados e convencidos pelo cavaleiro de que precisam de cabresto. Há os que aceitam o cabresto na esperança de ganhar cenoura ou milho. Há os que se rebelam contra o cabresto e o cavaleiro. Vivemos numa alvorada em que a cidadania começa a sentir o incômodo do cabresto e a arrogância do cavaleiro.

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Nota: Sou sociólogo naturalista e escritor. Administro uma área liberada da opressão industrial e da tirania do consumo obsessivo, uma reserva natural de cerrado de 70 hectares (Sítio das Neves) para refúgio de variada fauna de ar e terra, reprodução espontânea da flora nativa (3.500 espécies), proteção de nascentes e recarga de aquíferos com captação de águas pluviais. Estudo a ocupação do espaço e a organização de algumas espécies da biocomunidade (mangabeiras, caliandras e catolé).


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