É nessas horas matinais,
entre uma coisa e outra, que leio e escrevo. Meus 16 livros foram escritos no
tempo que vai do canto do sabiá-de-peito-amarelo à deposição do desnecessário.
A cozinha é uma das peças do apartamento que realmente me atrai. O amor, quando
há, se manifesta na realização da receita. Quando conheci a mulher com quem
casei, ela me revelou que não sabia cozinhar. Não se preocupe, disse-lhe, eu
sei. Preparo-lhe todas as manhãs uma salada de frutas. Minhas netas insistem
que eu deva abrir um restaurante. Só se for para elas que são adoráveis.
Minhas
reflexões existenciais, meus pensamentos filosóficos, meus ataques de ironia
alcançam seu ápice no manejo da cebola, do alho e da pimenta. Acho que foi na
cozinha que me tornei agnóstico e ateu. E foi, se não me engano, preparando uma
salada apimentada de berinjela, à moda de minha mãe Agnese, que eu disse em voz
alta: eu não tenho alma, eu tenho cérebro.
E, rindo dessa descoberta, constatei
que muita gente tem alma, mas pouco cérebro. Tal é a quantidade de estultícia
que lota os dias, os meses e os séculos da espécie humana.
2.10.2015
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