sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

ECOLOGIA NOS GOVERNOS BRASILEIROS


A ecologia, também confundida com meio ambiente, tomou as atenções oficiais dos governos brasileiros na década de 1990 com a realização, no rio de Janeiro, da Conferência Mundial para o Meio Ambiente, a Eco-92, durante o período Collor.

Os alarmes do Clube de Roma, no início dos anos 70, e da Conferência de Estocolmo-72 foram ouvidos pelos governos brasileiros vinte anos depois. Tínhamos, no entanto, inúmeros estudiosos comprometidos com princípios ecológicos de compreensão e trato da natureza. Perceberam eles, com visão de futuro, os riscos que todos os seres vivos corriam diante da superpopulação humana mundial, a produção crescente de alimentos, produtos ricos em proteínas e fibras transformados em commodities lucrativas.

A agricultura, responsável pela alimentação humana e de animais domesticados, recebeu o apoio da pesquisa biológica, da tecnologia industrial de máquinas agrícolas e de transporte e, de maneira camuflada, mas eficiente, a implantação de laboratórios químicos para combater germes e pragas, preparar fertilizantes e hormônios que acelerassem e aumentassem a produção de comida. A produção de alimentos aumentou, as cidades se encheram de gente, os campos agrícolas se envenenaram, espécies vivas desapareceram, novas enfermidades atacaram as pessoas, o planeta adoeceu. A agricultura salvou a indústria.

Apesar de todo o progresso agrícola, da tecnologia, da Revolução Verde, formaram-se desertos e a fome devorou milhões de seres humanos em todos os continentes. “Cinco décadas da chamada Revolução Verde (iniciou no fim da década de 40) não só levaram à destruição e à contaminação da água, do solo, da biodiversidade e das comunidades humanas, como geraram fome”. (Declaração de Vancouver sobre a industrialização e a globalização da agricultura, 1998.)

No Brasil, nas décadas de 80 e 90, sacrificaram-se imensas áreas da Amazônia e do Cerrado causando mudanças climáticas decisivas que romperam a harmonia entre a natureza e os seres vivos. A euforia das supersafras escondia a fome de milhões de brasileiros e o desastre natural provocado pela mão humana nas principais regiões produtores de alimentos. Não se cuidou da racionalidade produtiva nem do crescimento descontrolado da população brasileira que se amontoava nas margens das metrópoles.

A mencionar apenas os da Nova República, pós-ditadura militar, nos últimos vinte e sete anos de governos, não houve um só presidente eleito que demonstrasse compreender a filosofia e a matemática da natureza. Ecologia e meio ambiente foram sinais exteriores para ficar bem na foto das tendências internacionais. Neste mesmo período, só tivemos dois ministros que fazem jus ao título: José Lutzenberger (á época, secretário com status de ministro, 1990-92) e Marina Silva (2003/2008), ambos derrotados pelos seus próprios governos, Collor e Lula. Só eles, entre todos os ministros que ocuparam a cadeira do Meio Ambiente, tinham “conexão sensorial com a terra, as plantas, a água, os animais” (Sinfonia inacabada, Lilian Dreyer, 305).

Da Rio-92 à Rio+20, em 2012, o Brasil avançou em burilados discursos politicamente corretos e em retórica clássica na defesa formal da ecologia. Elaborou leis aperfeiçoadas mais que todas no mundo. Constituíram-se secretarias de meio ambiente nos estados da federação e nos municípios. A Secretaria de Meio Ambiente do governo central tornou-se ministério. Pulularam as ONGs, parte do IBAMA foi entregue ao Instituto Chico Mendes para resgatar sua memória. Reduziu-se timidamente a devastação da Amazônia e do Cerrado.

Só não se conseguiu formular uma política ecoambiental coerente com as diversas regiões do país, elaborar um código florestal e agrícola capaz de restabelecer a harmonia e o equilíbrio ecológico, garantir a biodiversidade e a interdependência de todos os seres vivos da pródiga natureza do Brasil, da qual somos integrantes em paridade de direitos à vida. Falta-nos um projeto Brasil, inteligente, regionalmente integrado e interdependente que supere as ações pontuais e dispersas de governos de curta visão de quatro anos.

Domina-nos a pretensão do crescimento econômico contínuo e infinito sob a batuta inquestionável dos adoradores do PIB a conduzir a sociedade ao consumismo compulsivo. Cunhou-se, para dissimular os efeitos trágicos do crescimento a qualquer custo, a inócua expressão “desenvolvimento sustentável”, slogan repetido em qualquer circunstância, mais a torto do que a direito, para encaminhar qualquer projeto ou justificar qualquer obra monumental.

Não é de estranhar que a cada início de primavera e verão culpa-se a chuva pela inundação de quase trezentas cidades construídas às margens de ribeirões ou encostas de morros tomadas às árvores e à vegetação protetora, rasgadas por rodovias malfeitas e malconservadas. Fazem-se grandiosas obras de engenharia rios abaixo e descuram-se pequenos, mas imprescindíveis trabalhos de proteção às cabeceiras rios acima.

Não é de estranhar que, ao invés de dar preferência à ferrovia, à hidrovia, à marinha costeira para cargas e ao transporte público nas cidades e entre cidades, os governos incentivam a produção e venda de automóveis de passeio, enlouquecidos com a exploração do pré-sal, congestionando cidades e rodovias, contradizendo com a prática as intenções do “desenvolvimento sustentável”.

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