A ecologia, também confundida com meio ambiente, tomou as atenções oficiais dos governos brasileiros na década de 1990 com a realização, no rio de Janeiro, da Conferência Mundial para o Meio Ambiente, a Eco-92, durante o período Collor.
Os alarmes do Clube de Roma, no início dos anos 70, e da
Conferência de Estocolmo-72 foram ouvidos pelos governos brasileiros vinte anos
depois. Tínhamos, no entanto, inúmeros estudiosos comprometidos com princípios
ecológicos de compreensão e trato da natureza. Perceberam eles, com visão de
futuro, os riscos que todos os seres vivos corriam diante da superpopulação humana
mundial, a produção crescente de alimentos, produtos ricos em proteínas e
fibras transformados em commodities
lucrativas.
A agricultura, responsável pela alimentação humana e de
animais domesticados, recebeu o apoio da pesquisa biológica, da tecnologia
industrial de máquinas agrícolas e de transporte e, de maneira camuflada, mas
eficiente, a implantação de laboratórios químicos para combater germes e
pragas, preparar fertilizantes e hormônios que acelerassem e aumentassem a
produção de comida. A produção de alimentos aumentou, as cidades se encheram de
gente, os campos agrícolas se envenenaram, espécies vivas desapareceram, novas
enfermidades atacaram as pessoas, o planeta adoeceu. A agricultura salvou a
indústria.
Apesar de todo o progresso agrícola, da tecnologia, da
Revolução Verde, formaram-se desertos e a fome devorou milhões de seres humanos
em todos os continentes. “Cinco décadas da chamada Revolução Verde (iniciou no
fim da década de 40) não só levaram à destruição e à contaminação da água, do
solo, da biodiversidade e das comunidades humanas, como geraram fome”.
(Declaração de Vancouver sobre a industrialização e a globalização da
agricultura, 1998.)
No Brasil, nas décadas de 80 e 90, sacrificaram-se imensas
áreas da Amazônia e do Cerrado causando mudanças climáticas decisivas que
romperam a harmonia entre a natureza e os seres vivos. A euforia das
supersafras escondia a fome de milhões de brasileiros e o desastre natural
provocado pela mão humana nas principais regiões produtores de alimentos. Não
se cuidou da racionalidade produtiva nem do crescimento descontrolado da
população brasileira que se amontoava nas margens das metrópoles.
A mencionar apenas os da Nova República, pós-ditadura
militar, nos últimos vinte e sete anos de governos, não houve um só presidente
eleito que demonstrasse compreender a filosofia e a matemática da natureza.
Ecologia e meio ambiente foram sinais exteriores para ficar bem na foto das
tendências internacionais. Neste mesmo período, só tivemos dois ministros que
fazem jus ao título: José Lutzenberger (á época, secretário com status de
ministro, 1990-92) e Marina Silva (2003/2008), ambos derrotados pelos seus
próprios governos, Collor e Lula. Só eles, entre todos os ministros que
ocuparam a cadeira do Meio Ambiente, tinham “conexão sensorial com a terra, as
plantas, a água, os animais” (Sinfonia inacabada, Lilian Dreyer, 305).
Da Rio-92 à Rio+20, em 2012, o Brasil avançou em burilados
discursos politicamente corretos e em retórica clássica na defesa formal da
ecologia. Elaborou leis aperfeiçoadas mais que todas no mundo. Constituíram-se
secretarias de meio ambiente nos estados da federação e nos municípios. A
Secretaria de Meio Ambiente do governo central tornou-se ministério. Pulularam
as ONGs, parte do IBAMA foi entregue ao Instituto Chico Mendes para resgatar
sua memória. Reduziu-se timidamente a devastação da Amazônia e do Cerrado.
Só não se conseguiu formular uma política ecoambiental
coerente com as diversas regiões do país, elaborar um código florestal e
agrícola capaz de restabelecer a harmonia e o equilíbrio ecológico, garantir a
biodiversidade e a interdependência de todos os seres vivos da pródiga natureza
do Brasil, da qual somos integrantes em paridade de direitos à vida. Falta-nos
um projeto Brasil, inteligente, regionalmente integrado e interdependente que
supere as ações pontuais e dispersas de governos de curta visão de quatro anos.
Domina-nos a pretensão do crescimento econômico contínuo e
infinito sob a batuta inquestionável dos adoradores do PIB a conduzir a
sociedade ao consumismo compulsivo. Cunhou-se, para dissimular os efeitos
trágicos do crescimento a qualquer custo, a inócua expressão “desenvolvimento
sustentável”, slogan repetido em qualquer circunstância, mais a torto do que a
direito, para encaminhar qualquer projeto ou justificar qualquer obra
monumental.
Não é de estranhar que a cada início de primavera e verão
culpa-se a chuva pela inundação de quase trezentas cidades construídas às
margens de ribeirões ou encostas de morros tomadas às árvores e à vegetação
protetora, rasgadas por rodovias malfeitas e malconservadas. Fazem-se
grandiosas obras de engenharia rios abaixo e descuram-se pequenos, mas
imprescindíveis trabalhos de proteção às cabeceiras rios acima.
Não é de estranhar que, ao invés de dar preferência à
ferrovia, à hidrovia, à marinha costeira para cargas e ao transporte público
nas cidades e entre cidades, os governos incentivam a produção e venda de
automóveis de passeio, enlouquecidos com a exploração do pré-sal,
congestionando cidades e rodovias, contradizendo com a prática as intenções do
“desenvolvimento sustentável”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário