segunda-feira, 21 de junho de 2010

OS NORMAIS DO GOVERNO

Na década de 60, o discurso político tinha um final clássico: para um país mais justo, mais social, mais cristão.
Na década de 70, a ditadura impunha: um anticomunista, desenvolvido e cristão.
Na década de 80, a abertura política retomou a retórica: para um país justo, democrático e humano.
Na década de 90, o discurso trouxe novidade: mais tecnológico, neoliberal e ecológico.
Na primeira década do século 21 a economia enlouqueceu. Propõe-se um país globalizado, consumista. com maior crescimento econômico.
Para cumprir esse ideal, nos últimos dois anos, o governo abriu mão de impostos para desovar automóveis e eletrodomésticos, aliviar caixas de bancos e jogar empréstimos pela janela.
Ouço com náusea as fanfarronices quixotescas, as explicações cínicas e sem coerência do atual Presidente do Brasil. Ele está nivelando por baixo a capacidade de raciocínio de cem milhões de brasileiros para satisfazer a outra metade do Brasil com quem se identificava antes de chegar ao poder. O fato de usar terno Armani, viajar em avião privativo, ter rádios e tevês à disposição não lhe dá o direito de se pôr acima da lei nem falar ao país como se todos os ouvintes tivessem o mesmo grau de patetice arrogante que o anima.
“Ideias não são metais que se fundem,” disse o tribuno gaúcho Silveira Martins, há mais de cem anos. Hoje, os políticos de todos os tons ideológicos e cores partidárias pasteurizaram e fundiram ideias e ideais, confundiram e inverteram prioridades. Lançaram-se à conquista do poder pelo gosto do poder. O espírito fascista se intumesce, ensurdece os ouvidos e aliena o raciocínio do povo com eu sou, eu mando, eu faço, eu decido, eu aprovo, eu organizo, eu dou, eu digo, eu desdigo, eu sei, eu sou o poder.
O governo fascista cobre um fato com outro, nega evidências, mente e desmente, arma o teatro da comédia e do absurdo, absolve os cupinchas por antecipação. Esse comportamento cínico é a virtude dos Normais do Governo. Todos são atores da mesma peça, todos ensaiam o mesmo texto, do assessor ao ministro, do líder político ao presidente. Antes deles, ninguém. Depois deles, ninguém.
Faz uma década que alguns números não se modificam. São números oficiais e escandalosos, embora se anuncie uma nova classe média. O preocupante, no Brasil, são os 56,9 milhões abaixo da linha de pobreza, sustentados pelo Bolsa Família. Os 24, 7 milhões que sobrevivem na extrema pobreza, dos quais 70% são afro-descendentes (50% vivem no Nordeste). Esses números são suficientes para compor um programa de governo. Há um Brasil profundo habitado por mais de 80 milhões que admiram, de seu obscurantismo crônico, o crescimento econômico da potência emergente sem vê-la aproximar-se de seus tugúrios.
O Brasil desigual continuará como bucha eleitoral enquanto se investe quase tudo onde pode dar certo e quase nada onde deveria dar certo: educação.

Um comentário:

Rafael Trombetta disse...

Oi Eugênio!

Parabéns novamente por mais esta demonstração de perspicácia quanti e qualitativa na tua análise. Aproveitei e a divulguei no site do Peloplaneta.

Abraços!