sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

ESTATÍSTICA E O DESCONHECIDO

O desconhecido é desagregado em termos quantitativos com os quais se arma uma equação da qual resulta o conhecido
Dizem-nos que neste ano morrerão 100 mil mulheres, vitimadas pelo câncer de mama, 4,7% a mais do que no ano passado. Nada se pode fazer. A estatística determinou. Ela pensou por nós e nós aceitamos e nos dobramos à força dessa profecia.
No ano que vem, todos os cálculos estatísticos manipulados pelos especialistas profetizarão o crescimento do PIB em 4,8% ou qualquer outro número. Pode-se aplaudir de antemão os êxitos do futuro e comemorar com um almoço de confraternização antecipado.
Não interessa, no momento, o que isso significa nem nos é dado penetrar nesse mistério. Esse mito estatístico alimenta o pensamento do economista e dos analistas que só aparecem depois do leite derramado para explicar a fragilidade do vidro.
O ritual do mito é a repetição sucessiva. Ela confere valor aos atos, às expectativas, à consolidação da credulidade. Não importa que o resultado não seja o anunciado. A fé no percentual equivale à da pessoa que suplica o milagre. Se não o obtiver, as razões são extraídas de um poder superior que sabe o que é bom e o que não é para o crédulo.
Os jornalistas e economistas são sacerdotes do novo mito estatístico. Eles falam do desconhecido e nós acreditamos ou fingimos crer que eles o conhecem. Conhecemos assim o desconhecido por antecipação. Ele nos é revelado pela força da matemática e aceitamos que os fatos se produzem fatalmente.
Os fatos exteriores nos embalam e vamos com eles. Acha-se natural que as ruas de Brasília se entupam com milhares de carros. Outros milhares virão anunciados por um percentual. E virão. Os mortos e atropelados pelos condutores de carros se transformam ou se encarnam num percentual que ainda não aconteceu, mas vai acontecer.
Sabemos, por antecipação, que em futuro imediato as nascentes dos rios secarão para deixar lugar à construção de milhares de casas. Que as avenidas e viadutos destruirão a harmonia da natureza do cerrado. Que as árvores serão sacrificadas e recortadas para a circulação de máquinas que emitem veneno e causam doenças à população. Nada a fazer. O desconhecido foi anunciado e existe logo ali na frente.
A estatística existe e o percentual é sua voz profética.

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