terça-feira, 1 de outubro de 2013

ECOLOGIA: CATECISMO DA AUSTERIDADE OU NOVA FORMA DE PROSPERIDADE


I PARTE

A revista Nature publicou, em julho de 2012, um artigo assinado por 22 pesquisadores no qual alerta que os ecossistemas do planeta poderiam sofrer um colapso total até o final deste século (2100). Em fins de setembro de 2013, novo relatório do IPCC, confirma com 95% de certeza de que as condições climáticas estão sendo afetadas pela população humana, especialmente a que utiliza tecnologias movidas ao uso de combustível fóssil. O aumento de CO2, na proporção atual, pode levar à extinção de formas de vida reduzindo a biodiversidade e ameaçando a própria existência da espécie humana.
As tímidas medidas assumidas pela sociedade humana em todas as regiões do globo para obter resultados satisfatórios e comprovados merecem reflexões permanentes.
Múltiplas causas se associam a esse possível desfecho alarmante: pressão demográfica, perda da biodiversidade, elevada taxa de extinção de espécies, aumento das emissões de CO2. Esse conjunto de causas altera substancialmente as condições de existência, de sobrevivência e reprodução dos seres vivos.

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Esse grito estridente da possibilidade de uma catástrofe ecológica suficiente para exterminar bilhões de vidas, em tão pouco tempo, suscitou, entre especialistas de diferente orientação política e econômica, reações de incredulidade, de menosprezo e até de zombaria. A ecologia que defende o uso racional e igualitário de todas as riquezas do planeta foi interpretada como “o novo catecismo da austeridade”.
O fato de os ecologistas não apresentarem uma única saída para evitar o desfecho fatal e apelarem para o bom senso da humanidade com o fim de encontrar, em cada região e em cada situação medidas que levem a resultados universais, é tido como a maior fraqueza de seus argumentos. Daí uma ladainha de questões a eles proposta identificando-os como apóstolos do apocalipse, apologistas de uma nova religião orientada pela fé na eficácia de hábitos comedidos. O catecismo desses homens virtuosos – alegam – condena o consumo de combustíveis poluentes, o uso de energias sujas e destruidoras de florestas, prega ascetismo, privações e até prefere a fome e a pobreza dos países subdesenvolvidos para salvar a deusa Natureza.
Num tema tão complexo, há lugar para todos os argumentos, para todos os interesses, para todas as tendências. Aí vêm algumas perguntas provocativas que tendem a humilhar os proponentes de uma nova forma de prosperidade que propicie a convivência humana e integre a espécie humana na biocomunidade do planeta.

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Como persuadir, perguntam, as nações subdesenvolvidas ou emergentes a reduzir drasticamente sua população? Como alinhar o nível de vida dos mais ricos sobre os mais pobres? Como convencer os países pobres a permanecer em tal situação e os países ricos a renunciar à abundância? Qual elite ditatorial será capaz de impor suas vontades a 7 bilhões de seres humanos?
Para enfatizar essas perguntas aparentemente incontestáveis, os críticos da ecologia prudente e precavida enumeram vantagens do aumento das temperaturas que podem ajudar a combater a fome, a pobreza, a doença e os crimes em massa considerados os quatro flagelos mais agudos da humanidade. Mencionam a cultura de vinhedos no sul da Inglaterra, graças às melhores condições atmosféricas; o cultivo de frutas e legumes em terras antes congeladas da Groenlândia, bem como a imigração de focas a suas águas territoriais que lhe dão carne e peles para o comércio internacional. Quantos países do Hemisfério Norte submetidos a rigorosos frios não se rejubilariam com invernos mais curtos e verões mais clementes?

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Ressaltando essas vantagens imediatas, reais e de efeitos comprováveis a curto prazo, os ecologistas são acusados de fazer das mudanças climáticas uma arma para punir o gênero humano e levá-lo a fazer penitência. Uma volta à Idade Média, quando se interpretavam os cataclismos, furacões e inundações como castigo de Deus ao orgulho da criatura humana culpada de atos desmedidos.
Nomes atuais como lord Stern, Al Gore, James Hansen, Nicolas Hulot, sir Martin Rees, Hans Jonas (A festa industrial acabou) são ridicularizados por sua ingenuidade diante de possibilidades remotas e de difícil comprovação.
O novo catecismo da austeridade, segundo os místicos do crescimento, preconiza a “sobriedade feliz”, o despojamento material com entusiasmo e aconselha transformar o abatimento da escassez em alegria espiritual. É preciso acostumar-se à raridade das coisas, convencer os afortunados a se empobrecer e assegurar aos pobres que eles têm o necessário e o suficiente. Os partidos verdes pregam a ideologia da nova austeridade ditada pela saúde do planeta e desprezam as leis do mercado. São contrários a todos os avanços tecnológicos. Não só recusam a queima de carvão, como também do gás natural, do petróleo. Investem contra as usinas nucleares, os trens de alta velocidade, as nanotecnologias, os aeroportos e se concentram na energia eólica e solar.

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Em contrapartida, os opositores da chamada religião ecológica lançam os deuses do progresso contra os atrasos da fé ambiental. Se os países ricos tivessem seguido o princípio da precaução dos anos 50, jamais teriam chegado à indústria aeronáutica ou agroalimentar, ao complexo atômico ou químico, às autoestradas e aos trens de alta velocidade.
Que é desejável um desenvolvimento compatível com o respeito ao ambiente, dizem, todo o mundo está de acordo. Mas que, em nome da mãe Terra, seja necessário abraçar a regressão voluntária, idolatrar a privação, mergulhar na religião do medo, suspeitar de toda inovação tecnológica demonstra obscurantismo puro e simples. Conclusão: não é o cuidado do planeta que domina, é o ódio contra a humanidade dissimulado sob as vestes do culto da Natureza.
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Apesar dessas reações que beiram à ecofobia,  ao fanatismo e à intolerância a respeito de propostas alternativas apresentadas nos últimos 200 anos por geógrafos, arquitetos, filósofos, escritores, antropólogos, sociólogos, biólogos, há que se insistir no diálogo, na conversação, na análise dos fenômenos físicos, na crítica aos comportamentos humanos e no exame dos efeitos do uso irracional e desmedido das riquezas naturais e de sua apropriação por minorias em detrimento de maiorias.
O cérebro humano é dotado de mecanismos capazes de descobrir os melhores caminhos que garantem a sobrevivência e a reprodução de todas as formas de vida, quando se adquire a consciência de que pertencemos à mesma natureza e que é necessário assegurar a interdependência de todos os seres vivos.
Um mundo diferente é possível tanto quanto foi possível edificar o que hoje temos.
“Contrariamente ao que pensam os opositores das teses ecológicas, a ecologia apela para uma nova revolução que traz consigo miríades de inovações e que demandam, ao mesmo tempo, inteligência e ciência”. (Pascal Canfin, Ministro do Desenvolvimento, França, 2013)


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