Foto 1: fogo destrói nascentes
Poucas vezes e raros são os especialistas em
hidrologia e geografia que relacionam a quantidade de água disponível e a
demanda crescente em vista da expansão demográfica. Com timidez se anota, quase
pedindo perdão aos ouvintes, a real e física incapacidade de suporte de um espaço
para abrigar número de habitantes cuja densidade esgota definitivamente as energias
naturais disponíveis. A tendência generalizada dos especialistas é minimizar os
índices de crescimento demográfico e maximizar a capacidade humana e sua
curiosidade tecnológica para contornar futuras dificuldades no acesso à água.
É bom lembrar que, pela média do consumo humano e sua
necessidade essencial, pequena ou grande, cada pessoa precisa de 110/120 litros
de água por dia. É uma cota pessoal. Mas em volta da pessoa há outras
atividades que exigem o uso da água. Cálculos aritméticos simples dão a cifra do
imenso volume de água que uma cidade como Brasília que abriga quase três
milhões de habitantes. Outro aspecto pouco levado em consideração pelos órgãos
de planejamento urbano e administração dos serviços públicos é o ingresso anual
de novos habitantes na área urbana, por nascimento ou imigração, e o impacto
sobre a quantidade e a qualidade da água. Segundo informações da Codeplan (DF),
40 mil novos habitantes por ano se somam aos existentes. Essa nova população anual
afeta todos os órgãos vitais do corpo urbano: água, alimentação, escola, saúde,
trabalho, mobilidade, moradia, lazer.
As atividades de produção de alimentos, especialmente
na região do Planalto Central, consumem imenso volume de água e descarregam nos
córregos e rios toneladas de elementos poluidores. Cálculos sobre o consumo de
água de um bovino até chegar a seu ponto de abate indicam a proporção de 5 a 15
mil litros de água por quilo de carcaça. Mais uma vez, uma simples operação
aritmética (peso x no de cabeças x litros de água) dá uma assombrosa
soma de litros de água para um rebanho de mil cabeças. Milhões e bilhões de
litros de água são engolidos pela população bovina do Brasil, estimada em mais
de 190 milhões de cabeças. E esse rebanho deixa, no solo, outros bilhões de
quilos de dejetos que acabam contaminando as águas de córregos e rios.
Um plano de gerenciamento da distribuição e uso da
água representa a superestrutura de mecanismos, cuidados e ações humanas para
garantir que seus efeitos sejam benéficos à saúde da população. A
infraestrutura desse plano reside nos aspectos físicos, geográficos e
geológicos das nascentes e em tudo o que ocorre a seu redor, incluída a
capacidade natural de captação das águas da chuva para recarga dos aquíferos.
Conhecem-se, graças às fotos de satélites, todos ou
quase todos os cursos d’água da região do Distrito Federal. Mas suspeito que
haja centenas ou milhares de olhos d’água desaparecidos pela invasão agressiva
do homem e seus processos produtivos e, outros tantos, ignorados.
Hoje em dia, raramente o uso da água pela espécie
humana é feito colhendo-a na fonte. É do meio do rio que tiramos a água ou das
represas que o detêm. As formas de manter a boa qualidade da água que brota
pura da nascente são variadas. Mas, entre todas, por hábitos culturais da
civilização moderna, confia-se naquelas de limpeza da água por processos
químicos.
A ocupação do solo, seja pela expansão urbana, seja
pela atividade produtiva, agrícola ou industrial, afeta a qualidade da água
pela inumerável variedade de dejetos que chegam direta ou indiretamente aos
córregos e rios.
As formas mais simples e menos onerosas para manter a
qualidade da água foram ensinadas por gregos e romanos há milênios. Os
aquedutos romanos monumentais colhiam as águas para uso da população, de longas
distâncias, diretamente dos mananciais que jorravam das rochas.
O respeito à vegetação nativa ao redor das nascentes e
cursos d’água, pequenos ou grandes, é a forma natural de preservar a qualidade
da água. A ênfase necessária que se está dando ao enquadramento dos cursos
d’água superficiais (classe 1 a 4), da menos poluída à mais imprópria, revela,
em diferentes regiões, o grau de ignorância e irracionalidade do homo sapiens na densa ocupação do solo e
no uso inadequado das águas. Perdeu-se a sabedoria natural e instintiva de servir-se
da natureza.
Uma das consequências é, necessariamente, o custo
crescente das tecnologias usadas pelos órgãos públicos para manter a qualidade
desejável do uso da água pela população que a natureza oferece gratuitamente a
todos os seres vivos.
Pagamos caro o que poderíamos ter de graça.
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