terça-feira, 24 de maio de 2011

SEJA FELIZ

No rebuliço causado entre as elites culturais de distintos matizes com a publicação do livro – POR UMA VIDA MELHOR – (Heloísa Ramos), como é comum no tratamento dos chamados grandes temas nacionais, a população alvo da palmatória gramatical ficou alheia. Colunas e crônicas de jornais e redes eletrônicas caíram em defesa da virgindade da língua, das regras e leis gramaticais que, como outras, nunca pegaram nesse país como costumava dizer um ex-presidente. Lei é lei. A lei existe. Tem que existir e, se possível e conveniente, será observada. A impunidade faz parte da lei ou da conveniência?

– A senhora é contra as regras e leis gramaticais e ortográficas? – perguntei a minha diarista?

– Ah! Meu senhor, do jeito que as coisa tá, as leis só vale pros pequeno.

Nesta resposta, a realidade gramatical e a realidade política não deixam dúvidas. A leniência linguística nascida nas ruas das cidades, nos fundões da pátria, na mescla de índio, negro, português, italiano, árabe ou japonês e na precariedade de nossas escolas acompanha a leniência política. Ambas formam a variedade de comportamentos, diversidade de costumes, desigualdades gritantes e discriminação preconceituosa.

Outras colunas e crônicas se apressaram em proteger os fora da lei sem esconder o complexo de pobrismo. Os fora da lei gramatical também têm direito à felicidade sem medo de esses e concordâncias nem temor da polícia armada das academias literárias. Trata-se de livrar a linguagem popular do complexo de inferioridade inconsciente diante da escorreita e impecável expressão vernácula dos privilegiados do sistema ortográfico. É a briga constante contra o irremovível e rochoso preconceito social.

“A classe dominante – diz o livro – utiliza a norma culta principalmente por ter maior acesso à escolaridade e por ser um sinal de prestígio.” E, para acalmar o complexo de culpa literário, acrescenta: “Por isso, um falante deve dominar as diversas variantes porque cada uma tem seu lugar na comunicação cotidiana”.

O telefone tocou.

– Alô! Minha mãe taí? É o Diogo.

– Tá. Rapidinho.

Ao despedir-me da diarista, perguntei-lhe:

– Quando é que você se sente feliz?

– Sou feliz quando chego em casa e posso cuidar de meus filho e das minhas coisa.

A felicidade linguística feita de plurais sem esses, de verbos no singular e pronomes oblíquos sujeitos da ação faz parte do cotidiano da imensa maioria da população antigramatical de nosso país. No Brasil, a unidade federativa convive com as variantes linguísticas, a diversidade cultural, a teimosa desigualdade social e a discriminação sorridente, mas com a esperança inabalável de uma vida melhor.

2 comentários:

Nilo Geronimo Borgna disse...

Sou seu seguidor adorei seu texto, gostaria de partilhar com o Sr o Meu " Ali o Palocci e os 40 aloprados! " em Http://ativismocontraaidstb.blogspot.com
Continue sempre assim!!!
Nilo Borgna:
Principio de igualdade:
Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer
dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação econômica, condição social ou orientação sexual.
Artigo 13* da constituição da República Portuguesa
NGB
Http//ativismocontraaidstb.blogspot.com
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Anônimo disse...

Caro Nilo,

Esses acima e fora da lei estão chocando o ovo da serpente. O poder os está corroendo por dentro, gastando-lhes o caráter e a dignidade.

Como faz falta um Cícero no Senado!

Um abraço

Eugênio