sábado, 30 de outubro de 2010

BORBOLETAS




Identidade é o que faz uma coisa ser da mesma natureza de outra. Do latim “idem”, que significa igual, o mesmo. É um conjunto de circunstâncias que fazem uma pessoa ser essa tal pessoa. A cédula de identidade, em geral, contém os dados que comprovam ser tal pessoa a que está diante de nós.
A confrontação da identidade é importante na vida social e política para se crer e julgar a pessoa por seus pensamentos e atos. A identidade individual garante que fulano seja julgado nos tribunais, na responsabilização maternal ou paternal, na legitimidade da liderança política ou em qualquer outro ramo da atividade humana ou societária.
É comum, no exercício da política, não dar total ou muita importância ao princípio da identidade. Seria até um ato de delírio esperar de um político ou candidato o comportamento da lógica matemática que exista entre dois elementos (a = a), isto é, poder igual a ideário partidário.
Dostoievski é o mesmo escritor de Os Irmãos Karamázovi, de O Jogador, de Os Demônios e de O Idiota. Um político, porém, sofre transformação e metamorfose em seu pensamento, em seu discurso, em seus atos e até em seu caráter. No curso de sua vida, rumo ao poder de legislar, decidir e executar os voos da bela e colorida borboleta, o político pode estar em contradição com a lagarta ou o casulo, suas formas primitivas. O político, ou o candidato a político, já não se identifica consigo. Ele toma a forma do poder e das circunstâncias que identificam o político com as virtudes do posto cobiçado.
Ao longo dessa metamorfose, o político guarda reminiscências de sua identidade ocultas no casulo e quem aparece é a borboleta. Palavras ardilosas foram criadas pelas borboletas em sua ânsia de pousar sobre as flores do poder. E, aos poucos, graças a elas, as características da lagarta e do casulo ficam submergidas nas fases primitivas.
Entre essas palavras está a massa operária ou, simplesmente, massa. Supõe-se que a massa não tenha identidade individual. É a multidão de lagartas idênticas umas às outras dispostas a pelarem uma árvore para garantir a vida efêmera da borboleta. O pobre ou a pobreza, o rico ou a riqueza dão outras características para ressaltar a nobreza da borboleta. Era uma reles e humilde lagarta e, hoje, pousa sobre flores para chupar o néctar do poder.
No período eleitoral, o processo da metamorfose política se presta à habilidade dos ilusionistas. Não raro, se não regra, os candidatos escondem cuidadosamente seu período de lagarta, isto é, o que pensavam e o que diziam do poder e de sua ambição futura de borboletas políticas. A flor do poder fez a borboleta mudar de opinião sobre o sabor do mel, a fragilidade de suas asas e a brevidade de seu reinado político.
Em época de eleições, pelo escasso conhecimento biológico da metamorfose e transformação dos candidatos, é difícil atinar se estamos votando na lagarta, no casulo ou na borboleta.
A borboleta política corre o risco biológico de se tornar um espécime teratológico, produto de distintas lagartas que desfolham, previamente, a árvore do poder.

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