quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

PRESENTE SEM PASSADO

A melhor e a mais eficaz arma protetora da psique brasileira é a capacidade inata e bem cultivada de esquecer os acontecimentos do dia anterior.
É com esta astúcia do esquecimento que se resolve facilmente qualquer dificuldade no presente. O passado é morto. O ontem não mais existe.
As águas levaram os móveis e a casa. Há de se começar tudo de novo. Brutal realismo. E quase sempre no mesmo lugar e da mesma forma. O presente é o imediato, o agora. Há que se acreditar logo, sem olhar para trás. Muito menos para frente. O futuro é hoje. Seu peso é o dia a dia. Chora-se e ri-se hoje. As lágrimas ou o prazer de ontem fugiram da alma e dão lugar a outras tristezas e possíveis alegrias.
Decepções e esperanças nascem e morrem num giro diário do sol. Carpe diem. Um dia é suficiente para chorar as mágoas e gozar das malícias e astúcias. A noite varre em silêncio e na escuridão a história da alma.
É com esta arma do esquecimento que os políticos contam. Eles também suprimem o passado e trazem para o hoje novas esperanças, ambições, desejos e tentações que cabem no presente. Nem o poder político nem o povo brasileiro gastam mais de um dia do ano para administrar túmulos. E se for preciso chorar o passado, as lágrimas serão no presente, com outro sabor, com lembranças difusas e até com a sagaz mentira dos sentimentos que dão ao hoje o que faltou ao ontem.
E o passado surge como enorme e fantástica mentira. As pessoas não disseram o que afirmaram e não realizaram o que fizeram. Desaparecem nomes e fatos. Despem-se da importância que se lhes dava e apequenam-se diante da grandeza da mentira presente. Tudo pode ser dito e feito de outra maneira para que apareça no presente como fato novo, revestido de esperança sob a qual se esconde a mentira em forma de verdade incontestável.

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