sábado, 29 de novembro de 2008

SÓ RINDO

Chega de choro. Houve tempo em que se dizia “quem não chora, não mama”. Pensava-se que a choradeira era um dos bons caminhos para se conseguir a atenção do governo para as dificuldades dos que estavam mais longe do poder.
− Com o tempo, me disse Pedro de Montemor, cansei de chorar. Pus-me a rir. Rir de tudo, especialmente das piadas diárias que ouço pelo rádio e pela TV. Piadas sérias, ditas por celebridades financeiras, senadores, deputados e pela mais alta autoridade do país.
Montemor tem razão. É saudável rir e gargalhar. Quando ouço o ministro da fazenda, vestido a caráter, de olhar turvo, vaticinando o futuro de nossa economia robusta, tenho crises de riso.
Quando os comentaristas econômicos da Globo News afirmam que a bolha imobiliária já vinha de 2007 e estava na cara que ia explodir, só não sabiam onde e quando, morro de rir.
Quando leio que os deputados distritais do DF cortaram gastos de cafezinho para melhorar a segurança dos brasilienses, estalo numa sonora gargalhada. E, quando votaram um aumento da verba de gabinete, manchei a folha do jornal com uma cusparada que saiu com risada mefistofélica.
Quando ouvi o senhor Lula recomendar à população mais pobre que se endivide para comprar geladeiras, televisores e computadores para socorrer as indústrias, tive um acesso de riso incontido e quase perdi o fôlego. E ao anunciar mais alguns bilhões de reais na conta das montadoras e agências de automóveis para facilitar o financiamento do sonho do brasileiro não controlei os esfíncteres.
Quando li a notícia da concessão de milhares de hectares na Amazônia a interessados comprometidos com o meio ambiente para deter o desmatamento e reduzi-lo a zero, fui vítima de um ataque de incontinência urinária provocada pela explosão da gargalhada.
Onde, antes, encontrava motivos para me indignar, chorar e denunciar, agora me assalta incontrolável obrigação de rir.
Poderá alguém não chorar de tanto rir quando os governadores de Brasília afirmam que vão tornar inteligente o sistema de transporte, abrindo retornos, levantando viadutos, duplicando e triplicando avenidas?
Poderá alguém deixar de rir quando propõem levantar muretas ao longo os eixos para impedir que os pedestres não sejam massacrados pela fúria insana dos condutores?
Poderá um brasiliense conter a ironia do riso quando os administradores de Brasília prometem – de novo - humanizar as passagens subterrâneas que ligam as quadras 200 com as 100?
Telefonei a Pedro de Montemor para lhe contar que a área do Setor Noroeste será reservada para moradias da nova classe média e que a juíza Gildete Balieiro acusou os indígenas Fulniô, Kariri Xocó, Tapuaya e Tuxá de serem invasores de terras públicas.
Respondeu-me com uma retumbante gargalhada cujas ondas sonoras se prolongaram por alguns minutos.
− É para rir, meu caro amigo. A vocação de palhaço é para provocar um saudável riso.
Lembrei-me de uma saudação corrente na velha Roma, quando os adivinhos se encontravam após abrir as entranhas das aves para ler o futuro dos crédulos imbecis: Risum teneatis amici? − Vocês conseguem segurar o riso, amigos?
Eugênio Giovenardi
28/11/2008

2 comentários:

Eduardo Jorge Soares Costa disse...

mUITO BOM SOOO... EITA MIJEI-ME. KKKKKKKKKKKKKKKKK. Adorei o texto. O mundo é uma palhaçada.

O OBSERVADOR disse...

Há palhaços em quantidades suficientes para fazer o mundo rir
Eugênio