terça-feira, 25 de novembro de 2008

CONSUMIR É VIVER

Telefonei a Pedro de Montemor. Ele publicou uma crônica sobre a obrigação civil de consumir. A desobediência será penalizada com um imposto do não-consumo.
A economia de qualquer país está condicionada, segundo as regras do capitalismo, ao intenso consumo de bens para estimular a produção agrícola e industrial.
Está implícito que o consumidor tem que arcar com o preço final da chamada cadeia produtiva para que se complete o circuito e o bem possa retornar ao mercado da esquina. É uma verdadeira cadeia com grades de proteção inabaláveis.
Há bens e bens. Os de sobrevivência são, de longe, os mais acessíveis e, muitos deles, podem ser colhidos gratuitamente em árvores, caçados nas florestas ou pescados nas águas. Parte dos bens de subsistência vem da agricultura tradicional e, a mais dispendiosa, da agricultura comercial.
Os bens de conforto ou supérfluos não absoluta, mas relativamente úteis ou até necessários, que facilitam a existência das pessoas, são os que, hoje, dominam a economia. Têm tal importância que os governos lhe dão prioridade sobre a educação e a saúde. A produção de automóveis é uma dessas que exigem todo o cuidado. Montadoras e bancos não podem falir. É um dos dogmas do moderno capitalismo.
Comentei com Montemor as declarações de Barack Obama e do senhor Lula. Ambos os presidentes não só estão preocupados com o futuro e o presente da indústria de automóveis, como se tornaram marqueteiros do setor. O senhor Lula incentivou o consumo desse bem com palavras paternais e uma expressão de advertência no rosto vermelho:
− Comprem, comprem, continuem comprando, se vocês pararem de comprar a indústria não produz e aí, sabe, vem o desemprego e, sem salário, ninguém mais compra.
− Lula tem pena dos industriais, disse Montemor, e apela para a solidariedade dos consumidores. Mas a maioria destes vai atrás de preços mais baixos da geladeira e do carro, numa atitude discriminatória.
− Eu fico triste com isso, respondi, Penso na alta tecnologia empregada na Ferrari, na Mac Laren e outras. O governo deveria estimular a compra dessas marcas com créditos especiais, favorecendo a nova classe média recém-tirada da letra D pelo IBGE.
− Seriam milhares de Ferrari e BMW pilotadas pelas amplas avenidas de Brasília por garis, diaristas, caixas de supermercados. Isso levaria os governantes a asfaltar as ruas de Santa Maria, Itapoã e Paranoá para receber esses novos hóspedes da cidade.
Os metalúrgicos dessas empresas, os pilotos da F1 e toda a escuderia que os pajeiam na hora da troca de pneus teriam garantidos seus empregos para alegria dos investidores.
Com uma indústria florescente de automóveis de primeira linha tecnológica, belos e velozes, faltaria ao senhor Lula, num rompante de improvisação, ordenar ao ministro da fazenda e ao da saúde que acabem com as filas dos hospitais. Os pacientes voltariam o quanto antes às agências de automóveis, aos supermercados e lojas de grife e, com créditos fartos disponíveis nos bancos, exerceriam sua liberdade e direito de consumir. Consumir e viver.
25/11/2008

Um comentário:

Luis Patricio disse...

É impressionante como a lógica está invertida. Essa escalada do consumo já demonstrou em várias situação que é insustentável.