sexta-feira, 18 de abril de 2008

MEU CORAÇÃO ESTÁ EM FALUJA

Lembrando os horrores
de nosso tempo sombrio
facilmente esquecidos
.

Meu coração está em Faluja, em Ramallah, em Bagdá, no Afeganistão, na Argélia, no Vietnã, no Sudão, na favela da Rocinha, em todas as favelas do Rio, de São Paulo, Salvador, Recife e Porto Alegre.
Meu coração está com as mulheres brasileiras de todas as favelas que não têm uma cama decente para dormir e amar.
Meu coração está com as crianças brasileiras de todas as favelas que nunca tiveram um berço limpo para dormir, chorar e mamar.
Meu coração está com milhares de crianças de rua que comem comida fria, cheiram cola, roubam e se corrompem antes de começar a viver.
Meu coração está com os adolescentes de todas as favelas do Brasil, jogados no inferno dos CAJES, humilhados, ofendidos, torturados ou chacinados nas ruas.
Meu coração está com os jovens de todas as favelas que aprendem na escola do crime, da droga e da prostituição a tormentosa lição do ódio, da vingança e da transgressão.
Meu coração está com as mulheres, os homens, as crianças de todas as favelas do Brasil, dizimados por epidemias, mal-atendidos nos Centros de Saúde, instalados nos corredores e enfermarias sujas dos hospitais, muitas vezes assassinados pela burocracia e ganância da indústria hospitalar.
Meu coração está com as crianças das humildes escolas de bairros, de pequenas cidades do interior do Brasil, molestadas pelo calor, pela pouca claridade da sala, pela falta de merenda escolar, humilhadas a repetirem sucessivamente a mesma série e deixarem a escola sem concluírem o curso primário.
Meu coração está com as professoras desconhecidas que ensinam as letras aos meninos e meninas do Brasil em troca de salários de fome.
Meu coração está com todos os trabalhadores e trabalhadoras que enfrentam um trânsito caótico e indisciplinado, apertados como sardinhas em lata, para construírem uma pátria grande em troca de um tugúrio.
Meu coração está com os idosos que, ridicularizados pelos doutores da Previdência, enfrentam corajosamente os males da idade e se submetem aos rigores da carestia com salários vilipendiados.
Meu coração está com os desabrigados brasileiros de todos os recantos do País devastados pelo desmatamento e arrasados pelas águas inocentes.
Meu coração está com todos os brasileiros vítimas do preconceito, da indiferença, do esquecimento, da hipocrisia dos governos, da ganância dos poderosos, do cinismo dos corruptos, da má fé de políticos mercenários, da barbárie do sistema econômico.
Meu coração está com os que defendem de alguma forma seus próprios direitos, mesmo transgredindo as formalidades da lei, que sempre protege os fortes e aprisiona os fracos.
Meu coração está contra aqueles que legislam para consolidar seus privilégios, aumentam descaradamente seus próprios salários e negam o mesmo benefício aos mais pobres.
Meu coração está com todos os moradores das favelas do Brasil que amanhecem com medo da violência e da morte, com o temor de serem despedidos do trabalho, com a incerteza do pão de cada dia.
Meu coração está com os pobres invisíveis que nos rodeiam nos semáforos, nos estacionamentos, nas portas das igrejas, pedindo as sobras do nosso luxo e os centavos de nossas poupanças.
Meu coração está com as empregadas domésticas, escravas da classe A, tão próximas de nossa vida que não lhes conhecemos o barraco, nem as angústias, nem as agruras da família, nem sentimos vergonha de que se levantem às cinco horas da manhã para chegarem a nossa casa quando mal acordamos.
Meu coração está com os desempregados que a fúria financeira do Banco Mundial, do FMI e da globalização pantagruélica desalojou do trabalho, separou dos amigos, semeando desespero em suas famílias.
Meu coração nada mais pode fazer, além de pulsar com todos os corações da histórica Bagdá, da corajosa Faluja, da atônita Ramallah. do valente Vietnã, do misterioso Afeganistão, de todos os intrépidos brasileiros a quem lhes restam as alegrias do carnaval e a loucura esperançosa do futebol.

Nenhum comentário: