sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

SUSTENTABILIDADE



A revista Veja publicou edição especial (dezembro 2010) sobre sustentabilidade. Uma boa iniciativa e um bom começo de quem usa papel para estimular o consumo de produtos danosos à Natureza. Entre outros anúncios para a sustentabilidade está o do “carro verde do ano”. O termo se presta a contradições. Sustentabilidade está frequentemente associada a uma “estratégia” de negócio competitivo.
Petróleo ou etanol são, hoje, combustíveis antagônicos e competitivos, alternativos ou devem ser substituídos por outros? Quando? Em que tempo? Quem começa a substituição? Qual produz lucros imediatos? O tempo, o espírito do tempo. O tempo termina? E se não houver mais tempo?
São questões que Veja não pode responder. Mas adverte: A Terra está no limite. Apesar da publicidade incluída na edição especial de equipamentos que exigem mais e mais “recursos naturais do planeta”. E acrescenta: “uma Terra já não é suficiente”.
Estamos no vermelho desde o final da década de 1970. Em 2007, a população mundial exigia, de forma assimétrica, recursos de uma Terra e meia para satisfazer suas ambições de consumo. Devíamos, portanto, ao universo, meio planeta. Para pagar essa dívida estima-se a população mundial teria que diminuir o consumo de um terço até 2030. Assim, uma Terra só seria suficiente para a atual população. Quer dizer, em vez de gastar R$ 100, o cidadão sustentável deveria restringir seu consumo a R$ 65 e poupar R$ 35.
Quem? Eis a questão nunca definida. Quase dois terços da população do planeta são pobres, desempregados, miseráveis, sobreviventes da fome crônica. A ONU estimula projetos para minorar a miséria e a fome em quase todos os países do Hemisfério Sul. Os governos de países emergentes, para se manter no poder, sustentam suas campanhas políticas em programas de eliminação da miséria de milhões de pessoas. O alvo é levá-las a consumir mais e melhor para lastrear o crescimento econômico.
Quem, então, deverá reduzir o consumo em um terço? O primeiro passo será vencer as contradições que envolvem a sustentabilidade, isto é, garantir pão para toda a população mundial todos os dias do ano. Há que se escolher entre prioridades: alimento ou automóvel, moradia segura ou celulares. Todas ao mesmo tempo para todos, no ritmo atual, é trafegar na contramão da sustentabilidade.
Ao aceitarmos a presente forma de consumo africana, que implica explorar 1,4 hectares por habitante, o planeta pode sustentar 9,6 bilhões de pessoas. No modelo de consumo latino-americano, usando 2,6 hectares por habitante, a população mundial poderia atingir 5,2 bilhões. Mas, se o exemplo a seguir for o decantado padrão dos EUA e do Canadá, utilizando 7,4 hectares por habitante, só haverá lugar para 1,7 bilhões de cidadãos no planeta.
Quem? Eis a questão. Quem está disposto a reduzir em 35% o consumo de bens para garantir a vida humana e a de todas as espécies vivas no planeta Terra?
Veja aprecia os dez mandamentos. É um número fácil. Nele cabem as principais dificuldades e facilidades para enfrentar problemas. Para provar que o desenvolvimento é compatível com sustentabilidade, mesmo crescendo em ritmo chinês, Veja oferece em dez itens um novo jeito de viver. Repito, já é um bom começo para as intenções da revista e para manter seus negócios competitivos de informação semanal.
Então, entre outros, estão: Substituir sacolas de plástico pelas de papel. Fazer xixi no banho. Abolir a carne na dieta. Deixar de imprimir documentos (não a revista nem os cadernos de publicidade de automóveis ou da Petrobrás). Trocar o carro a gasolina por um elétrico. Quem se dispõe a seguir esta receita?
A revista arrola, depois, dez mitos que dificultam, comprometem e atrasam os efeitos benéficos sobre a sustentabilidade. Cito, entre outros, o que Veja considera mitos: Ninguém realmente sabe o que significa sustentabilidade. É sinônimo de verde. Significa reduzir o padrão de vida. Depende dos consumidores e militantes, não do governo. Custa muito caro. O cerne do problema é a superpopulação mundial. (Superpopulação não é mito. É realidade. Não se falaria em sustentabilidade se não houvesse população.)
Se o tema sustentabilidade chegou a uma edição especial de importante revista semanal, sustentada por cadernos de caríssima publicidade de itens que ameaçam os recursos naturais, conclui-se que a consciência ecológica e ambiental começa a despertar do sono de acomodação e indiferença.
Mas, enquanto não se estabelece na política econômica mundial, baseada em altas taxas de crescimento, QUEM deve reduzir o consumo, sustentabilidade ou desenvolvimento sustentável serão apenas palavras obrigatórias em documentos oficiais.

Nenhum comentário: