terça-feira, 13 de julho de 2010

O QUE ENTRA NO PIB?

Liga-se a TV, à noite, para conhecer as novidades e as decisões políticas e esportivas do dia. Depois de anunciar e detalhar em pormenores macabros o crime da semana, para não esquecer que nosso país e a humanidade resistem em sair do Terceiro Mundo, os âncoras nos remetem às bolsas, ao câmbio e ao PIB.
Suavemente, passa-se do esquartejamento de um corpo jogado aos cães às conquistas econômicas, à produção e venda de automóveis. Para melhor compreensão dos 142 milhões de analfabetos funcionais, os apresentadores mencionam percentuais positivos, comparando os avanços de um trimestre a outro. Tudo acaba no PIB. O que me intriga nesses anúncios da corrida insana do crescimento econômico é saber o que entra no PIB.
A (o) jornalista, com um tom de sabedoria e competência na voz, lembra que o PIB é a soma de toda a riqueza produzida no país. Riqueza bruta.
Perguntei ao Bio, dono da banca de frutas na esquina de minha quadra, se ele tinha ideia do que entra no PIB.
− Ali, está tudo, respondeu com desprezo, mas é o bruto, tirando a tara, fica o líquido.
Tenho certeza de que nem o sindicalista Lula nem o ministro Mantega pensaram nisso: o Produto Interno Líquido.
Levei o mamão para casa. Descasquei, Joguei a casca e as sementes no lixo orgânico. Diante do mamão descascado, comecei também a tirar a tara do PIB, seguindo a sacada do Bio.
Lembrei apenas alguns acontecimentos dos últimos meses. Milhões de reais, também chamados mensalões, foram desviados para cuecas, bolsas e bancos no exterior. Há bilhões escondidos em grandes empresas, em empreiteiras que superfaturam obras públicas e sonegam ao fisco. Parte da encosta desceu em Paraty sobre uma pensão e várias casas de luxo, mortes, perdas materiais. Logo em seguida, Niterói foi cenário do deslizamento de um lixão sobre o qual havia centenas de casas. Foi arrasado. Cidades do interior de São Paulo, jóias culturais do Império que desapareceram, certamente têm contribuído ao PIB com bilhões. Há poucas semanas, Pernambuco e Alagoas perderam duas dezenas de cidades, varridas pelas águas do Mundaú. Essas calamidades produzidas por fenômenos naturais devem ter retirado do PIB alguns bilhões de nossos impostos e das economias das vítimas. Nos noticiários, o PIB continuou em alta.
Mas, em nenhum momento, os comentaristas econômicos e jornalistas de renome subtraíram a tara de nossas riquezas perdidas e nos disseram qual é, depois de todos essas perdas humanas e materiais, o Produto Interno Líquido.
Com o devido respeito, convido-o a rir com desprezo desse cacoete jornalístico de enfiar diariamente o dedo no nariz do PIB. Para alívio dos 75 milhões de beneficiários do Bolsa Família e melhor compreensão sobre os rumos do PIB, ofereço a esclarecedora lição de nosso colunista econômico do Correio Braziliense.
“O Relatório de Inflação do Banco Central projeta crescimento alto (PIB) e IPCA em queda com pequeno ônus da Selic.”
Obrigado pela sintética e preciosa informação. Falta, agora, dizer ao Bio qual é o tamanho de nosso Produto Interno Líquido.

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