terça-feira, 27 de julho de 2010

O MONSTRO DA RODOVIA

O automóvel foi elevado pela civilização do consumo à categoria de sonho. Conduzir e ser conduzido em alta velocidade já iludiram Ícaro e o devolveram à realidade do chão. Nas estradas tombam filhos, pais, irmãos, pedestres e animais incautos.
Acidentes de trânsito e outras falhas técnicas têm raízes no descompasso entre a rápida evolução dos equipamentos automotorizados − tecnologias avançadas − e a lenta capacitação das pessoas em operá-los.
A tecnologia é baseada em leis físicas e os equipamentos − da roda da carroça ao avião − a elas estão sujeitos. Velocidade, peso, altura, volume somam se à lucidez do operador, seu estado mental e físico, suas pressões emocionais, psíquicas, culturais. Esse conjunto de circunstâncias estará presente na operadora de telefonia ou do computador, na mão do médico, do pedreiro, do tratorista, do jovem que dirige o carro de seu sonho.
Unir velocidade com estradas bem ou malsinalizadas, pouca experiência do condutor ou desconhecimento do sistema de freios do veículo, as consequências são previsíveis. De mais a mais, o trânsito na cidade ou nas rodovias compõe um sistema complexo do qual faz parte transcendental o condutor. Insistir nas multas, na educação geral para evitá-las, no cumprimento mecânico das regras, no combate ao alcoolismo não têm tirado do Brasil o título de campeão de mortes no trânsito.
Há limites de poder entre qualquer máquina e seu operador. A lei da inércia, por exemplo, pode ter mais poder de ação, em certas circunstâncias, do que o condutor de um veículo. A ambição, a demonstração de status social, a tentação da velocidade, qualquer outro impulso humano fora de controle não paralisa o funcionamento da lei da inércia. Um segundo inercial pode ser o fim de um sonho.
É de se perguntar aos funcionários do DETRAN, aos proprietários de autoescolas e instrutores sobre sua preocupação com o conhecimento das leis físicas ao dar permissão para dirigir um automotor. Ensinar sinais de trânsito e a ler placas é uma parte apenas do sistema e se referem aos truques para evitar multas e contravenções formais. Por trás das placas, normalmente invisíveis, ignoradas e até destruídas, estão as leis físicas em pleno funcionamento.
Elas são desobedecidas por descuido, distração e ignorância, por inabilidade, por perturbação da mente provocada por vários fatores − alteração emocional, consumo exagerado de álcool, pressa ocasional ou crônica, vaidade juvenil, demonstração incontrolável de poder. Não basta, pois, entusiasmar-se com a evolução tecnológica. Os avanços do conhecimento e da capacidade de uso desses gigantescos equipamentos são imprescindíveis e são a base da sabedoria.
Na dúvida, não ultrapasse, diziam antigamente as placas. Na dúvida, não dirija. Aperfeiçoe sua capacidade para manejar um equipamento subordinado a leis físicas. Você é a parte mais importante do sistema de trânsito.

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