quarta-feira, 14 de abril de 2010

MORROMOTOS

O Brasil está deitado eternamente em berço esplêndido sobre uma placa geológica firme, infensa aos movimentos tectônicos, dizem os sismólogos. Não sofremos com terremotos. O Brasil só tem morromotos. Nossos morros são frágeis e sensíveis, não aguentam maus tratos por muito tempo.
Contam-se mais de 250 deslizamentos de morros no Rio de Janeiro, em Niteroi, em Salvador, em Santa Catarina. Não bastassem os morromotos, a montanha de lixo, sobre a qual se instalou a nova classe média, veio abaixo. As pedras que sustentam o Cristo do Corcovado nunca foram consultadas e ameaçam desprender-se.
Nossas cidades, inclusive Brasília, estão superpovoadas. A população avança pelas clareiras ainda disponíveis. Incrusta-se nos morros, desloca pedras, abre fendas, desnuda o solo. Nem a natureza, nem os administradores têm capacidade para acomodar uma superpupulação nas bordas de uma cidade.
As medidas de contenção de encostas sugeridas por urbanistas são ditadas pela natureza. Chamam-se árvores. Elas foram sacrificadas em nome do progresso, do crescimento econômico, da ampliação do consumo. Os morromotos são fenômenos pós-modernos. Chegaram com os avanços da tecnologia, das estratégias empresariais, do planejamento estratégico e programas de aceleração do crescimento.
O superpovoamento desorienta as administrações municipais, estaduais e federais. Os acontecimentos de Niteroi, Rio de Janeiro e Bahia escancararam a imprevidência geral, a displicência da população e a negligência governamental na observância das leis que regem os comportamentos urbanos.
A cegueira política que afeta a visão dos administradores da coisa pública aponta os morromotos e as chuvas como culpados da tragédia humana. A coisa pública mais evidente é a natureza esplêndida que nos serve de berço e de túmulo.