terça-feira, 20 de outubro de 2009

SETOR NOROESTE

“Dizer que o Noroeste é o primeiro bairro ecológico é apenas um elemento de marketing,” afirmam em artigo minucioso o coordenador do Setor Noroeste Paulo Zimbres e o professor da UnB Geraldo Nogueira Batista. O grosso caderno de publicidade, propaganda e marketing com 24 páginas do Correio Brasiliense (18.10.2009) vai além da afirmação dos arquitetos.
Assisti a conferências, discussões e seminários sobre a conveniência do adensamento urbano da capital. Participei de reuniões específicas sobre o Setor Noroeste, li entrevistas de autoridades governamentais, empresários e políticos em defesa da expansão e do crescimento de Brasília. Reiteradamente, cita-se em apoio ao novo setor, e só a ele, o relatório do Dr. Lúcio Costa – Brasília Revisitada. Parece que, nesse relatório, não há outro item importante à exceção da proposta da área noroeste para expansão da cidade.
Atrevo-me a afirmar que se as demais propostas e recomendações contidas no Brasília Revisitada tivessem sido tratadas com o mesmo emprenho governamental, o mesmo dinheiro, a mesma capacidade de engenheiros e arquitetos do projeto Noroeste, a diligência da Câmara Legislativa, a firmeza dos órgãos ambientais e a celeridade dos tribunais de justiça, Brasília teria um rosto melhor cuidado. Não seria essa terra de ninguém onde cada um faz o que bem entende, do puxadinho aos quiosques, das ocupações irregulares aos gabaritos de 30 andares.
Um bairro ecológico se caracteriza pela capacidade da natureza em repor com a mesma velocidade e intensidade a riqueza natural explorada e consumida pelos habitantes que ocupam uma área de terra. No cômputo desses habitantes não figura apenas o homem. Ele será, ali, minoria. Levará consigo poderosos artefatos que competirão com a maioria dos habitantes originais da área, atacados minuto a minuto pelo exacerbado consumo do homem. Água. Os 40 mil moradores tirarão dali 14 milhões de litros diários para uso direto. Milhares de árvores, plantas e arbustos com volume hídrico apreciável serão erradicados e deslocados para outras áreas. Pássaros e milhões de insetos compõem o equilíbrio biológico e ambiental. “Alguns” indígenas absurdamente considerados invasores das terras brasileiras, ali radicados, terão que buscar outro espaço para sobreviver.
O fato de serem instaladas facilidades do progresso e novos artifícios para o conforto humano não caracteriza ipso facto o estado ecológico do bairro. A solução técnica, por mais acabada e defensável, não é necessariamente ecológica. A arte e a beleza paisagística podem ser uma estética maquilagem se não equacionarem o equilíbrio entre a oferta e o consumo da riqueza natural. A impermeabilização do solo com a construção de edifícios, avenidas, ciclovias, exigirá cuidados especiais para garantir a infiltração de águas pluviais e assegurar a recarga dos mananciais e aquíferos subterrâneos da área, sob o risco de secamento das bacias do Bananal e do Paranoá.
Chegará o marketing às cabeças dos novos moradores ou produzirá apenas efeitos imobiliários, status social e enriquecimento de construtores?
Cientes da moleza de nossas instituições e da presença constante de interesses secundários, os autores de FRUTO DE MUITAS CABEÇAS esperam que as flexibilidades anunciadas não desviem nem corrompam a “proposta tão esmeradamente desenvolvida”. Águas Claras e centenas de condomínios irregulares sobre a frágil área do Cerrado são fatídicos exemplos que gritam mais alto contra a insensatez do crescimento que impõe impagáveis custos ambientais na conta do conforto urbano desejado e da saúde humana ameaçada.

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