segunda-feira, 21 de setembro de 2009

TELEFONE CELULAR

O telefone celular incita seus usuários a falar. A maioria dos que o possuem não resiste à vontade de ligar a outro, amigo, cliente, subordinado ou chefe. São poucos os que preferem ficar sozinhos na rua, no ônibus, no metrô.
No ônibus, escutei historias engraçadas, tragédias amorosas, ordens severas a empregados via secretária, ameaças de não voltar para casa, desculpas por atrasos suspeitos, (no momento estou ainda no escritório e chegarei depois das 23 horas). Para onde iria esse ônibus?
Na calçada, encostada a um poste, a moça dizia que depois das 21 horas seria muito tarde. Eram 19 horas. Confirmei no relógio.
Há os que escondem o aparelho no bolso e o microfone na lapela. Caminham falando sozinhos, mostrando com a mão o tamanho de algum objeto ou a altura do edifício em frente do qual se encontram. Outros falam às minhas costas. Olho para trás, pensando que a conversa seria comigo. Eram insultos graves, acompanhados de gestos indecentes. Seria um exímio ator de teatro do absurdo. Andava rapidamente. De repente, parava, olhava para cima, levantava e deixava cair os braços, sacudia a cabeça e gritava para superar o tom do interlocutor em alguma outra rua, ou café, ou banheiro.
Um executivo, prestes a entrar no túnel que o conduziria ao avião, dava ordens terminantes, autoritárias, em tom agressivo, a um subordinado: “Tem que estar pronto até às 12 horas. Me manda o relatório por emêil. Tenho reunião às 14 horas”. Terminou a conversa bruscamente. Olhou para os lados para recolher os efeitos de sua autoridade. Eu pensei no subordinado e no que ele estaria pensando do chefe. Esses pensamentos não estariam no relatório.
A senhora, mais gorda que magra, de óculos escuros, cheia de colares e braceletes, grandes argolas nas orelhas, contestava os argumentos do credor. Recusava-se a pagar o montante e ameaçava a empresa com seu advogado, com o Procon, fecharia a conta fidelidade, devolveria o produto. Eram vários mil reais em jogo, somando o principal, os juros e a mora, que ela repetia com certo orgulho com ênfase na voz. “Dez mil reais”. Aborreceu-se com a resistência do credor e fechou o celular com ruído. Olhou-me e disse: “É incrível. São uns ladrões”.
Às vezes, saio à rua para ouvir histórias interessantes, fuxicos, fofocas, encontros marcados, rompimento de namoro. Em geral, a concorrente está ao lado. No restaurante, em poucos minutos, sabe-se de intimidades e costumes que antigamente eram comunicados no quarto, a dois. Aprecio os e as que falam rindo, gesticulando, olhando ao redor e, principalmente, os e as que gritam para que os outros ouçam seus segredos atrevidos.
Mas há os discretos que se limitam ao sim, sim. Não, não, Ou sim, é, não, não é, sim, foi. Eu ligo, eu ligo. Ciao. Beijos. Outro.

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