CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO
MUNDIAL ─ UM TABU
Eugênio Giovenardi, sociólogo e escritor
A superpopulação humana do planeta seja,
talvez, uma das principais dificuldades se não o principal obstáculo cultural
para erradicar a fome que, no século 21, assola um bilhão de pessoas; reduzir a
devastação generalizada das florestas; evitar as guerras humanas abertas ou
disfarçadas; enfrentar as mudanças climáticas em curso, fortemente provocadas
pela ação irresponsável da economia gananciosa. A redução do crescimento
demográfico em escala mundial é ainda um tabu político e ideológico de difícil
discussão na busca de uma orientação universal em benefício da biodiversidade
de seres vivos humanos e não humanos.
São necessárias
medidas racionais, em escala planetária, que indiquem a redução drástica do
crescimento populacional em favor da biodiversidade natural que garanta a
interação e a interdependência de todos os seres vivos humanos e não humanos. É
desumano esperar que as mudanças climáticas e seus incontroláveis fenômenos, as
guerras de extermínio humano e não humano, fome e pandemias virais encham o
mundo de dor, lágrimas e desespero.
A natureza não
é de esquerda e nem de direita. A natureza se fez vida e habita este
maravilhoso planeta. Fazemos parte ─ a espécie humana ─ desse milagre
existencial. Ser ambientalista ou ecologista é compreender a auto-organização
da natureza manifestada em diferentes ecossistemas. É participar da interação e
interdependência de todos os seres vivos humanos e não humanos numa convivência
social em busca do conforto natural universalmente desejado.
As vidas se
alimentam de vidas ─ proteínas, sais minerais, açúcares, água, oxigênio ─.
Viver é usar com parcimônia os bens necessários a todas as vidas, pois os bens
são limitados e finitos. A precaução no uso dos bens da natureza é uma virtude
basilar que orienta instintivamente os seres não humanos pela lei do controle
natural e alerta racionalmente a espécie humana. O equilíbrio no uso dos bens
da natureza depende fortemente do número de usuários e da intensidade do
consumo necessário de cada espécie para se reproduzir e sobreviver. A
superpopulação de uma espécie põe em risco todos os habitantes de um
ecossistema natural, por mais rico e abundante que seja. Todas as formas de
vida têm identidade. São sujeitos e não objetos dos quais se pode dispor,
decidir seu destino ou levá-los à extinção pelo uso demolidor do mais poderoso.
Os seres vivos
buscam naturalmente um relativo conforto para desfrutar a vida cercados de
fenômenos físicos incontroláveis. O nível de conforto e o consumo dos bens
naturais diferenciam o comportamento das espécies não humanas e o do homo sapiens. Ser ambientalista é
propugnar por um limite racional de conforto para toda a espécie humana. É
resistir à acumulação de bens pelo crescimento econômico a qualquer custo e dar
tempo à regeneração de ecossistemas em benefício da biodiversidade. A extinção
de espécies vivas ou a degradação generalizada dos ecossistemas pela ação
humana dificultam a interdependência dos seres vivos e geram desigualdade no
conforto e convívio da população humana.
O planeta que
abriga o milagre da vida é uma casa com espaço limitado, bens finitos e
contesta fisicamente a ação acumuladora e destrutiva da espécie humana. A arte
e a sabedoria humana se tornam mais grandiosas quando imitam a força e a
generosidade da natureza. Há, portanto, um limite a ser respeitado quanto ao
número de usuários não humanos e habitantes humanos no planeta. A cadeia
trófica tem uma lógica arrasadora para a sustentação humana. Maior população,
maior consumo de água, mais urbanização, mais solo para produzir alimentos
vegetais e animais que pressionam e até destroem ecossistemas.
Duas atividades
essenciais e necessárias ─ produção de alimentos e assentamentos urbanos ─
determinam manifestações culturais do comportamento humano nem sempre adequadas
diante do funcionamento das leis orgânicas da natureza. A produção de
alimentos, para bilhões de seres humanos e não humanos, sem restrições
racionais ao crescimento demográfico dessas populações, impõe substituição de
florestas, uso intensivo de água, nutrientes químicos ou industrializados,
defensivos tóxicos e poluidores do solo, da água e do ar. A urbanização, ao
longo e largo do planeta, se concentra ao redor de rios, mares e lagos,
modifica drasticamente as paisagens naturais, expulsa ou elimina os habitantes
naturais de ecossistemas, requer serviços de limpeza e higiene, centros de
recreação, de educação e saúde, de mobilidade e segurança social.
A redução
racional do crescimento da população humana, embora sugerida por demógrafos
desde a década de 1960 e orientada por organismos internacionais, é ainda um
tabu cultural e político. Propor a alegria da maternidade e o orgulho da
paternidade, com um ou dois filhos por casal, será uma decisão política sábia e
refletirá de maneira eficaz sobre a regeneração dos ecossistemas que abrigam
generosamente o milagre da vida no planeta.
5.9.2022
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