Daniel Paese, poeta gaúcho, companheiro e amigo de juventude
e de escola, escreve-me para contar reações sobre meu romance intimista – SILÊNCIO
– publicado em 2011. Informa-me que emprestou o livro a cinco leitores. Quatro não
entenderam ou não souberam interpretar as revelações do silêncio.
É revelador que apenas um quinto dos leitores tenha tido experiência
de caminhar com seu próprio silêncio. O personagem – Pedro de Montemor – caminha
o caminho da existência. Entra e sai do caminho. Ao longo desse caminho, dentro
de sua cidade onde tudo acontece, participa como hospedeiro de um memorial
desconexo, intermitente, interrompido por presenças não previstas. No silêncio
dos passos, à sombra das árvores de sua rua, de seu quarteirão, lembra-se de um
amigo que viajou, de cartas e mensagens que recebeu, circunstâncias que envolvem
pessoas conhecidas, fatos políticos que mudam a cidade, surpresas urbanas, a
loucura do trânsito, o livro que leu ou lê, os compromissos diários, o ontem, o
anteontem. Tudo desfila, sem preocupação cronológica, apenas numa sequência de associações.
Em geral, as pessoas não dão atenção a esse desfile interminável
de fatos que se sucedem em poucas horas de silêncio. O silêncio é perigoso e é
comum fugir dele. Bate na memória sem descanso. A gente, em geral, resume essa
sequência de forma telegráfica: “Ontem mesmo, lembrei de você, daquela viagem,
do enterro de fulano, da bebedeira de sicrano”.
Quantos fatos e palavras, olhares e sorrisos, lágrimas e
abraços se perderam. Só o silêncio solitário é capaz de pôr tudo isso num
caminho em que os fatos vão ficando para trás e a gente vai com toda a bagagem para
frente.
Pedro de Montemor caminha. Entra e sai do livro para
continuar o caminho.
SILÊNCIO não é apenas um romance. É um memorial.
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