João Carlos Taveira*
Todo autor almeja escrever um livro perfeito, mas poucos o conseguem. A tarefa é árdua e espinhosa, por iniciar-se além do mundo real e materializar-se no plano consciente e palpável da natureza humana. Mas Eugênio Giovenardi, neste caso, busca alcançar a proeza do intento com bons resultados. Embora não tenha conseguido de todo livrar-se de referências autobiográficas, contidas, aliás, em seus romances anteriores, neste livro da maturidade o autor de As pedras de Roma se enveredou pelas florestas obscuras do inconsciente e trouxe à luz a história de seres díspares criados à nossa imagem e semelhança; portanto, personagens de carne e osso — em toda a sua extensão física e psicológica. Com exceção de Lídice, que surge como um anjo e, como tal, desaparece, para ao fim e ao cabo da narrativa juntar-se ao protagonista, mas que em momento algum se entrega ao jogo ou controle de seu criador.
A ação se passa em Brasília e arredores, em cenários físicos e extrafísicos,
Na construção do romance, segundo palavras do próprio autor, combinam-se episódios verídicos e ficcionais. Ao redor deles, o silêncio fala de maneira intemporal. “O cérebro, envolto pelo silêncio interior e exterior, fabrica associações intermináveis, superpostas e contrastantes de fatos, palavras, gestos, atos e pensamentos, expectativas e desejos produzidos no passado, memorizados no presente e lançados ao futuro.” O silêncio é desordenado. As vozes interiores se atropelam e nem sempre respeitam a ordem e a sequência de sua origem. “A liberdade do silêncio libera o inconsciente e exacerba o consciente.” Toda essa história pessoal é personificada e projetada nos indivíduos e grupos que intermitentemente formam os laços da convivência social.
Eugênio Giovenardi, além de escritor, é também sociólogo, e sabe que a vida se situa mais dentro da visão de um Guimarães Rosa que da de um Paulo Coelho. E que os perigos são numerosos, principalmente para aqueles que trazem, desde sempre, as marcas de uma formação baseada nos princípios da fraternidade entre os homens, da liberdade inalienável do indivíduo, da igualdade de todos os seres humanos e — mais forte que tudo — do respeito a todos os seres vivos deste planeta. E isso parece bastante, mesmo quando colocado de maneira não muito marcada nos entremeios de uma narrativa ficcional pouco linear. De forma insistente e quase obsessiva, o silêncio — que para Montemor é um fim em si mesmo — atravessa as páginas do livro, sem deixar vestígios.
Brasília, 31 de outubro de 2011.
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*João Carlos Taveira é poeta e crítico
literário, e tem vários livros publicados.
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