sexta-feira, 17 de julho de 2009

MEIA-ENTRADA

− Duas meias, por favor, para o filme A partida.
Somos um casal preferencial. Atrás de mim, um jovem casal também pede duas meias-entradas para outro filme. Dou uma olhada para a fila que se estende por alguns metros. A noite é fria. Mulheres jovens de bota de pelica, casacos de lã, cachecol. Homens de casaco de couro. Ouço um senhor, alto, cabelo branco a pedir em voz alta:
− Duas meias. A mulher invisível.
Depois dele, dois estudantes com roupas de grife, também pediram duas meias.
A meia-entrada é um privilégio para estudantes com a finalidade educativa de ter mais oportunidades de aprender. Estudante pobre é uma expressão do passado, quando o Estado tinha obrigação de atender a toda a população jovem sem recursos para frequentar colégios. Hoje, estudantes de escolas caríssimas, filhos de famílias abastadas, enchem os estacionamentos das universidades com seus carros, gozam da meia-entrada de cinema. Pedirão amanhã meia-entrada para restaurante?
Para muitos idosos se justifica o benefício da meia-entrada. A razão é simples. Os avós estão, hoje, ameaçados de insolvência. Pagaram sua própria sobrevivência e, com frequência, sustentam filhos, netos, genros e noras. Não falo da classe idosa que pode instalar telões em suas mansões.
Num país em que os pobres e carentes, no discurso político e nos programas de governo, parecem inevitáveis e eternos, para quem se dá casa, pão e leite, bolsa família e renda minha, por que não se dá a eles o benefício da meia-entrada para o cinema e teatro?
Será suficiente encher a barriga dos pobres e carentes e deixá-los com a alma vazia para melhor dominá-los ou melhor enganá-los?

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