sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

PLANOMANIA

Na cultura burocrática da administração do Estado, nos níveis federal, estadual e municipal, a tarefa de planejar é divagação ao redor de um sonho cuja realização depende do acaso.
Os números sobre os quais se debruçam os planejadores aconteceram por força do destino. Não são os previstos nos planos anteriores nem os que se diz serem. Os números e percentuais a se incluírem no plano futuro dependem de sua estatura, beleza, tamanho e do impacto emocional capaz de sacudir a alma desse ente imponderável chamado sociedade, ou opinião pública ou povão pouco afeito a milhões e bilhões.
Um número redondo, grosso, difícil de entender, tipo bilhões ou trilhões, além de fugir a qualquer controle dos serviços da fiscalização e, portanto, passíveis de se perderem pelos ínvios caminhos das obras, servirão de base ao discurso oficial e à retórica do crescimento econômico.
Não raro os planos são um roteiro seguro do que não vai acontecer no tempo previsto. Essa tática é a garantia de outro plano corretor que supera o anterior em sagacidade e esperteza. A realidade é outra, pois é dinâmica. Esse dinamismo não foi previsto. O plano, portanto, deve ser outro.
É comum esconder-se no plano a possibilidade, quando não a probabilidade, de ações contrárias à Lei Orgânica, conflitantes com a Constituição, mas concordantes com os interesses múltiplos manifestados por empresários, investidores, legisladores que recebem gentilmente a anuência, a complacência, a conivência e a cumplicidade dos administradores públicos.
O fato é que nossa cultura burocrática é fascinada e obcecada por planos e programas, acolitados por grupos de apoio, comissões de alto nível, conselhos especiais, equipes de controle e avaliação. Embora o Nordeste seja campeão de planos e programas nacionais e internacionais, prefiro mencionar a experiência vivida em Brasília e no Distrito Federal.
O arquiteto e urbanista Lúcio Costa apresentou ao presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira o magnífico projeto de construção da nova Capital e deixou, como baliza, o Plano Piloto. Usou a palavra monumental de forma consciente. Prédios, avenidas, quadras residenciais, a arborização, a natureza do Cerrado obedeceriam ao conceito de monumento a ser diariamente admirado por seus moradores e visitantes. O plano executado mereceu a distinção de Patrimônio Cultural da Humanidade, consignado pela Unesco.
O monumental foi, ao longo do tempo, se degenerando e, hoje, atinge o trivial e o ordinário. Voltamos ao casebre, ao puxadinho, à barraca. A leveza desejável do transporte coletivo, transitando entre monumentos, deu lugar a engarrafamentos nervosos que impedem os olhos de admirar a cidade-parque. Essa mudança do monumental ao trivial foi dirigida pelos subsequentes planos, cada um com sua denominação gozadora, diletante, pretensiosa.
Ei-los: Plano Estrutural de Organização Territorial do DF - PEOT (1978), Plano de Ocupação Territorial – POT (1985), Plano de Ocupação e Uso do Solo - POUSO (1986), Brasília Revisitada (1985-87), pela equipe de Lúcio Costa, diante da sanha modificadora dos legisladores, empreiteiros imobiliários; Plano Diretor de Ordenamento Territorial - PDOT, (1992), revisado em 1997 e adaptado à trivialidade imobiliária, nos estertores de 2008.
O conceito de Brasília – cidade-monumento, parque e arte – é substituído pela tendência corriqueira do crescimento urbano dominado pela volúpia imobiliária.
A cidade-monumento, no próximo plano, se restringirá à Esplanada dos Ministérios e, o gramado central se transformará num monumental estacionamento administrado por centenas de cuidadores de automóveis.

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