sexta-feira, 19 de setembro de 2008

O PODER DA PERIFERIA

Brasília é uma cidade plantada numa vasta região do Planalto Central. Seriam essas terras do Centro-Oeste ocupadas independentemente da urbe? Os novos habitantes mirariam a cidade de longe, esperando um oráculo político sobre as sérias decisões econômicas da Marcha para o Oeste? Tornar-se-ia uma cidade-arte, sagrada e perdida, no meio do Cerrado sem vínculos culturais com a região?
Ou, ao contrário, a região do oeste goiano, expandindo-se como nova fronteira agrícola, agroindustrial, extrativa – minerais e madeiras − moldaria e inundaria a cidade de Brasília, transformando-a numa metrópole necessária à sustentação dos novos empreendimentos? Geraria e imporia, segundo suas conveniências, decisões políticas aos administradores manietados pelas forças externas?
Em resumo, a cidade definiria os destinos da região ou a região decidiria a existência, a forma e a função da cidade-capital?
Brasília, trazendo para seu bojo o poder político das decisões econômicas e todo o aparato legislativo, judicial e de defesa nacional, poderia sobreviver no isolamento de cidade-capital, operando apenas como sinalizadora do desenvolvimento regional, sem imantar às suas paredes uma população ávida de escapar à pobreza e participar das regalias da corte?
Um sonho urbanístico, equipado com penduricalhos imprescindíveis da máquina administrativa, voltado apenas para o repouso do poder silencioso, restrito aos ofícios próprios de cabeça da Nação, poderia subsistir como cidade-parque num país de população pobre e desempregada, malformada e analfabeta? O sonho não estaria sob a ameaça de um pesadelo?
Essas perguntas me transportam à periferia do Plano Piloto e aos transbordamentos populacionais que circundam o Distrito Federal, em terras de Goiás. Uma população que se reproduz com maior intensidade nos agrupamentos mais pobres e, portanto, de maior pressão sobre todos os serviços urbanos.
Brasília, aos cinqüenta anos, parece ter perdido o mando sobre si e não possuir força para se proteger dos vizinhos. Seu poder de urbe foi suplantado pela pressão massiva de uma superpopulação que a invade e domina, sentada nos degraus de suas portas, exigindo, impondo, sugando sem retribuição, não por rebeldia, mas por inépcia.
Um Governador leva a administração central para fora do Plano Piloto e um Presidente compra um avião para estar em todos os lugares do mundo e pouco em Brasília. As declarações de defesa e proteção de Brasília, como Patrimônio da Humanidade, são arrotos da boca para fora.
A cidade Brasília está sendo rejeitada de dentro para fora e de fora para dentro. Interesses divergentes procuram moldá-la para atender a propósitos conflitantes na essência, embora convergentes em funções administrativas.
Mais uma vez, o superpovoamento das áreas contíguas a Brasília gera imposições e degenera o diálogo entre a pureza do urbanismo e a crueza das necessidades da população. Dois milhões e meio de habitantes, alheios ao sonho urbanístico de uma cidade-parque, sufocam as ruas do Plano Piloto. Um milhão de carros reclama diariamente a remodelação das vias. A refundação de Brasília é uma tentação que sacode os ânimos de administradores, legisladores, governantes e empresários, excitados pelo poder da periferia que manda de fora para dentro.
As decisões são concebidas lá fora, com o apoio entusiasta e devastador de poderosos aliados. Amadurecidas, codificadas e legalizadas aqui dentro, são implacavelmente executadas.
As conseqüências inevitáveis e os efeitos negativos justificam-se com argumentos da tecnologia, do crescimento, da imposição da realidade, isto é, a superpopulação exige casa, água, luz, emprego, rodovias, estacionamentos, melhores salários para consumir mais, indefinidamente.
A cidade de Brasília chegou a um impasse. As ameaças que caracterizam as metrópoles brasileiras estão às suas portas.
A declaração profética de Juscelino Kubitscheck: − Façamos o “supérfluo” agora. O necessário virá de qualquer maneira, no seu tempo − parece estar em curso.
A determinação e o dimensionamento do necessário deveria ter provocado, a seu tempo, respostas inteligentes de urbanistas, arquitetos e planejadores da economia regional.
Os fatos de hoje são os erros de ontem e podem ser os acertos do amanhã, se amanhã houver..


16.09.08

2 comentários:

Eduardo Jorge Soares Costa disse...

Sem falar nas políticas de gestão dentro do serviço público, imposta por maus gestores que só pensam em perpetuar no setor. E as invasões de terceirizados, que com isso, gera-se uma prostituição funcional endêmica.

O OBSERVADOR disse...

Encontro Cultural
Obrigado pela visita e pelos comentários pertinentes.
Esses poderes sõ solidários entre si, se completam.
Eugênio