CUSTO DA
REGENERAÇÃO
Nestes
dias, o governo brasileiro discute se mantém ou não o acordo com a Noruega e
Alemanha que oferecem alguns bilhões de reais ao Fundo da Amazônia destinados à
preservação das florestas originais.
A
floresta amazônica, antes de pertencer ao Brasil, à Colômbia e ao Peru, faz
parte do planeta Terra, assim como as florestas da Europa, da Ásia e da África
devastadas pela espécie humana nos últimos 15 anos. No Brasil, o contínuo desmatamento da
Amazônia empobrecerá o planeta e extinguirá boa parte da biodiversidade
necessária à reprodução da vida. Diga-se o mesmo de todos os demais biomas que
formam o ambiente natural do planeta.
A
preservação da biodiversidade e o lento processo de regeneração, frente à
exploração destruidora da espécie humana para a própria sobrevivência, têm um
alto custo de reposição e requerem um tempo muito maior ao da destruição.
Destrói-se em meia-hora o que a natureza leva anos para regenerar. É comum
dizer-se que para cada Real gasto em devastar são necessários cinco ou mais para
recompor o tecido da natureza afetada. Entram, então, dois elementos
fundamentais no processo de regeneração: custo e tempo.
Como
calcular o custo e determinar previamente o tempo, ambos necessários para a
lenta regeneração vegetal e recomposição da biodiversidade de um bioma?
Relato,
neste documento, minha experiência de 45 anos acompanhando o lento processo de
regeneração vegetal e recomposição da biodiversidade de uma área de 70 hectares
(700.000 metros quadrados).
Nessas
quatro décadas e com o dinheiro invertido, pude conhecer, compreender e
colaborar com o processo lento de regeneração. As condições climáticas são
determinantes para a regeneração e para empreender ações cooperantes.
Os
primeiros dez anos de contato com a área devastada foram de aprendizagem, de
observação, de choque de realidade. O ponto crucial, nesse período, foi
perceber as reações da biodiversidade frente às decisões culturais e
tradicionais da ação humana dirigidas a explorar a oferta da natureza: solo,
água, madeiras, aves e animais.
Os
resultados catastróficos decorrentes de queimadas, do desmatamento, da
introdução de animais vorazes se revelaram na redução da água, na ineficiente
infiltração das águas pluviais, na desertificação estrutural da área. Diante
desses efeitos nefastos, nos anos seguintes, interrompeu-se essa corrente
antiecológica. Impediram-se queimadas com aceiros protetores e pediu-se, para
isso, a colaboração de vizinhos. As áreas de possíveis mananciais foram
protegidas e consideradas indevassáveis. Um sistema planificado de contenção de
águas da chuva foi implantado mediante centenas de barramentos consecutivos nos
canais de esgotamento natural e grotas ao longo e largo da área. Retiraram-se
os animais domésticos de grande e médio porte (vacas e ovelhas) considerados
predadores eficazes da vegetação.
Impedidas
as queimadas, e graças ao sistema de contenção de águas pluviais, o período de
chuvas sobre a área pacificada fortaleceu, nos primeiros vinte anos, o colchão
de gramíneas, multiplicou e expandiu a vegetação.
Auxiliado
pelas barragens de contenção, um novo sistema de captação e detenção de águas
da chuva se estabeleceu com a expansão da população vegetal.
Passadas
mais de quatro décadas, o processo de regeneração vegetal se consolidou.
Voltaram os pássaros, aninharam-se e se multiplicaram em mais de uma centena de
espécies graças ao aumento da alimentação provinda de frutas, sementes e
multiplicidade de insetos. Animais que haviam perdido seu habitat, como gatos
selvagens, coelhos, raposas, quatis, saguis, tatupebas, mão-pelada,
macaco-prego se refugiaram nas matas ciliares e/ou sobre árvores frutíferas.
Tucanos, jacus, curicacas pernoitam sem medo sobre as grandes árvores próximas
às casas de moradia e, ao mesmo tempo, compartem a comida de patos e galinhas..
Espécies
arbóreas como cajazeiras, jacarandás, jatobás, aroeiras, sucupiras, embiruçus,
angicos, mama-de-porca, copaíbas, guapevas, pequizeiros, ingazeiras, jequitibás
e outras se agigantaram e deram um ar de floresta especialmente nas partes
baixas do Sítio. A formação de húmus resultante do apodrecimento de folhas e
gramíneas aumentou e melhorou a oferta alimentar com apreciáveis resultados no
desenvolvimento vegetal.
Um
passo importante na recuperação regenerativa do bioma é a integração de todos
os componentes da biodiversidade, incluído o predador principal – o homo sapiens.
Novas
decisões adequadas à regeneração do bioma, novos comportamentos inteligentes e
apropriados derivam dessa compreensão da biodiversidade integrada.
Um
novo período de paz vegetal, de tranquilidade e silêncio se consolida pela
força do armistício que sinaliza o fim da guerra entre o ser humano e a
natureza.
Esboça-se
um novo olhar sobre a natureza.
O
custo da regeneração se compõe de tempo, de compreensão do sistema natural, de
colaboração de todos os componentes da biodiversidade, de recursos técnicos,
cognitivos e financeiros.
As
peças do orçamento aqui apresentado, com as correções de lei, funcionam há
quarenta e cinco anos.
ORÇAMENTO ANUAL - 2018
ITENS
|
VALOR
R$
|
Administração
|
19.882,00
|
Impostos
|
5.103,00
|
Limpeza,
coleta de lixo
|
4.860,00
|
Manutenção/barragens
60h x 20,00 reais
|
1.200,00
|
Aceiro
anual
|
2.000,00
|
Desobstrução/trilhas,
córregos.20h x 20,00 reais
|
400,00
|
Transporte/combustível
|
5.760,00
|
TOTAL
|
39.305,00
|
Custo
por hectare
|
559,90
|
NOTA:O investimento realizado para acompanhar o processo de regeneração
e preservação é de origem particular,
sem apoio de órgãos oficiais ou outras fontes.
Área
do Sítio – 70 hectares – 700.000 m2
No
ano 2018, a área do Sítio recebeu 1.700 mm de chuva, somando 1 bilhão, 190
milhões de litros de água, com aproximadamente 75% retidos na vegetação e
barramentos, facilitando a recarga dos aquíferos e consolidando os mananciais.
(Informações
mais detalhadas sobre o paciente esforço da natureza em encontrar o tempo de sua
regeneração encontram-se em alguns livros que publiquei sobre o tema: A saga de um Sítio, O retorno das águas, As
árvores falam, Ecossociologia, Reencontro – o que aprendi da natureza, Uma obra
em verde. Ecologia).
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