segunda-feira, 28 de outubro de 2024

AS DUAS FACES DO CERRADO

 

AS DUAS FACES DO CERRADO

 

Aprendi, aos 40 anos, que o Cerrado tem duas faces ecológicas. Uma seca, outra molhada. Sol e água. Compreendi, observando os efeitos do Sol, na face seca e a importância da água, na face molhada, a sabedoria cooperativa de interação e interdependência entre ambos para a manutenção e regeneração do bioma Cerrado e seus múltiplos ecossistemas. Detive-me a ver, durante dez anos, centenas de metros cúbicos de água descendo por grotas, lavando o solo queimado, arrastando pedras, paus e folhas para o Ribeirão das Lajes. Percebi, aturdido, que a face seca clamava pela face molhada. A inteligência ambiental me iluminou. Levantei, com a colaboração de outros braços, mais de uma centena de pequenas barragens para guardar no solo as lágrimas torrentosas da face molhada. O segredo da manutenção e a regeneração da grandeza e beleza do Cerrado, disse-me a inteligência ambiental, é captar e guardar as águas da chuva. Tudo o mais, a natureza faz. Ela tece, com alegria e liberdade, a teia da vida humana e não humana com experiência de bilhões de anos. Por isso, deixei-me invadir pela inocente felicidade vegetal.

Ontem, dia 27 de outubro, celebramos os 50 anos de liberdade conquistada pelos 70 hectares da Biocomunidade do Sítio das Neves, festejamos aniversários de árvores centenárias e bicentenárias, prestamos homenagem póstuma a um angico cinquentão, tetravô, atropelado por um raio.

A paz e a felicidade arbórea contagiaram os olhos e as mentes de todos nós.

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