segunda-feira, 19 de novembro de 2018

A NATUREZA PEDE PAZ




A NATUREZA PEDE PAZ


Um alerta à espécie humana do planeta Terra.

Si vis pacem, para bellum.
Se queres a paz, prepara a guerra, diziam os romanos.

A longa, larga e profunda experiência no curso de contínua evolução da espécie humana indica, em nosso tempo, a busca da paz. Além da guerra que a espécie humana trava, há milênios, contra si, negligentemente descuida também das relações de interdependência com a natureza. Então, hoje, a recomendação à espécie humana é: se queres a paz, prepara a paz.
Um armistício, um pacto de paz com a vida engloba a biodiversidade do planeta na qual está inserido o ser humano. Só um limitado pacto de paz para evitar guerras entre os povos, discriminação de todos os tipos, preconceitos e desigualdades não terá efeito duradouro se os outros componentes da biodiversidade – fauna, flora e água – ficarem sob o controle discricionário do ser humano. O planeta é um só e a casa é comum a todos os seres vivos que integram a biodiversidade.
A natureza quer paz. O pacto de paz deverá abranger todas as formas de vida. Dotada de cérebro capaz de associar e elaborar todas as informações recebidas dos cinco sentidos e expressar seus pensamentos pela palavra, a espécie humana terá que se dispor a um pacto de paz com a natureza. A paz com a natureza, isto é, com a sustentação da biodiversidade, é o melhor senão o único meio de sobreviver no universo como espécie consciente. A espécie humana é uma unidade de um corpo interplanetário no qual circula o mesmo sangue existencial. 
Penso em três fatores básicos que podem concorrer para um pacto de paz ecológico. O primeiro fator a considerar é a superpopulação humana no planeta que arrasta consigo a superpopulação de animais domesticados. A reprodução dessas populações produz um impacto devastador sobre a sobre a natureza e a reprodução necessária da biodiversidade.
Os números apresentados no relatório Planeta Vivo (Fundo Mundial para a Natureza – WWF) são amedrontadores: 20% da floresta amazônica já foi queimada ou destruída. De 1970 a 2014, 60% dos animais vertebrados desapareceram no mundo. Na zona do Caribe e América Latina, os números são aterradores. Em 44 anos, 89% dos vertebrados foram sendo dizimados. Entre 2000 e 2014, o mundo perdeu 920 mil quilômetros quadrados, superfície similar ao tamanho da França e Alemanha.
“Não pode haver um futuro saudável e próspero para os homens em um planeta com o clima desestabilizado, os oceanos sujos, os solos degradados e as matas vazias. Um planeta despojado de sua biodiversidade.” (Marco Lanbertini, diretor-geral do WWF)
Todas as espécies vivas se servem de elementos comuns oferecidos pela natureza de nosso planeta: água, ar, sol, terra, ao longo das estações do ano. Sabiamente, a natureza estabeleceu um sistema predatório de controle do crescimento e da reprodução de espécies que garante o equilíbrio natural.
A única espécie que pode reproduzir-se além das possibilidades de sobrevivência é o homo sapiens. A evolução do cérebro e de sua capacidade de ordenar e administrar os elementos da natureza lhe deu a errônea percepção de que tudo o que existe está somente à sua disposição. Desprendeu-se do conjunto da biodiversidade e assenhoreou-se das riquezas do planeta. Sua capacidade de transformar, de produzir alimentos, abrigos, máquinas e armas estimulou a rapidez da própria reprodução causando quase insuperáveis condições de sobrevivência à global biodiversidade da qual depende e à qual pertence.
A espécie humana, diferentemente das outras espécies animais, tem a capacidade de decidir sobre os limites de sua reprodução biológica. Esta decisão lhe permite estabelecer as condições de prosperidade, conforto, bem-estar para sua descendência nas próximas décadas.
O controle consciente do crescimento populacional da espécie humana, contido na simples taxa de reprodução, seja talvez condição imprescindível para a sustentação da biodiversidade e o pacto de paz com a natureza. Não há que ignorar o impacto da superpopulação num momento em que ondas de emigrantes deixam suas casas, seus países, seus laços culturais em busca da sobrevivência e de paz social.
O segundo fator, ligado ao primeiro, que pode dificultar o pacto de paz com a natureza é a necessidade cada dia maior de produção de alimentos para a subsistência de bilhões de pessoas, hoje malnutridas, oferta de abrigos e de tecnologias diversificadas para o conforto humano. A produção de alimentos, o desmatamento contínuo, o uso abusivo da água, a disseminação de venenos (pesticidas, agrotóxicos atacam indiscriminadamente a biodiversidade) a poluição dos mananciais, rios e oceanos são uma arma constante contra a sustentação da biodiversidade. A perspectiva de o planeta ter que alimentar 10 bilhões de pessoas na década de 2040 é assustadora. Há que se considerar o longo tempo necessário à natureza para regeneração de florestas devastadas. O tempo da natureza não é o tempo do relógio. A extinção definitiva de milhares de espécies, praticada pela ação humana, silenciou nossas matas.
Mudanças climáticas e o aquecimento do planeta concorrem para aumentar as dificuldades de produção de alimentos e põem em evidência os limites de bens e riquezas do planeta. Em 2030, a demanda de água será 40% maior do que a disponibilidade para a preservação da biodiversidade e da sobrevivência humana.
O terceiro fator que se atravessa no caminho da paz com a natureza é a crescente urbanização. Mais de 80% da população mundial vive em cidades, muitas delas em caótico estado administrativo. Milhares de agrupamentos humanos se assemelham a imensos aviários, com espaço limitado para se mover e respirar. As melhores áreas a beira-mar, vales férteis, margens de rios, mananciais provedores de água foram desertificados pela impermeabilização, por estradas, viadutos, edifícios, aeroportos e milhares de equipamentos que, em realidade, aprisionam as pessoas.
Administrações municipais, ao redor do planeta, enfrentam sérias dificuldades de abastecimento de água aos cidadãos, quando não inundadas por tempestades imprevisíveis. Entre tantas estão a cidade de São Paulo (Brasil), Cabo (África), Pequim (China), cidade do México, Tóquio (Japão) e Moscou (Rússia). É evidente a dificuldade de prover água aos cidadãos, de ampliar o tratamento de dejetos, de esgotos e da despoluição de rios e oceanos. A contaminação do ar se tornou um vetor de doenças infantis e da população idosa.
Ressalte-se a incapacidade cada dia mais evidente de administrar grandes populações, consolidando a divisão de ricos e pobres, empresários afortunados e subempregados. Desigualdade e pobreza não comportam paz.
O pacto de paz com a natureza depende da generosa compreensão da biodiversidade, dos limites de oferta de bens naturais do planeta, da lenta regeneração de áreas degradadas, do necessário reflorestamento, da proteção de florestas ainda existentes, da preservação de mananciais, reuso de águas e incorporação de fontes alternativas de energia.
O pacto de paz com a natureza é possível porque a espécie humana é capaz de pensar, de sentir, de ir além do desfrute material e de perceber o pulsar da vida presente em todos os seres.
14.11.2018


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