sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

CARTA À ÁRVORE



Hoje, fui a um cartório a fim de solicitar o registro legal de tua existência. É tua certidão de nascimento que se confunde, frequentemente, com a de óbito. Mas, sem ela, não te posso proteger nem tens direito natural de viver. Nada temes mais do que o machado, a motosserra e o fogo insano.
As leis que obrigam ao registro de terras que te deram vida e a certidão que reconhece tua existência estão impressas em tiras brancas extraídas da carne de árvores abatidas. A mesa sobre a qual se apoia a mão que te legaliza é feita de postas de tuas irmãs sacrificadas contra as leis e os registros de cartório. A cadeira na qual senta a autoridade que generosamente te concede a liberdade condicional de existir saiu de pedaços de tua carne.
Enfim, precisamos do papel, da mesa e da cadeira, retirados de teu corpo, para dar-te existência legal. Dobro-me à evidência de que parte importante de nossa efêmera vida, às vezes feliz, depende de ti. Tu serias feliz sempre, mesmo sem nós.
Emprestas teus galhos para descanso de aves e trepadores, para os ninhos de pássaros e pouso de borboletas.
Acolhes, à tua sombra amena, o peregrino caminhante ou o animal sôfrego e cansado.
Guardas a água da chuva abundante em tuas ramadas e umedeces o ar que respiramos.
Enches a atmosfera de oxigênio para conforto de todos os pulmões.
Cobres de verde nossos vales, nossas montanhas e garantes o borbulho das nascentes que nos dão a água de cada dia.
Aqui está, árvore do meu Sítio, o registro que te outorga existência legal nesta minúscula área de proteção permanente, onde nasceste livre e, indefinidamente, poderás viver.

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