segunda-feira, 22 de abril de 2024

64 ANOS DE BRASÍLIA

 

64 ANOS DE BRASÍLIA

 

Moro em Brasília, há 52 anos, numa superquadra da Asa Sul. Dia a dia se torna mais evidente que a monumental Brasília, formosa em sua originalidade, afasta e exclui, sem pena, grande parte da vida natural do mesmo ecossistema que generosamente abriga os humanos. Brasília impôs, com o beneplácito de organismos internacionais e nacionais, a supremacia da obra humana, sua corajosa, genial e disciplinada arquitetura, quase suspensa no amplo espaço do Planalto Central. Mas, a devastação do ecossistema do Planalto Central também é obra da genialidade humana. A vegetação nativa que é a essência e a beleza do Cerrado, garantidora das nascentes de água, está sendo cruel e insensatamente extinta.

Brasília, como “urbis” e “cívitas”, parece não ter compreendido a natureza. Os agrupamentos Sol Nascente e Pôr do Sol são testemunhas vivas dessa incompreensão. A expansão de Brasília dominou e modificou a natureza, empobreceu o ecossistema e mutilou a biodiversidade. O humano e o não humano se desconhecem. O humano pende sozinho do galho da árvore da vida e rompe as relações sociais com os frutos não humanos, uns expulsos, outros extintos. A urbanização impiedosa desflorou a natureza em benefício do “anthropos” e rompeu a teia frágil da vida que une, no mesmo espaço geográfico, seres humanos e não humanos. Brasília, cidade-parque e, ao mesmo tempo, cidade-do-automóvel -  se tornou um jardim público no qual seus administradores e seus cidadãos se dão o direito de meter a mão e plantar sua flor preferida. Confesso que, em certos dias e diante de altas e técnicas decisões jurídicas, administrativas, econômicas e ambientais vomitadas sobre Brasília, me sinto como um caçador Neandertal em plena Esplanada dos Ministérios.

 

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