64 ANOS DE BRASÍLIA
Moro em Brasília, há 52
anos, numa superquadra da Asa Sul. Dia a dia se torna mais evidente que a
monumental Brasília, formosa em sua originalidade, afasta e exclui, sem pena,
grande parte da vida natural do mesmo ecossistema que generosamente abriga os
humanos. Brasília impôs, com o beneplácito de organismos internacionais e
nacionais, a supremacia da obra humana, sua corajosa, genial e disciplinada
arquitetura, quase suspensa no amplo espaço do Planalto Central. Mas, a
devastação do ecossistema do Planalto Central também é obra da genialidade
humana. A vegetação nativa que é a essência e a beleza do Cerrado, garantidora
das nascentes de água, está sendo cruel e insensatamente extinta.
Brasília, como “urbis” e
“cívitas”, parece não ter compreendido a natureza. Os agrupamentos Sol Nascente
e Pôr do Sol são testemunhas vivas dessa incompreensão. A expansão de Brasília dominou
e modificou a natureza, empobreceu o ecossistema e mutilou a biodiversidade. O
humano e o não humano se desconhecem. O humano pende sozinho do galho da árvore
da vida e rompe as relações sociais com os frutos não humanos, uns expulsos,
outros extintos. A urbanização impiedosa desflorou a natureza em benefício do
“anthropos” e rompeu a teia frágil da vida que une, no mesmo espaço geográfico,
seres humanos e não humanos. Brasília, cidade-parque e, ao mesmo tempo,
cidade-do-automóvel - se tornou um
jardim público no qual seus administradores e seus cidadãos se dão o direito de
meter a mão e plantar sua flor preferida. Confesso que, em certos dias e diante
de altas e técnicas decisões jurídicas, administrativas, econômicas e
ambientais vomitadas sobre Brasília, me sinto como um caçador Neandertal em
plena Esplanada dos Ministérios.
Nenhum comentário:
Postar um comentário