A esmagadora maioria dos que vieram morar em Brasília o fez por mil razões compreensíveis, menos por querer habitar conscientemente numa cidade-parque.
Parque da cidade ou
cidade-parque? Este último é um aposto que identifica a cidade de Brasília, capital da República
Federativa do Brasil. Brasília cidade-parque é Patrimônio Cultural da
Humanidade.
Há parques famosos,
uns mais conhecidos do que outros. Distinguem-se por si mesmos e têm vida e luz
própria. Jardim de Luxemburgo, Paris, criado pela rainha Maria de Medici. O Hyde
Park (Londres), o National Park (NY) estão entre os mais conhecidos. São
parques, praças e ruas que compõem o conjunto das cidades em que se localizam
como a Place Clichy (Paris) ou 5ª Avenida (NY).
Brasília é diferente
e única. Brasília é o parque. O morador de Brasília vive no parque, embora
tenha um parque suplementar; o Parque da Cidade. Diz-se que no Brasil tudo
acaba em pizza. Pela nossa inconstância crônica, pelo jeitinho esperto, fácil e
preguiçoso, a cidade-parque não passou dos limites do Plano Piloto.
O sonho de Lúcio
Costa, ao projetar a cidade-parque sugerindo árvores majestosas consorciadas a outras
menores, começou com o equívoco consciente de arrasar as espécies nativas e
extinguir a biodiversidade vegetal já adaptada nesta região há milênios.
A escala bucólica
ganhou duas faces: a periférica nativa, sujeita a fogo e a lixo e a arborizada
em torno da escala residencial. Ao incluir no projeto urbanístico as escalas
gregária e monumental, a cidade-parque ganhou a primeira poda conceitual. Os
edifícios monumentais da Esplanada, longa, horizontal e gigantesca não deveriam
ter sua majestade molestada pela trivial galhada de árvores plebeias.
Com a consistente e
persistente imagem urbana de que Brasília é essencialmente o Plano Piloto, e
pelo efeito pizza, os bairros ou cidades-satélites não foram abrangidos pelo
conceito de cidade-parque.
Presumo que a
esmagadora maioria dos que vieram morar em Brasília o fez por mil razões
compreensíveis, menos por querer habitar conscientemente numa cidade-parque.
Não é de estranhar que os habitantes de Brasília, seus administradores, todas
as energias econômicas e políticas disponíveis tentem adaptar a cidade ao
cidadão e não conciliar o cidadão ao conceito de cidade-parque. Um conflito
quase insuperável. Assim, a grande maioria dos habitantes de Brasília trocou
apenas de cidade. Trata-se a cidade-parque com métodos e comportamentos velhos
e roceiros. Transferem-se para Brasília os vícios e as virtudes da cidade de
origem. Para o moderno habitante de Brasília, árvore, facão, machado e motosserra
têm tudo a ver.
Para mascarar a
ignorância sobre o novo conceito de cidade-parque inventam-se termos:
engessamento, puxadinhos, adensamento, PPCUP, LUOS.
Em conclusão, o
conceito internacionalmente reconhecido de cidade-parque monumental deveria ter
gerado, desde seu início, um órgão administrativo com autoridade e poder autônomos,
como o Ateliê de Planification Urbaine de Paris (APUP). Esse órgão técnico
garantiria a consistência e a permanência do equilíbrio entre urbanização e
parque, e o intercâmbio saudável entre a vida humana e a vida vegetal.
O essencial
urbanístico, em Brasília, que identifica o cidadão brasiliense e sua
organização, é preservar a nova forma de convivência social e a beleza
acolhedora da cidade dentro de um parque tão essencial quanto a cidade. Falta
incluir todos os bairros de Brasília – as cidades-satélites – no conceito de
cidade-parque.
11.4.2014
Um comentário:
Onde surgiu o conceito de cidade-parque? Me parece um conceito burgues, das cidades que estava cada vez mais distantes das áreas não antropizadas. Tenho a impressão não ser apenas de Lucio Costa esta ideia...
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