Brasil, Rússia, Canadá,
China, Indonésia e Colômbia abrigam metade da água doce do planeta. Só o Brasil
possui 12% de toda a água doce. Por ironia da natureza ou por sua sabedoria, há
muita água onde pouca gente mora e pouca água nas regiões mais povoadas.
Esta distribuição geográfica
da água é um risco permanente. Qualquer erro humano que cause dificuldades ao
curso das águas, as populações são afetadas por secas, por inundações ou por
degeneração da qualidade da água. Em São Paulo, 6 a 7 milhões de pessoas
ficaram, em 2014, sem água por longo período. Em Minas Gerais, a atividade da
mineração por empresas ligadas à Vale causou não só a morte de pessoas e
animais como a degradação quase mortífera do Rio Doce. A lama dos minérios foi
semeando a morte ao longo de vales e rios. Conclui-se que não é suficiente ter
grande quantidade de água. É preciso que ela chegue igualitariamente, todos os
dias, a todas as pessoas e que sua qualidade garanta a saúde da população.
De onde vem a água? O ciclo
da água é uma rotina da natureza: evaporação do mar e das florestas, formação
de nuvens e chuvas que se armazenam nas nascentes, nos rios que voltam ao mar
para retomar o ciclo.
A oferta de água é um ato
exclusivo da natureza e obedece ao funcionamento do ciclo antes descrito. O que
todas as formas de vida necessitam é a disponibilidade diária de água. Como
todos os seres vivos, a espécie humana se fixa nas proximidades das fontes,
cursos ou reservas de água.
As árvores penetram suas
raízes na terra em busca de água, mas também abrem caminho para a infiltração
das águas da chuva que reabastece os aquíferos. As águas dos aquíferos brotam
nas nascentes e formam riachos, rios e lagos. É das florestas e das águas que
milhares de espécies de animais obtêm seu sustento para a reprodução da vida.
O abastecimento de água
oferecido à população pelos órgãos públicos se origina de represas ao longo de
rios ou diretamente deles. A espécie humana, principalmente nos últimos 15 mil
anos, aprendeu a construir reservatórios de água. E, nas últimas décadas,
monstruosas barragens mudaram o fluxo natural dos rios. Vastas regiões foram
inundadas, causando alterações no clima com frequentes desastres ambientais. O
crescimento explosivo da população e as formas diferentes de organização social
desembocaram em estratagemas econômicos para a alimentação e reprodução da
espécie humana.
As florestas, os rios e o
mar se revelaram insuficientes para alimentar a vida no planeta. A devastação
das florestas para produzir alimentos em favor da espécie humana extinguiu a
fonte nutritiva de muitas espécies que, há milênios, constituíam a base da
interdependência dos seres vivos.
No entanto, foi com o
advento da produção agrícola irrigada – Revolução Verde – que grandes, longos e
caudalosos rios passaram a correr secos em alguns períodos do ano e até para
sempre. O Indus e o Mekong, na Ásia, o Colorado e o Rio Grande, nos Estados
Unidos da América, e dezenas de rios, no Brasil, correm secos por longos
trechos ou simplesmente desapareceram.
Hoje, no Brasil e em outros
países, há regiões que dependem quase só da água da chuva. As principais ofertas
de água são a chuva e o degelo. A estratégia mais inteligente que se possa
administrar para garantir a disponibilidade de água é captar essas águas quando
se apresentam. Mas, para isso e ao mesmo tempo, reflorestar intensa e
ordenadamente os espaços para que parte das águas voltem aos aquíferos de
reserva subterrânea.
Há que distinguir, no manejo
da água, aumento da oferta de aumento da disponibilidade da água com qualidade necessária
à saúde humana.
A oferta da água é
inelástica e está a cargo da natureza. O ciclo das águas e o regime de chuvas é
variável, mas a quantidade é a que o planeta guarda em seus armazéns sem
intervenção humana. A oferta de água não tem mercado cativo. Destina-se
indistintamente a todas as espécies vivas. A espécie humana é única que pode
alterar o uso dessa oferta e causar a morte de outras espécies pelo
direcionamento exclusivo a seus interesses. A mão humana, na prática de suas
atividades econômicas, sociais e de saúde, é capaz de construir reservatórios
para facilitar a distribuição da água aos usuários. Para essa função de levar
água a quilômetros de distância, o ser humano abre poços a grandes
profundidades, interrompe o fluxo dos rios ou os desvia. É de se notar que
essas represas monstruosas não se destinam só ao abastecimento de água. Geram
eletricidade. São áreas de lazer e esporte e fontes de alimentação humana.
Sobre as consequências
ambientais e ecológicas dessas barragens há estudos científicos e manifestações
de habitantes expulsos de suas terras que demonstram a atitude autoritária da
espécie humana sobre si mesma e outras formas de vida.
A mais complicada
dificuldade humana de prover-se regularmente de água é o próprio crescimento da
população ao longo e largo do planeta. A sobrevivência e a reprodução da
espécie humana dependem de sua limitada capacidade de abastecer-se de água a
qualquer distância em que dela se encontre. Em segundo lugar, dependem de sua
limitada capacidade de produzir, sem água, o variado cardápio de alimentos
necessários à manutenção de suas funções orgânicas. As proteínas e vitaminas
animais e vegetais demandadas pela população mundial dependem fundamentalmente
do uso de água.
No Brasil, não são só os 204
milhões de habitantes que usam diariamente água potável. Os 212 milhões de
bovinos, outros milhões de ovinos, caprinos e aves domésticas juntos consomem
rios de água que ingerimos na forma de carne. (Alguns milhões de bichos de
estimação requerem importante volume de água para distintas finalidades.) O que
sobra para plantas e para toda a variedade da fauna é cada vez menos.
Qualquer ação destinada a
compreender e respeitar a essência ecológica do planeta – água – deve incluir
medidas que controlem o crescimento populacional da espécie humana. Em
consequência, diminuir-se-iam milhões de consumidores de água mantidos vivos
para desfrute humano. Em outras palavras, com menos consumidores de carne
animal teríamos menos rebanhos secando florestas e rios. É bom lembrar que para
produzir um quilograma de carne bovina se necessitam 15 mil litros de água.
Compra-se água virtual e invisível extraída de fontes desconhecidas da maior
parte dos que clamam por água na torneira.
A preservação do ambiente
não corre risco por parte de beija-flores, borboletas e peixes do mar e dos
rios. O risco e o fato de se extinguirem vidas se originam na espécie humana. A
busca do equilíbrio populacional é uma obrigação da espécie humana consciente e
deve ser de seu interesse. A interdependência de todos os seres vivos é uma lei
natural compreendida por todas as espécies que formam a cadeia trófica.
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