A paranoia tomou de assalto a liberdade de ir e vir do
brasiliense. Há ladrões, assaltantes, sequestradores e drogados em cada esquina.
Mas, contra todas as expressões de medo das pessoas
entrevistadas, vítimas ou não, de que não se pode mais sair à rua de dia ou de
noite, os bares e restaurantes andam lotados.
As filas nos bancos e caixas de supermercados são
cansativas e irritantes.
As agências de automóveis nunca venderam tantos carros
alvos de sequestradores.
Os shoppings borbulham de curiosos e consumidores
compulsivos.
Os estacionamentos, em qualquer ponto da cidade, não
oferecem vagas e o papel dos desempregados é alinhá-los em filas duplas,
triplas ou quádruplas.
Mesmo que o Distrito Federal seja palco de vinte
assaltos por dia, ainda assim nosso sistema de vigilância, proteção e repressão
se revela falho, ineficaz, ineficiente e sem competência social. A população do
Distrito Federal (2,6 milhões), toda a organização burocrática do governo com
suas dezenas de secretarias, polícia civil e militar, empresas de vigilância privada,
zeladores e porteiros de prédios são dominados diariamente por 20 meninos e
adolescentes, gênios da astúcia, da argúcia e do destemor.
A solução tecnológica proposta é a câmera vigilante
como detetive auxiliar para localizar o ladrão depois do roubo executado. Onde estão
as câmeras? Nos bancos, nos hotéis, nos shoppings, nos hospitais privados e
outros logradouros onde se concentra o dinheiro. Câmera, portanto, é um
chamariz.
O síndico de meu bloco decidiu agregar câmeras
fotográficas à vigilância precária do vigia noturno e da presença inócua do
porteiro. A câmera é um indicativo de que existe algo a ser protegido e,
portanto, um sinal de possível interesse de assaltantes virtuais. Há carros
novos estacionados e dentro deles sofisticados e tentadores aparelhos.
É preciso saber para que serve a câmera e para quem.
Para o assaltante ou para o possível assaltado? Em todos os casos, há uma
dúvida e uma certeza: a possível prisão ou apreensão do assaltante e o trauma
doloroso do assaltado.
Enquanto as câmeras apenas fotografam o cidadão que
passa e o assaltante que rouba, a paranoia aumenta por medo dos 20 jovens
infiltrados na vida cotidiana de 2,6 milhões de brasilienses.
Parece que o buraco é mais amplo e mais embaixo onde
as câmeras não alcançam. Quem se dispõe a descer até suas profundezas?
Ofereço uma corda: antigamente falava-se em justiça
distributiva que ia da educação ao trabalho digno. Hoje, apregoa-se o
crescimento econômico sustentável baseado no consumo.
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