Poços artesianos pululam no DF (Foto: Eugênio Giovenardi) |
Publicado no Correio Braziliense em 24.2.2015
A catástrofe ambiental no Distrito Federal não é uma
profecia para o ano 2018, quando se celebrará em Brasília o 8º. Fórum Mundial
da Água. É um fato atual em processo.
A área do DF é de, aproximadamente, 578.000 hectares
(5.780 km2). Segundo o plano de ocupação regional do DF, apresentado
pelo Dr. Lucio Costa, 80% (462.000 ha) seriam reservados às atividades rurais,
reflorestamento, preservação de nascentes e cursos de água, e 20% (116.000 ha),
à urbanização (serviços, habitação, educação, comércio, lazer, rodovias). Essa
relação, embora quantitativamente imprecisa, se altera dia a dia em detrimento
das áreas verdes.
Atualmente, a urbanização intensiva e extensiva com a
ampliação das cidades-satélites e criação de condomínios rurais, os corredores
verdes encolhem. A biodiversidade se reduz. Aos 2,8 milhões de habitantes do
Distrito Federal se agrega anualmente uma população correspondente a um bairro
como o Núcleo Bandeirante com mais de 40 mil habitantes. A expansão da cidade se
faz, em grande parte, sobre a área verde.
Essa inversão da ocupação de terras e do uso
inadequado do solo desencadeou um processo irrefreado de desertificação do
Cerrado, com eliminação de nascentes, desmatamento indiscriminado, defaunação e
perturbação dos aquíferos subterrâneos por meio de poços tubulares e
artesianos. A impermeabilização de grandes áreas impede a infiltração e recarga
dos aquíferos.
A ocupação das áreas rurais tem se intensificado, nos
últimos anos com grilagem, invasões e venda irregular de terras. Surgem inúmeras
agrupações de vinte a trinta casas nas encostas dos morros. Um sobrevoo sobre
as bordas do DF pode comprovar os fatos. A forma de ocupação e instalação das
moradias obedece a comportamentos tradicionais: destruir para construir.
Desmata-se a área. Limpa-se o terreno com fogo. Deixa-se desnudo o campo. As primeiras
chuvas lavam o terreno. Arrastam para os córregos terra, pedras, madeira e lixo
normalmente jogado no chão. As múltiplas gramíneas do cerrado, aptas a deter a
água da chuva e abrigar a biodiversidade, desaparecem. É o começo do deserto.
O abastecimento de água se faz por poços tubulares ou
artesianos por empresas de perfuração nem sempre autorizadas pela Adasa. Quase
nenhuma preocupação transparece para a preservação da vegetação nativa e a
detenção das águas da chuva para conservação das nascentes. Para ocupar uma
área é preciso observar três aspectos essenciais: o uso do solo para múltiplas
necessidades, a instabilidade climática e a densidade da população.
É possível conviver com o cerrado. Preservo, há
quarenta anos, uma área de 70 hectares às margens do Ribeirão das Lajes, na
bacia hidrográfica do Rio Santo Antônio do Descoberto, ao sul do Distrito
Federal. Um denso tapete de gramíneas, a conservação da vegetação nativa,
protegida por centenas de pequenas barragens de detenção das águas da chuva,
propiciam a infiltração e a recarga dos aquíferos. Mesmo durante as chuvas,
resultado da conservação da densa vegetação, as águas dos córregos dessa área
preservada desembocam limpas no Ribeirão das Lajes que desce sujo e poluído
pela ação descuidada dos moradores.
As dificuldades econômicas crescentes, o custo da
habitação, os consequentes impostos a ela vinculados e o crescimento da
população do DF propiciam a ocupação inadequada e desordenada de áreas de
proteção ambiental.
A peculiaridade da conservação do solo no DF indica
que um plano de ocupação ecológica deve ser posto em prática no sentido de
orientar a ocupação impulsionada pelo crescimento populacional.
Os órgãos de decisão precisam decidir. As pessoas não
conseguem ver o precipício até que esteja diante delas. As políticas econômicas
podem ter resultados deseducadores. A cegueira ecológica dos administradores e
dos cidadãos ocasiona consequências desastrosas.
A Secretaria de Meio Ambiente, a Adasa, a Caesb, o
Ibram, a Secretaria de Agricultura têm estrutura e técnicos especializados.
Podem oferecer orientação adequada aos moradores para a conservação da
vegetação nativa, a detenção de águas pluviais e preservação de nascentes e
cursos de água.
A catástrofe ambiental em curso afeta especialmente os
mananciais, a vegetação nativa e ameaça os atuais e os futuros habitantes do DF
com a falta de água. Ela poderá ser minorada se um vigoroso plano de
preservação ecológica for levado a efeito pelos órgãos responsáveis com o apoio
e o interesse da sociedade brasiliense e dos meios de comunicação.
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