quarta-feira, 19 de maio de 2010

ARQUITETURA DA RIQUEZA

Consolida-se a nova arquitetura do pensamento brasileiro, dos critérios e valores do cidadão, da educação moral e da busca da felicidade sem culpa. Ela está entregue a arquitetos de jornais, revistas, canais de TV e rádio e a âncoras da Internet que desenham perfis e maquetes de celebridades e de vencedores.
A pedagogia usada pelos novos arquitetos da civilização brasileira é alavancada e sustentada por guindastes institucionais, civis e religiosos, operados com poderes especiais que vencem e se sobrepõem às leis da gravidade moral e ética, da ordem e do respeito, e financiam a aventura social e política da sociedade.
A nova arquitetura não se ocupa em construir um grandioso edifício do pensamento, alicerçado na sólida pedra da educação primária estendida a todos os brasileiros. Nem na conclusão universal do ensino secundário. Os novos arquitetos do pensamento amoral e aético desenham a amplidão espacial e a profundidade do bolso da calça ou da saia do brasileiro, a resistência de sua caixa forte e os contornos dourados da conta bancaria.
Trata-se de implantar uma arquitetura pedagógica para formação de milionários num país de 70 milhões de pobres e miseráveis. O princípio pedagógico expresso numa revista com tiragem de 1,2 milhão de exemplares é comovente: “se esses milionários podem não ter lugar assegurado no céu, pelo menos estão ajudando outros brasileiros aqui na terra”.
Portanto, a moda brasileira é formar, como estampa a revista na capa colorida, seis milionários a cada hora, ou 144 no curso do dia. Quando o sol desponta na barra do horizonte e os sabiás cantam a alvorada, o Brasil acorda com mais duas centenas de milionários. Não é sublime e encantador isso?
Ao final do ano, quando os fogos de artifício iluminam os sete mil quilômetros de nossas praias, 52.560 novos recrutas se perfilam no exército de milionários. E, assim, passarão cem anos para construir pouco mais de 5 milhões desta nova espécie de cidadão. Convenhamos, é um ritmo lento para as expectativas de um país a caminho de se tornar 5ª potência mundial.
Atento às minhas considerações, Pedro de Montemor indagou-me se é necessário, importante e conveniente construir milionários em países emergentes quando, nos países ditos ricos, essa pedagogia caiu de moda. Será um jogo de esconde-esconde entre milionários. O milionário da soja compra, por telefone, um lençol finíssimo da milionária dos tecidos. O milionário da carne compra o sapato do milionário dos calçados de couro de jacaré ou de rã. O produto milionário tem que ser exclusivo. Forma-se a rede da solidariedade milionária acumulada nos armazéns e centros de recolhimento das bolsas de valores.
Temos, segundo a revista, em época de maré alta, uma receita arquitetônica para edificar milionários sem culpa e sem preocupação com a entrada no monótono teatro do céu. Os arquitetos da sabedoria milionária previram a estética do paraíso da alienação. O milhão tornou-se o primeiro mandamento da religião do sucesso.
Já temos a arquitetura da riqueza que confraterniza com os mestres de obra da pobreza e do atraso. Por muitos e muitos anos, teremos um Brasil do Quarto Mundo ao lado do Brasil 5ª Potência, paraíso de “um novo milionário a cada dez minutos”.
La nave và!

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